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conflito armado entre independentistas angolanos e as Forças Armadas de Portugal Da Wikipédia, a enciclopédia livre
A Guerra de Independência de Angola, também conhecida como Luta Armada de Libertação Nacional,[8] foi um conflito armado entre as forças independentistas de Angola — UPA/FNLA, MPLA e, a partir de 1966, a UNITA — e as Forças Armadas de Portugal. Na opinião de Angola, a guerra teve início a 4 de Fevereiro de 1961, quando um grupo de cerca de 200 angolanos, supostamente ligados ao MPLA,[9] atacou a Casa de Reclusão Militar, em Luanda, a Cadeia da 7.ª Esquadra da polícia, a sede dos CTT e a Emissora Nacional de Angola[10][11] No entanto, para Portugal e para a FNLA, a data é 15 de Março do mesmo ano,[8][9][12][13][14][15][16] data do massacre perpetrado pelas forças de Holden Roberto, a UPA, na região Norte de Angola. A guerra prolongar-se-ia por mais 13 anos, terminando com um cessar-fogo em Junho (com a UNITA) e Outubro (com a FNLA e o MPLA) de 1974.[17] A independência de Angola foi estabelecida a 15 de Janeiro de 1975, com a assinatura do Acordo do Alvor entre os quatro intervenientes no conflito: Governo português, FNLA, MPLA e UNITA. A independência e a passagem de soberania ficou marcada para o dia 11 de Novembro desse ano.[18][19]
Guerra de Independência da Angola | |||
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Guerra do Ultramar | |||
Soldados portugueses nas matas do Rio Onzo equipados com o fuzil AR-10. | |||
Data | 4 de Fevereiro de 1961 – 25 de Abril de 1974 (13 anos, 2 meses e 3 semanas) | ||
Local | Angola | ||
Desfecho | Acordo do Alvor
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Beligerantes | |||
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Comandantes | |||
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Forças | |||
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Baixas | |||
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Depois de quatro séculos de presença em território africano, no final do século XIX, Portugal achou-se no direito de reivindicar a soberania dos territórios desde Angola a Moçambique, junto das outras potências europeias. Para tal, teria lugar a Conferência de Berlim em 1884.[20] A partir desta data, foram várias as expedições efectuadas aos territórios africanos, às quais se seguiram campanhas militares com o objectivo de "pacificar" as populações.[20] A população tentou resistir mas, dada a superioridade bélica de Portugal, rapidamente abandonaram a resistência por meio das armas.[21] Décadas depois, Portugal foi colocado frente-a-frente com guerras de independência, a primeira das quais a de Angola, que também marcou o início da Guerra Colonial Portuguesa. Seguir-se-iam as da Guiné-Bissau (1963) e de Moçambique (1964). Influenciadas pelos movimentos de autodeterminação africanos do pós-guerra, o grande objectivo das organizações independentistas era "libertar Angola do colonialismo, da escravatura e exploração",[15] impostos por Portugal. Embora Angola fosse um território de grande riqueza de recursos naturais, nomeadamente em café, petróleo, diamantes, minério de ferro e algodão,[22] para o Governo de Portugal, liderado por António de Oliveira Salazar, o que era preciso defender era o regime e não a economia.[23] Muitas vezes incentivados pelo próprio Estado português, cerca de 110 000 imigrantes foram para as colónias africanas, a grande maioria para Angola, nas décadas de 1940 e 1950;[24] em 1960, dos cerca de 126 000 colonos residentes em Angola, 116 000 eram originários de Portugal.[25]
Do ponto de vista militar, as tropas portuguesas tiveram que enfrentar uma guerra de guerrilha não convencional, para a qual não estavam preparadas nem motivadas. O esforço de guerra recaiu sobre o Exército, dadas as características do conflito, apoiado por meios navais e aéreos. Inicialmente, o equipamento do exército português estava obsoleto (a maioria datava da Segunda Guerra Mundial e algum era mesmo anterior[26]), e o número de forças era de cerca de 6 500 homens.[11] A partir do primeiro ano, as forças portuguesas passaram de 33 000 homens (1961) até atingir um contingente de 65 000 no final da guerra,[27] que reunia todos os ramos das Forças Armadas. Embora superior em homens, estes precisavam do apoio dos meios navais e aéreos, taticamente mais fortes. No entanto, por falta de recursos para utilizar este meios, e pela natureza desgastante do conflito, Portugal foi perdendo a sua superioridade ao longo do conflito.[28] Para combater a guerrilha, Portugal teve de se adaptar com técnicas de contra-subversão a partir de 1966.[29] Em relação à guerrilha, esta estava completamente adaptada ao terreno e ao clima difícil de Angola: moviam-se sem dificuldade em pequenos grupos (10 a 40 elementos), aproveitando-se, ao nível logístico e operacional, do apoio das populações.[30] No entanto, uma das principais ameaças dos guerrilheiros vinha do seu interior: disputas tribais, diferenças étnicas e culturais.[31] Ao longo do conflito, a UPA/FNLA, o MPLA e a UNITA, que actuavam em diferentes regiões de Angola, por vezes defrontavam-se entre eles[4] Estas divergências iriam agudizar-se após a Independência de Angola, com a Guerra Civil Angolana.
Em Portugal, a guerra colonial era há muito tempo contestada: a população via os seus familiares a morrer ou a ficarem deficientes; o país via os seus recursos financeiros a esgotarem-se, a produção a decair e a inflação a subir; e surgiam vozes discordantes do regime, desde a esquerda à direita, passando pela igreja católica, pelos movimentos estudantis e pelas associações sindicais.[32][33] Aliada a esta contestação social, e a uma pressão internacional sobre a condução da Guerra Colonial Portuguesa, vai crescendo a influência comunista sobre os militares portugueses. O fim da guerra em Angola culminará com um golpe de Estado militar em Portugal, a Revolução dos Cravos, a 25 de Abril de 1974.[34][nota 1]
Em 1482, as caravelas do Reino de Portugal comandadas pelo navegador português Diogo Cão chegaram ao Reino do Congo.[35] Seguiram-se outras expedições e estabeleceram-se relações entre os dois reinos. Os portugueses levaram armas de fogo, diversos desenvolvimentos tecnológicos, a escrita e uma nova religião, o Cristianismo. Em troca, o Reino do Congo ofereceu escravos, marfim e minerais e especiarias.[36]
Em 1575, Paulo Dias de Novais funda Luanda com a designação de São Paulo da Assunção de Loanda. Dispondo de cerca de 100 famílias e 400 soldados, Novais estabelece uma "praça-forte" essencialmente destinada ao tráfico de escravos. Em 1605, a coroa portuguesa atribui o estatuto de cidade a Luanda. Várias infraestruturas como fortes e portos foram construídas e mantidas pelos portugueses que, no entanto, não procederam à ocupação de um território maior, fixando-se apenas em certos pontos do interior imediato.[nota 2] Benguela, um forte desde 1587,[37][38] passando a cidade em 1617,[38] foi outro ponto estratégico fundado e administrado por Portugal.[39] A presença portuguesa nestes pontos do litoral foi marcada por uma série de conflitos, tratados e disputas com as unidades políticas próximas, nomeadamente o Reino do Congo, Reino do Dongo e do Reino da Matamba.[35][36][40][41]
Até à Independência do Brasil, a colónia angolana servia essencialmente para fornecer escravos, nomeadamente para a exploração de minérios no Brasil. Com a fuga da família real portuguesa para o Brasil, o comércio de escravos aumentou. A declaração de Independência do Brasil forçou Portugal a dar uma maior importância a Angola dada a perda dos recursos provenientes do seu ex-território americano.[42] Naquela altura, alguns países europeus, nomeadamente a Inglaterra, a França, a Bélgica, a Alemanha, a Espanha e a Itália vinham a ter um papel cada vez mais destacado como potências imperialistas. África passa a ser uma região a explorar dados os seus recursos naturais, algumas importantes para o desenvolvimento industrial na Europa. Esta viragem deu origem, na segunda metade do século XIX, a uma "Corrida para a África" em que cada uma das potências europeias tentou assegurar-se o domínio de parcelas territoriais do continente. Ao fim de fortes disputas entre europeus, e depois de vencida a resistência oferecida por boa parte das unidades políticas africanas, África ficou, em inícios do século XX, dividida em colónias europeias, com a excepção da Etiópia.[43]
A conquista portuguesa do território correspondente à actual Angola, a partir de Luanda e de Benguela, teve início em começos do século XIX, abrandou durante várias décadas, e retomou com força na segunda metade daquele século, já numa situação de concorrência com as outras potências europeias.[44] O interesse económico imediato continuou a ser o tráfego de escravos, lentamente completado por outros tipos de comércio bem como por uma agricultura de plantações, geralmente de dimensão limitada, e trabalhados com recurso a mão de obra escrava.[45]
O fim oficial da escravatura em Portugal data de 1878;[46] em Angola, também a mesma data é apontada como, ao nível formal, o fim da escravidão.[47][48] No entanto, e na prática, a exploração da mão de obra negra continuou através de um instrumento designado por “contrato” (em vigor até 1961),[49] que consistia na contratação de ex-escravos pelos seus anteriores senhores. Em 1899, é criada uma nova lei de trabalho - Regulamento do trabalho dos indígenas - que concebia a noção de “trabalho forçado indígena” (habitantes autóctones das colónias).[46][50][51]
A delimitação do território de Angola fez-se, no essencial, na Conferência de Berlim onde Portugal teve que fazer pesadas concessões. Por um lado foi rejeitado o Mapa cor-de-rosa que reclamava para Portugal uma extensa faixa que ligava Angola a Moçambique, incluindo os territórios da (hoje) Zâmbia, do Maláui e do Zimbábue. Por outro lado, teve que ceder ao Congo Belga uma faixa substancial ao longo da foz do Rio Congo, de modo que o Congo Português ficou reduzido ao enclave de Cabinda. Finalmente, teve que concordar em reconhecer o Rio Cunene como fronteira com a colónia alemã do Sudoeste Africano. Acertos de detalhe levaram décadas, de modo que as fronteiras definitivas de Angola só ficaram estabelecidas em meados dos anos 1920. É esta também a data em que se pôde falar de uma "ocupação efectiva" de todo o território.[52]
Só no século XIX os portugueses fariam incursões maiores no actual território de Angola. Nas últimas décadas daquele século o seu propósito central foi o da ocupação do maior território possível, contra a resistência dos povos que lá residiam, para afirmar-se contra outras potências europeias na "Corrida para África" que havia começado. No entanto, dados os seus recursos escassos, esta expansão levou muito tempo; no início do século XX, menos de 10% do território atribuído pela Conferência de Berlim estava sob controle português efectivo, e uma ocupação completa, pela força militar só foi alcançada em meados dos anos 20.[48][53] Em meados do século XIX, em Luanda viviam vários intelectuais portugueses e brasileiros, ao lado de comerciantes de escravos e delinquentes. Esta diversidade social ajudou ao lançamento de jornais de conteúdo mais libertário. Embora efémera, por volta da década de 1880, aquando da Conferência de Berlim, circulou um certo sentimento de uma possível independência.[54]
Em Angola, as povoações dos colonos portugueses tinham uma dimensão muito reduzida, e a sociedade estava estruturada tal como em Portugal – em pirâmide, tendo no topo a aristocracia, a igreja, funcionários de topo, os militares e os comerciantes; na base estavam os antigos escravos e os “indígenas”.[55] Na década de 1910, viviam em Angola 10 000 colonos, concentrados no litoral.[56] A população era constituída maioritariamente por mulatos, cerca de seis para cada branco (o dobro do verificado em meados do século anterior).[56] Um dos principais motores das navegações, a Igreja, ainda estava pouco presente em Angola no início do século XX; em 1910, existiam apenas 50 escolas de missionários.[56] Ao longo da presença colonial de Portugal em Angola, o objectivo das missões cristãs era converter a população nativa e educá-la de acordo com as normas culturais europeias e, ao mesmo tempo, ter um papel psicológico junto da população branca.[57] Para os nativos angolanos, a igreja católica era a igreja dos portugueses e não a sua; embora a frequentassem, não deixaram os seus próprios cultos tradicionais.[58] Para além das missões católicas, também as protestantes estiveram presentes em Angola; Holden Roberto e Jonas Savimbi foram dois dos líderes dos movimentos de libertação que passaram por escolas dirigidas por missionários protestantes.[59]
A partir da Implantação da República, a política portuguesa tornou-se mais democrática.[60] No entanto, durante os anos da Primeira República Portuguesa, a instabilidade governamental foi muito grande, com sucessivas mudanças de governo.[60] Em 1912, é criada a Liga Angolana e o Grémio Africano, organizações políticas coloniais que,[61] no entanto, tinham pouca expressão.[62] Em Angola, no período de 1910 a 1926, ocorrem várias greves entre os trabalhadores brancos, e alguns historiadores vêem aqui o início da luta anticolonialista. A década de 1920 marca precisamente uma luta do governo português às ideias dos movimentos nacionalistas,[63] Em 1919, é criada a Liga Africana, por dissidentes da Junta de Defesa dos Direitos de África, à qual estava ligada a Liga Africana de Luanda. Em 1921, a Junta foi reestruturada passando a designar-se por Partido Nacional Africano.[64] Em 1922, o general Norton de Matos, então Alto Comissário da República de Angola, decide suspender tanto a Liga Africana como o Grémio Africano, prender Assis Júnior, e proibir os jornais de conteúdo "nativo"; estas acções tomadas por Norton de Matos terão como resultado a passagem à clandestinidade do nacionalismo angolano.[64] No período de 1922 a 1925, algumas manifestações de trabalhadores da região compreendida entre Luanda e Malange são reprimidas, o que põe um ponto final em quaisquer movimentações intelectuais.[64] A partir desta data, as associações africanas, enfraquecidas com a repressão, passaram a ter uma atitude de cooperação com as autoridades portuguesas,[64][65] praticamente desaparecendo política e socialmente até 1945[65] O período conturbado da I República culmina em 1926, com a Revolução de 28 de Maio, e a subida ao poder dos militares, e de uma nova política conservadora. A nova política colonial passa a ser regida pelo Ato Colonial de 1930.[60]
Em 1932, Salazar sobe ao poder e, com os poderes que o Ato Colonial lhe conferia, reestrutura a divisão administração, acaba com a autonomia e cria a figura do “governador-geral” das colónias, na sua alçada.[66] A crise económica dos anos 30 leva a uma maior atenção para as colónias que passam a ser o principal meio de sustentação. Têm início as grandes plantações da qual se destaca a do algodão que era a que dava mais lucro, pois era vendido pelo dobro do que era adquirido ao produtor, e tinha um baixo custo de produção (grandes extensões de terra aliadas a mão de obra quase gratuita).[67] Nos anos 50, Angola era um dos territórios eleitos para as grandes plantações.[67] No entanto, para explorar as monoculturas angolanas era preciso dinheiro, e para isso Portugal dependia do capital estrangeiro, o qual impunha novas regras: uma maior opressão da população nativa, o “trabalho forçado”, até 1961, ano do fim do Estatuto do Indigenato e Código do Trabalho dos Indígenas.[67]
Angola deteve o estatuto de Colónia Portuguesa desde 1655 até 11 de junho de 1951, data em que as colónias portuguesas passaram a ser designadas por Províncias Ultramarinas.[68][69]
O Ato Colonial de 8 de julho de 1930, estabeleceu a supremacia dos portugueses sobre a população indígena. Embora os nativos pudessem estudar até a um nível universitário, na prática, a situação era de profunda clivagem cultural e social entre a população local e os portugueses que viviam no litoral de Angola. Em 1948, Viriato Clemente da Cruz, e outros membros, criaram o Movimento dos Novos Intelectuais de Angola, uma organização que promovia a cultura angolana. Os nacionalistas enviaram uma carta às Nações Unidas (NU) solicitando que fosse atribuído o estatuto de protectorado a Angola sob supervisão das NU. No início da década de 1950, é criado o Clube dos Marítimos Africanos, cujos membros, por serem marinheiros, faziam a ligação entre Lisboa e Luanda das informações sobre o regime português, em particular da repressão exercida nas colónias. Desta forma, promoviam as suas ideias de libertação e agitação política junto da população.[70] Com o crescente aumento da população de Luanda, e da sua diversidade, também as ideias independentistas fluíam mais rapidamente. Dos 240 mil habitantes, em 1960, 65% eram negros; destes, 85% viviam nos musseques. As primeiras desordens, pontuais, datam dos anos 50 com o apedrejamento de viaturas próximo dos bairros pobres.[71] A resposta das autoridades fazia-se sentir através de rusgas, patrulhamentos e inibição de frequentar os lugares públicos dos brancos.[71]
Na década de 1950, Salazar incentivou os portugueses a instalarem-se nas províncias de África. Muitos portugueses procuravam uma vida melhor e Angola era "uma luz ao fundo do túnel"; o comércio era a principal actividade escolhida pelos portugueses.[72][73] Em 1953, separatistas angolanos fundaram o Partido da Luta Unida dos Africanos de Angola (PLUAA),[16] o primeiro partido político a reivindicar a independência de Angola. Em 1954, é criado o movimento político União das Populações do Norte de Angola (UPNA),[16] por nacionalistas do Congo e de Angola, que defendiam a independência do Reino do Congo, o qual incluía outros territórios para além de Angola.[74]
Durante o ano de 1955, Mário Pinto de Andrade e o seu irmão Joaquim, criaram o Partido Comunista Angolano (PCA). Em Dezembro de 1956 o PLUAA juntou-se ao PCA, que funcionava na clandestinidade[75] influenciado pelo Partido Comunista Português (PCP),[76] para fundar o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA).[16] Este, liderado por Viriato da Cruz, Mário Andrade, Ilidio Machado e Lúcio Lara, obteve o apoio dos ambundos de Luanda.[77][78][79] Em 1959, tem lugar a Conferências dos Povos de África, em Acra. As forças nacionalistas aproveitam o evento para, com o apoio das populações dos musseques de Luanda, se manifestarem nas ruas contra a escravatura e exigindo a independência.[80] As autoridades responderam à manifestação com força e, nos dias seguintes, a polícia fez detenções nos musseques.[80] Em junho de 1960, no seguimento de reivindicações para uma solução pacifica do problema colonial, vários membros do MPLA, entre eles Agostinho Neto e Joaquim Pinto de Andrade, são presos em Lisboa; dois anos depois, Agostinho Neto consegue evadir-se da sua residência, em Maio de 1962.[17][81]
Em 1954, o governo português cria o Estatuto do Indigenato.[82] Esta lei dividia a população entre em dois grupos: os "civilizados", vulgo cidadãos, e os "indígenas"[83] (...) que não possuíam ainda a instrução e os hábitos individuais e sociais pressupostos para a aplicação integral do direito público e privado dos cidadãos portugueses.[84] Desta forma, os africanos das províncias ultramarinas não possuíam direitos políticos - não podiam formar partidos nem sindicatos; podiam estabelecer associações de carácter cultural, porém sempre sob a supervisão da PIDE. Por outro lado, o estatuto permitia que os jovens africanos viajassem para Portugal para estudar nas universidades.[84] Destaquem-se os casos de Mário Pinto de Andrade e de seu irmão Joaquim, que ingressaram da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa; Agostinho Neto, que estudou Medicina em Coimbra e Lisboa; e Jonas Savimbi, que frequentou o liceu em Lisboa.[85] Esta dupla situação, forçou a que muitos cidadãos angolanos e moçambicanos se organizassem na clandestinidade e definissem a luta armada como meio de atingir a independência. Em Portugal, os estudantes das colônias criam a associação Casa dos Estudantes do Império,[16] em 1943, passando à tutela do governo em 1944. O objectivo era formar elites a partir de naturais das províncias ultramarinas. No entanto, passam por esta associação vários estudantes, que mais tarde seriam líderes nas guerrilhas de libertação, escritores e políticos como Agostinho Neto, Amílcar Cabral, Eduardo Mondlane, Luandino Vieira, Marcelino dos Santos, Pepetela ou Mário Pinto de Andrade. Em 1961, cerca de 100 estudantes africanos fogem de Lisboa para França, onde uns foram estudar e outros se juntar aos movimentos independentistas. As casas dos Estudantes do Império de Coimbra e do Porto seriam encerradas em 1961, e a de Lisboa em 1965.[86]
Dos três movimentos nacionalistas, o MPLA era o de natureza mais elitista dado ter nas suas fileiras membros que tinham estudado em Portugal[84] e que faziam parte de famílias afro-portuguesas de elite;[87] o seu apoio não tinha origem étnica.[88] O fim deste Estatuto data de 1961, ano em que Adriano Moreira, ministro do Ultramar, o revoga.[82] Com o fim do Estatuto, passa a ser possível aos angolanos "indígenas" terem cidadania portuguesa, sem qualquer tipo de discriminação; e a puderem ser integrados no sistema educacional nacional.[25]
Um ano depois do fim do Estatuto do Indigenato, Adriano Moreira revoga o Código do Trabalho dos Indígenas, criado em 1956. Este Código estabelecia que o sistema de exploração económica iria ser sustentado pela mão de obra indígena, em geral com baixos salários.[89] Com a revogação, os indígenas passam a não serem obrigados a trabalhar e a poderem livremente escolher para quem trabalhar. Passam a ter acesso à função pública, e termina a obrigatoriedade das culturas agrícolas específicas. É permitida, também, a criação de mercados rurais aos produtores angolanos.[25]
A seguir ao pós-guerra, vários países africanos tornaram-se independentes do Reino Unido, França, Alemanha e Bélgica. No entanto, Portugal não permitiu que tal acontecesse com as suas colónias, dando origem a diversos movimentos independentistas em Angola (UPA/FNLA, MPLA, UNITA), Guiné-Bissau (PAIGC) e Moçambique (FRELIMO).[90] De maneira geral, as três organizações que combatiam em simultâneo a presença dos portugueses em Angola, nunca chegaram a trabalhar juntas formando uma só força de oposição; pelo contrário, combateram entre si, enfraquecendo, assim, alguma hipótese de saírem militarmente vitoriosos do conflito.[90]
Em Angola, o primeiro a surgir foi o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), em 1956, apoiado pelos ambundos, várias outras etnias da região de Luanda, Bengo, Cuanza Norte e Sul e Malange, brancos, mestiços, intelectuais angolanos e membros da elite urbana.[91] O MPLA era uma organização da esquerda política, resultado da fusão do Partido da Luta Unida dos Africanos de Angola (PLUAA) e do Partido Comunista Angolano (PCA). Foi liderado por Agostinho Neto, secretariado por Viriato da Cruz e apoiado, exteriormente, pela União Soviética e por Cuba; ainda tentou apoio junto dos EUA mas sem sucesso visto este já estarem a ajudar a UPA/FNLA.[92]
Ao longo da guerra, a organização política e militar do MPLA foi evoluindo a tal ponto que, em 1970, ocupava uma grande área do país, que dividiu, militarmente, em Regiões Militares (RM).[93]
As forças do MPLA ascenderam a 4 500 elementos e estavam equipados com armamento e munições soviéticos que era distribuído através da Zâmbia; era também a partir deste país que o MPLA recebia medicamentos e alimentos enlatados.[93] O seu armamento incluía pistolas Tokarev TT; pistolas-metralhadora de calibres 9 mm M/25 e 7,62 mm PPSH; espingardas semiautomáticas Simonov e Kalashnikov; metralhadoras de diversos calibres; morteiro de 82 mm; lança-granadas-foguete (a partir de 1970) e minas anticarro e antipessoal.[93]
A 7 de Julho de 1954,[14] é formada a União das Populações do Norte de Angola, apoiada pelo Congo, pelo grupo étnico congo, do Noroeste e Norte de Angola[91] e com fortes ligações ao Zaire, através do seu líder Holden Roberto, amigo e cunhado do Presidente Mobutu Sese Seko; em 1958 passa a designar-se, de forma mais abrangente, por União das Populações de Angola (UPA). A partir de 1962, une-se ao Partido Democrático de Angola criando a Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), organização pró-americana e anti-soviética.[94] Em 1960, Holden Roberto assina um acordo com o MPLA para juntos lutarem contra as forças portuguesas, mas acabou por lutar sozinho. A FNLA chegou mesmo a criar um governo no exílio, o GRAE - Governo Revolucionário de Angola no Exílio.[85]
A facção armada da UPA/FNLA era o Exército de Libertação Nacional de Angola (ELNA). Os seus apoios vinham do Congo e da Argélia, e as suas tropas eram treinadas no Zaire as quais recebiam fundos norte-americanos e armamento dos países do Leste Europeu, embora se considerassem anticomunistas. Estavam armados com espingardas semiautomáticas Simonov e Kalashnikov; pistolas; morteiros de 60 mm e 81 mm; e lança-granadas-foguete.[95]
Em 1966, Jonas Savimbi, então membro da FNLA, entra em rota de colisão com Holden Roberto acusando-o de cumplicidade com os Americanos e da sua política Imperialista, e cria a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), apoiada ocasionalmente pela Zâmbia e pela África do Sul, com ligações à PIDE (a partir de 1969; Savimbi chegou a fazer um acordo para combater contra o MPLA no Leste de Angola), à CIA e à China.[85][94] Savimbi fez parte do GRAE como Ministro das Relações Exteriores e representava o grupo étnico ovimbundo, do planalto central e províncias do sul.[91]
As forças da UNITA eram as que tinham o menor número de guerrilheiros: 500, de acordo com os militares portugueses; cerca de 4 000, de acordo com a própria UNITA.[4] A sua área de actuação limitou-se ao Leste de Angola e o seu armamento sempre foi de fraca qualidade.[4] As dificuldades sentidas pela UNITA, levaram Savimbi a fazer compromissos com Portugal e a Zâmbia.[4] Parte da sua luta foi contra o MPLA, a favor do qual perdia terreno; as suas acções de guerrilha limitavam-se a ataques pontuais a viaturas, raptos e intimidações.[4][96]
No início do conflito, em Angola estavam apenas 1 500 soldados das Forças Armadas de Portugal, e 5 000 recrutados localmente.[11] No final do primeiro ano, o número aumentou para mais de 33 000, atingindo os 65 000 nos anos finais do conflito.[27] Foram utilizados 94 aviões, 45 helicópteros, oito navios e 16 lanchas de desembarque.[97] As diferentes forças portuguesas que estiveram presentes em Angola foram as seguintes:
Revolta puramente laboral sem qualquer tipo de motivações políticas que nada teve a ver com o início da guerra.[117] A data de início do conflito não é consensual,[9] embora, para o Governo angolano, o 4 de Fevereiro de 1961 seja o dia oficial do início da Luta Armada de Libertação Nacional.[8] No entanto, um mês antes, a 4 de Janeiro, tem lugar a Revolta da Baixa do Cassange (Malange), onde se dá um levantamento popular dos milhares de trabalhadores dos campos de algodão da companhia Luso-Belga Cotonang. As duras condições de trabalho e de vida,[118] a constante repressão aliada à influência da independência do Congo em Junho de 1960 (na região do Cassange viviam os congos que tinham origens comuns com povos do Congo), foram os principais factores que deram origem à sublevação destes angolanos.[119] Os trabalhadores decidiram fazer greve e armaram-se de catanas e canhangulos (espingardas artesanais). Designada por "Guerra de Maria", por ter sido inspirada por António Mariano[120] ligado à UPA, os revoltosos destroem plantações, pontes e casas. A resposta das forças portuguesas é dura e violenta, através de companhias de caçadores especiais e bombas incendiárias lançadas de aviões da Força Aérea Portuguesa (FAP), tendo provocado um número bastante elevado de mortos: entre 200 a 300,[121] ou mesmo alguns milhares.[73][122] Todos estes acontecimentos são ocultados do público em geral.[121][123] Este dia é lembrado em Angola como o Dia dos Mártires da Baixa de Cassange,[8][124] e terá sido o acontecimento que "despertou consciência patriótica dos angolanos e de unidade dos angolanos em prol da sua liberdade".[125]
Enquanto duravam as operações de contenção da revolta de Cassange, a 4 de Fevereiro,[8][9][16] um grupo de cerca de 200 angolanos, alegadamente[126][nota 3] ligados ao MPLA,[9] ataca a Casa de Reclusão Militar, em Luanda, a Cadeia da 7ª Esquadra da polícia, a sede dos CTT e a Emissora Nacional de Angola.[11] O objectivo era libertar alguns detidos, mas o ataque seria um fracasso, tendo morrido cinco polícias, um cipaio e um cabo da Casa de Reclusão e 40 dos atacantes, e nenhum dos prisioneiros libertados.[73] Este ataque coincidiu com a presença de jornalistas estrangeiros que aguardavam por notícias do navio Santa Maria, que tinha sido desviado pelo capitão Henrique Galvão e outros oposicionistas ao regime português, e que, supostamente, iria atracar em Luanda.[126] Deste modo, ao contrário da revolta de 4 de Janeiro, os incidentes do 4 de Fevereiro foram do conhecimento público.[127] A 6 de Fevereiro, durante as cerimónias fúnebres dos polícias, foram mortos cerca de duas dezenas de cidadãos negros devido a uma alegada provocação;[128] ao mesmo tempo, as autoridades portuguesas, e vários cidadãos brancos,[16] atacaram violentamente os cidadãos étnicos angolanos que viviam nos musseques (bairros degradados).[129] Cinco dias depois, os separatistas do MPLA atacaram, de novo, uma prisão, ao qual os portugueses responderam violentamente, provocando mais vítimas mortais.[127]
“ | A vingança portuguesa foi em grande. A polícia ajudou os vigilantes civis a organizarem os massacres nocturnos nos bairros da lata de Luanda. Os brancos retiravam os africanos das suas habitações de uma divisão, matavam-nos e deixavam os seus corpos nas ruas. Um missionário Metodista afirmou que teve conhecimento de cerca de 300 mortos. | ” |
— John Marcum[130] |
O historiador angolano Carlos Pacheco descreve, em “MPLA, um Nascimento Polémico”, o fervilhar político em Luanda, no final da década de 50 e início da de 60 do século passado, afirma que o MPLA nasceu no início de 1960 e não em 1956, ano apontado pela história oficial, e sugere-nos que este Movimento estava ainda, no início de 1961, numa fase incipiente. Uns meses antes a PIDE prendera Agostinho Neto e alguns simpatizantes das suas ideias. Sobre o “4 de Fevereiro” não mostra dúvida de que “quem arregimentou os revoltosos de 61, maioritariamente do concelho de Icolo e Bengo, foi a UPA pela mão de Neves Bendinha”.[117]
Em Portugal, o Ministro da Defesa Botelho Moniz reage aos acontecimentos com um despacho em que aconselha a imposição de um regime justo e humano nas regiões de cultivo de algodão, para evitar problemas económicos e políticos.[11] Os Estados Unidos, através do seu embaixador em Portugal, Charles Burke Elbrick, encontra-se com Botelho Moniz; o seu objectivo era que Moniz pressionasse Salazar no sentido de este alterar a sua política colonial e promovesse a autodeterminação das colónias africanas.[11] A 10 de Março a questão angolana é introduzida nas reuniões da ONU.[11]
Durante o mês seguinte, regressou a acalmia a Luanda, e nada parecia ter acontecido.[128] O dia 15 de Março marca o primeiro ataque das forças de Holden Roberto, a UPA, na região Norte de Angola, em particular nas províncias do Uíge e do Zaire. Disfarçado de evento festivo - dia do casamento da filha do Nogueira -,[131] o massacre foi preparado no Congo meses antes.[132] O sentimento de revolta começara após a Conferência de Todos os Povos Africanos em Acra, no Gana, em Dezembro de 1958, onde esteve presente Holden Roberto. Frantz Fanon, e outros nacionalistas africanos, aconselharam Holden Roberto a utilizar a força e a derramar o sangue dos colonos, pois só assim se conseguiria acabar com o colonialismo português.[89]
O massacre durou cerca de três dias. As forças da UPA invadiram postos administrativos e fazendas, matando todas as pessoas que encontravam, independentemente de serem brancos ou negros (já integrados no sistema colonial), homens, mulheres ou crianças.[133] Terão morrido mais de 5 mil pessoas, das quais um quinto de origem europeia.[134] Os atacantes estavam armados de catanas e canhangulos, e agiam pensando serem invencíveis e imunes às balas dos colonos, que achavam serem feitas de água.[135] Os massacres estenderam-se para sul para Cuanza Norte, Luanda e Bengo onde, nesta última província, Nambuangongo foi proclamada a "capital do Estado livre", após ter sido abandonada pelos europeus.[136] A Luanda começaram a chegar milhares de refugiados. A este ataque de grande dimensão, Portugal não conseguiu responder como em situações anteriores. Foi a própria população colona, em conjunto com o Governo, que se organizou no imediato para fazer face às ameaças da UPA, através da Organização Provincial de Voluntários da Defesa Civil de Angola. A resposta desta organização foi igualmente violenta, e o alvo foi a população negra que ficou nas aldeias.[135]
A partir desta data, e depois de todos os acontecimentos registados desde o início do ano, Angola e Portugal estão em guerra. Mesmo assim, e mesmo apanhados de surpresa, a imagem que o Governador-geral de Angola Álvaro da Silva Tavares passa é de calma e controlo da situação. De Portugal, até à data, não tinha havido qualquer reacção.[137] A 17 de Março, Salazar reage, indignado, designando de "terroristas" os atacantes angolanos. As forças de segurança portuguesas em Angola limitavam-se a 1 500 soldados das Forças Armadas, e 5 000 recrutadas localmente. No dia 15 de Março tinham partido quatro Companhias de Caçadores Especiais e, no dia seguinte, chegam a Luanda os primeiros pára-quedistas.[11]
Depois dos ataques de 15 de Março, a vila de Nambuangongo, a 200 km de Luanda, ficou abandonada. A UPA aproveitou a oportunidade para aí estabelecer o seu Quartel-General, ficando a controlar boa parte do Norte de Angola, e ameaçando a cidade de Luanda.[138]
A reacção do Governo português, em Portugal, a todos os acontecimentos verificados desde o início do ano, foi inesperadamente lenta,[139] embora já se tivesse a preparar o reforço das forças em Angola.[140] Ao nível militar nada podia ser feito para recuperar algumas das zonas do Norte, dado o diminuto número de tropas no terreno. Entretanto, em Portugal, Botelho Moniz tenta um golpe de Estado, sem sucesso, e é demitido por Salazar. No dia 13 de Abril, Salazar emite um comunicado, via rádio e televisão, em que anuncia uma alteração governamental dada a situação preocupante em Angola; termina o seu discurso com a frase:
“ | Se é precisa uma explicação para o facto de assumir a pasta da Defesa Nacional mesmo antes da remodelação do Governo que se verificará a seguir, a explicação pode concretizar-se numa palavra, e essa é Angola (...). Andar rapidamente e em força é o objectivo que vai por à prova a nossa capacidade de decisão. | ” |
— Salazar[141] |
A 1 de Maio chega o primeiro contingente militar a Luanda por via marítima, a bordo do paquete Niassa. Seguidamente partem para a zona Nordeste com o objectivo de cortarem as ligações dos guerrilheiros às suas bases do Congo. Os meses de Maio e Junho marcam a reocupação de diversas posições pelos Batalhões de Caçadores (Damba, Sanza Pombo, São Salvador, Cuimba) e por forças de Fuzileiros (Tomboco). Às difíceis condições do terreno, juntam-se-lhe as acções dos guerrilheiros que cortavam as picadas com árvores, abriam de valas e destruíam pontes; um batalhão demorou 18 dias de Luanda a Maquela do Zombo.[140][142][143] No final do mês de Junho, as Forças Armadas emitem um primeiro relatório com o número das vítimas: 50 militares mortos entre 4 de Fevereiro e 30 de Junho.[17]
Finda a primeira fase de reocupação do Norte, é planeada a reconquista dos Dembos e, em particular, de Nambuangongo. O contingente militar português ascendia a 30 000 homens.[142] O General Silva Freire decide efectuar uma operação de grande envergadura que se designou por "Operação Viriato".[142] Esta operação tinha por objectivo o controlo dos eixos Caxito-Nambuangongo e Ponte do Dange, e Muxaluando-Nambuangongo, e envolvia dois batalhões de Caçadores e um esquadrão de Cavalaria, apoiados pela artilharia, engenharia e pela Força Aérea,[144] Durante todo este período de reocupação da zona Norte de Angola, as forças portuguesas são pressionadas pelo Governo de Lisboa no sentido de, até Setembro, toda aquela região estar sob domínio português pois teria lugar a Assembleia Geral da ONU que já tinha na sua agenda o conflito entre Portugal e Angola e a questão da autodeterminação e independência deste país.[17][142]
A operação tem início a 10 de Julho e o percurso até Nambuangongo não foi fácil, tendo as tropas portuguesas sofrido diversos ataques da UPA. A 9 de Agosto,[16] o Batalhão de Caçadores 96 é o primeiro a chegar; o Esquadrão de Cavalaria 149 chega no dia seguinte; o Batalhão de Caçadores 114 ficou preso no caminho.[142] Embora a operação tenha sido considerada um sucesso, Nambuangongo já tinha sido abandonada pelos guerrilheiros.[143] No final da operação morreram 18 homens e 61 ficaram feridos.[145]
O mês de Outubro assinala o controlo das zonas anteriormente abandonadas pelas forças portuguesas.[143] A 3 de Outubro é reocupada a cidade de Caiongo, última povoação controlada pela UPA. É o fim de um ano sangrento e, a partir de agora, após o fim da reconquista do Norte, a "guerra" terminou passando a designar-se as operações militares por "acções de policiamento militar".[82]
No contexto organizacional, os cargos de Governador-geral e de Comandante-chefe da "província" são fundidos num só, sendo nomeado o General Venâncio Augusto Deslandes, em 17 de Junho,[82] para ocupar esse lugar.[143] No entanto, as ideias de Deslandes, que defendia certa autonomia para Angola, acabaram por causar algum mal-estar ao Governo, e aquele foi substituído pelo General Silvino Silvério Marques no final de 1962; Deslandes chegou a pensar na criação de uma universidade em Luanda e em promover a educação junto dos naturais de Angola, pouco qualificados.[146][147] Ao nível político, o Estatuto do Indigenato, criado em 1954, é revogado em Setembro de 1961 pelo ministro do Ultramar Adriano Moreira.[82]
No final do primeiro ano do conflito, cerca de 150 000 cidadãos angolanos tinham-se refugiado no vizinho Zaire, atingindo um total de 450 000 no final da guerra, em 1974; para a Zâmbia, tinham-se refugiado cerca de 25 000.[148]
O segundo ano do conflito marca a reorganização, e modernização, das tropas portuguesas, tanto ao nível logístico como dos equipamentos. Em termos tácticos adoptou-se a "quadrícula"[146] em detrimento de pequenas unidades móveis de intervenção rápida, defendidas por Costa Gomes. Embora melhor organizadas e superiores em termos militares, as tropas continuam sujeitas às dificuldades do terreno, aos guerrilheiros e à ameaça física e psicológica da utilização das primeiras minas.[146] As forças da UPA, apoiadas pelo Congo, são as que ameaçam mais os portugueses dado que, desde o 4 de Fevereiro, os guerrilheiros do MPLA sofreram uma fractura na sua organização dada a repressão recebida naquele dia.[149] A UPA organiza-se e, em 1961, forma o GRAE - Governo Revolucionário de Angola no Exílio - reconhecido por vários estados africanos; em 1962 altera a sua designação para FNLA - Frente Nacional de Libertação de Angola. No entanto, e dado o alegado apoio dos Estados Unidos, o seu líder, Holden Roberto vê a sua imagem prejudicada.[149] Também o ano de 1962, assiste à modernização do seu equipamento bélico: recebem a metralhadora AK-47, a semiautomática Simonov, a pistola-metralhadora PPSH e lança-granadas RPG-2 e RPG-7, granadas de mão de origem italiana "Società Romana" e minas do leste europeu.[149][150]
Ao nível interno dos movimentos de libertação, continuavam as divergências e as tentativas de criação de uma frente única. Em 1962, durante um congresso do MPLA, Agostinho Neto e Mário de Andrade formaram um novo comité executivo deixando de fora Viriato da Cruz.[151] No ano seguinte, em Julho de 1963, tem lugar uma conferência em Brazavile que reúne quatro organizações – Ngwizani a Kongo (NGWIZAKO), Movimento para a Defesa dos Interesses de Angola, União Nacional dos Trabalhadores Angolanos (UNTA) e Movimento Nacionalista de Angola.[152] O objectivo era a criação de uma frente única designada por Frente Democrática de Libertação de Angola (FDLA).[151] Dos seus membros fazia parte Viriato da Cruz que acaba por criticar o movimento, afirmando tratar-se de uma ligação do MPLA com organizações simpatizantes com os portugueses; Viriato, e outros elementos, acabariam expulsos da Frente. No mesmo mês, a OUA reúne-se com elementos da FNLA, da FDLA e outros, e aponta a FNLA como o único movimento nacionalista de Angola; pede, também, que o GRAE fosse reconhecido pelos demais países africanos, e que os outros movimentos nacionalistas se unissem à FNLA.[153] Mário de Andrade era contra a criação do FDLA, e Agostinho Neto, nomeado para presidir a esta frente, criticou a recomendação de adesão à FNLA.[153]
Entretanto, em 1963, surge um novo movimento independentista, a Frente de Libertação do Enclave de Cabinda (FLEC), liderado por Luis Ranque Franque, cuja luta era a independência do seu território, Cabinda. Geograficamente separada de Angola,[154][155] Cabinda é uma região com grandes reservas costeiras de petróleo. Protectorado português desde 1885, data do Tratado de Simulambuco, no governo de Salazar (1956), a região foi integrada administrativamente em Angola, violando o Tratado.[156]
Até 1974, a FLEC lutou contra Portugal. Com o Acordo do Alvor (1975), do qual a FLEC foi excluída, Cabinda passa a fazer parte integrante de Angola[18] e, a partir dessa data, a luta passou a ser feita contra a própria Angola, quando o MPLA invade o território.[155][157]
As primeiras críticas à resistência do governo português de descolonizar datam de 10 de Março de 1961 quando a questão é apresentada na ONU. A Delegação portuguesa abandona a Assembleia-geral e, no mês seguinte, esta anuncia a sua posição favorável à auto-determinação de Angola. No ano seguinte, a OUA -Organização de Unidade Africana- corta relações com Portugal.[150] O governo de Salazar, consciente das várias divisões existentes entre os países africanos, aproveita-se dessa situação para apoiar o movimento do Catanga, do recém-independente Congo Belga, liderado por Moïse Tshombe. No entanto, em 1963, as forças militares da ONU atacam aquele movimento provocando a sua fuga para o Nordeste angolano, controlado pelas forças portuguesas.[158] Em 1964, depois de uma reviravolta política devido à conturbada conjuntura interna do Congo Belga, Tshombe assume o cargo de Primeiro-ministro em Leopoldville. Tanto para Portugal como para Tshombe, a situação é positiva, pois a região Norte de Angola deixa de estar pressionada, e Tshombe recebe armamento português para lutar contra um movimento rebelde.[158] Em 1965, nova reviravolta: primeiro o Presidente Joseph Kasa-Vubu demite Moïse Tshombe, e de seguida, depois de um golpe de estado, Mobutu assume o poder do Zaire. Mobutu, familiar de Holden Roberto, aumenta o apoio à FNLA.[158][159]
Após o assassinato do Presidente John F. Kennedy e da subida ao poder de Lyndon Johnson em 1964, os Estados Unidos alteraram a sua política anticolonial e diminuíram o apoio à FNLA. A nova política norte-americana via o anticolonialismo como mais vantajoso para os países de Leste, em particular a União Soviética; este pensamento político era semelhante ao português.[160] A falta de apoio por parte dos EUA leva a uma forte diminuição da actividade dos guerrilheiros de Holden Roberto. No entanto, a subida ao poder de Mobutu em 1965, iria representar um novo ânimo à organização. Porém, dadas as relações não oficiais do Zaire com Portugal, este apoio modificar-se-ia em 1969, por um lado pelo mal-estar causado pelos guerrilheiros do FNLA junto das populações da fronteira com o Congo; e, por outro lado, pela necessidade de utilização dos caminhos-de-ferro de Benguela para exportar os seus minérios através do porto do Lobito.[160] A partir desta altura, os combatentes da FNLA estavam confinados a uma base de Kinkusu, próximo de Quinxassa, ou seja, fora de Angola. Este novo apoio tinha interesse político para Mobutu que queria estar comprometido com a luta pela libertação colonial.[160]
Em 1966, Jonas Savimbi cria a UNITA, depois de ter saído em conflito com Holden Roberto da FNLA/GRAE. Praticamente limitado ao apoio dos ovimbundos, Savimbi estabelece a sua base na Zâmbia, e em alguns pontos de Angola.[161] A primeira operação da UNITA data de Dezembro de 1966, com um ataque a Cassamba,[17] no Leste, seguido de outro a Teixeira de Sousa.[162] De acordo com os militares portugueses, porém, o MPLA reivindica para si a autoria deste ataque em Março desse ano.[163] No entanto, um ano depois, a organização de Savimbi é expulsa da Zâmbia após ter atacado o caminho-de-ferro de Benguela[162] e um comboio que transportava cobre.[161][164] Embora frágil em relação ao armamento, a força da UNITA baseava-se essencialmente na personalidade forte de Savimbi que conseguia o apoio em massa das populações. Neste ano, a UNITA de Savimbi, aumenta a sua actividade na zona Leste, rumo ao Bié. Em 1968, com o apoio da população, a UNITA consegue infligir sérios danos ao caminho-de-ferro de Benguela, destruindo vários metros de carris e fazendo descarrilar várias composições.[165] De acordo com Savimbi, a UNITA passa a ter a sua sede no interior de Angola.[17]
Em 1963, o MPLA é expulso de Quinxassa por Mobutu, e fixa a sua nova sede em Brazavile. Porém, o MPLA continuava a ter dificuldades em progredir no terreno dada a presenças das tropas portuguesas e, mais importante, da presença do FNLA, com quem teve diversos confrontos e perdeu vários homens.[166] No ano seguinte, em 1964, o MPLA inicia uma ofensiva contra o enclave de Cabinda[167] mas não obtém grande êxito devido à pequena dimensão da região, à pouca receptividade da população[166] e ao facto de Portugal ter reforçado militarmente a zona para defender a Gulf Oil Company, uma empresa norte-americana de exploração de petróleo.[88] O ano de 1964, marca uma série de contratempos no interior do MPLA. No entanto, Agostinho Neto consegue efectuar uma reestruturação da organização, chegando a conseguir o reconhecimento do movimento por parte da OUA, que já tinha reconhecido a FNLA. Esta situação significa uma vitória política a nível interno e externo.[166]
Em Março de 1966, o MPLA abre a frente Leste[17] causando alguma surpresa às forças portuguesas que julgavam ter a situação militarmente controlada. Já há algum tempo que não havia actividade militar significativa por parte do MPLA, que se encontrava parado a Norte e, por seu lado, a FNLA efectuava apenas ataques pontuais.[165] O MPLA continuaria a sua progressão no terreno até Cuando-Cubango, penetrando na zona central do território, uma zona estratégica, importante pelos seus recursos naturais e onde se concentrava a população.[167] Por esta altura, as tropas portuguesas controlavam a maioria das populações, as vias terrestres entre as diferentes localidades e as infiltrações de guerrilheiros no território.[165] Chegou mesmo a ser equacionada, por oficiais médios e inferiores do Exército, uma solução política para o conflito como forma de proteger uma das principais fontes de receita que eram os diamantes e o Caminho de Ferro de Benguela. No entanto, o mesmo não pensavam os oficiais superiores, que gozavam de boas condições de vida em Angola, e nem o Governo de Lisboa que continuava intransigente na questão da independência angolana. Por esta altura, assiste-se a uma grande circulação monetária em Luanda.[165][168]
A partir de 1967, a estratégia do MPLA é o controlo da zona Leste de Angola, junto da fronteira com a Zâmbia. Juntos, o governo do MPLA, a população e a guerrilha começam obter algum sucesso militar e é criado o conceito de "zona libertada".[88][167]
Com a abertura da frente Leste, a guerra entra numa nova fase em que todas as forças lutam entre si, e em que o conflito ganha uma dimensão internacional. Em 1968, cerca de 2000 catangueses juntam-se às tropas portuguesas recebendo treino dos Comandos.[168] A UNITA dá apoio a tropas da Organização do Povo do Sudoeste Africano (SWAPO) que circulam entre a Zâmbia e a Namíbia através de Angola, nomeadamente pela região de Cuando-Cubango; em troca, a UNITA recebe armamento de qualidade. A África do Sul, tentando evitar a penetração da SWAPO na Namíbia, fornece pilotos e helicópteros às forças portuguesas.[168] A aliança luso-sul-africana, que depois incluiria a Rodésia, tomaria forma no Exercício Alcora, entre 1970 e 1974.[169]
Em 1968, o MPLA cria um novo quartel-general em Teixeira de Sousa, na fronteira com o Congo,[88] e começa a dirigir-se para Malanje com o objectivo de aí estabelecer a sua IV Região Militar.[17] Após o MPLA ter aberto a frente Leste, em 1966, o ELNA – Exército de Libertação Nacional de Angola –, braço armado da FNLA, teve necessidade de se afirmar para não perder terreno militar nem político para os outros movimentos de libertação, nomeadamente o MPLA, cuja imagem ganhava cada vez mais importância. Apoiado pelo Zaire, um grupo de homens instalou-se no interior de Angola para operar precisamente na região Leste. A primeira operação militar data de 19 de Maio de 1968, quando um grupo de 65 homens entra pela fronteira, perto de Teixeira de Sousa, para reconhecimento da localização das forças portuguesas, do MPLA e da UNITA.[3][17] Neste mesmo ano, o MPLA passa a ser o único movimento angolano a ser reconhecido pela OUA.[167]
Em 1970, o MPLA estava bem consolidado no terreno, sendo o movimento que mais apoio recebia da OUA. A sua zona de influência abrangia uma grande parte do território de Angola, dividido em seis regiões militares, sendo Dembos, Cabinda e Leste as mais activas operacionalmente:[2]
A abertura da IV RM pelo MPLA, em 1968, tinha um objectivo mais importante que o controlo de uma região: destinava-se a ligar o Norte ao Leste, sendo dado apoio logístico (armamento e munições, alimentos enlatados e medicamentos) a esta região a partir da Zâmbia – era a designada "Rota Agostinho Neto" que se estendia desde Luena e Lungué-Bungo, em direcção ao Luso e ao distrito de Lunda.[2][ligação inativa] Foi ao longo desta rota que tiveram lugar os maiores combates entre o MPLA e as forças portuguesas.[2]
Porém, os confrontos em simultâneo com o Exército português, assim como com os combatentes da UNITA, e a divergências internas, levam a um enfraquecimento do MPLA e ao abandono da frente Leste em 1973, passando a sua actividade militar a limitar-se à região de Cabinda; chegaram mesmo a tentar um novo acordo com o FNLA para a criação de um Conselho Supremo da Libertação de Angola, em Dezembro de 1972,[170] mas sem sucesso.[167] Este acordo provocou divergências internas no MPLA que vê as forças lideradas por Daniel Chipenda, comandante da III Região Militar, a abandonarem o movimento e a regressarem à Zâmbia, não sem antes terem perdido alguns homens em confrontos com os combatentes de Agostinho Neto.[170]
Por seu lado, a FNLA encontra-se numa situação de inactividade militar mas, com o apoio de Mobutu que reforçou a FNLA, voltou a ser reconhecida pela OUA, em 1971. No ano seguinte, a China ajuda o FNLA, no seguimento de relações diplomáticas com o Zaire, mas Mobutu limita essa ajuda com receio de perda de controlo do movimento. A partir desta data, e até ao fim do conflito, as acções da FNLA não passam de pequenas emboscadas e colocação de minas, não havendo contribuição política significativa para a libertação de Angola.[167]
As frequentes dificuldades de armamento e a ameaça do MPLA e da FNLA (que agora recebem apoio chinês),[171] levam a UNITA a alterar a sua estratégia e entrar em conversações com as autoridades portuguesas. Savimbi entra em acordo com madeireiros portugueses – "Operação Madeira"[172] – e com a Zâmbia. Assim, consegue maior margem de manobra na sua zona de actuação e limita a sua actividade sobre o caminho de ferro de Benguela.[173] A "Operação Madeira", iniciada em 1971, permitia "liberdade pessoal e a integridade física" a Savimbi, e é bem vista pelo Governo central que, assim, ganhava mais uma força contra os outros dois movimentos.[4][85][174] De acordo com informações militares dos portugueses,[4] a UNITA estava a perder terreno no Leste para o MPLA e, em 1969, cerca de 145 guerrilheiros decidem sair desta organização e voltar para a FNLA. Em 1970, a actividade da UNITA resumia-se a pequenas emboscadas, raptos e ameaças à população. A sua zona de influência é, de novo, afectada, nomeadamente a Oeste onde a FNLA e o MPLA progrediam.[4] Em 1973, o General Joaquim da Luz Cunha substitui Costa Gomes, e a UNITA volta a ser vista como inimigo. A UNITA retomaria as suas acções de guerrilha no início de 1974, sendo o único movimento a operar no interior de Angola e a ameaçar as tropas portuguesas.[4][170]
O ano de 1973 é um ano de alguma acalmia para as tropas portuguesas. O MPLA encontra-se numa situação militar difícil; a UNITA pouca actividade mantinha no terreno; e só a FNLA se mostrava activa a Norte, embora com limitações, dado ter as suas bases estabelecidas no Zaire e ser pressionada por Mobutu para se manter longe da fronteira com Angola.[171] Embora, sem grande actividade, Savimbi aproveita-se da sua situação privilegiada para anunciar a sua área de influência como "zona libertada" a jornalistas estrangeiros, ao mesmo tempo que recebe armamento; o MPLA recebe o apoio de instrutores cubanos e volta a operar na região de Cabinda; a FNLA opera no Uíje e planeia uma operação em Cabinda.[170][171]
Numa perspectiva mundial, os EUA estavam a perder o interesse estratégico nesta região de África, e a tomarem mais atenção ao Sudeste da Ásia, o que implicava uma menor ajuda à FNLA; a União Soviética há já algum tempo que vinha a reduzir o seu apoio ao MPLA. Por outro lado, as informações disponíveis mostravam que, embora Portugal liderasse o conflito militarmente, não conseguiria derrotar as forças angolanas.[175]
Em Lisboa, desde há alguns anos que se desenvolviam organizações de contestação contra a Guerra Colonial. A Ação Revolucionária Armada (ARA), uma organização portuguesa criada pelo PCP nos anos 60, cujo objectivo era a luta armada contra a ditadura fascista, e as Brigadas Revolucionárias, uma organização de esquerda, lutavam contra as guerras coloniais. Realizaram diversas operações de sabotagem e ataques à bomba a alvos militares, como os ataques à base aérea de Tancos onde destruíram vários helicópteros, em 8 de Março de 1971, e sede à da NATO no concelho de Oeiras, em 27 de Outubro do mesmo ano.[17] Destaque-se, também, as sabotagens aos navios Cunene, Vera Cruz (de transporte de tropas) e Niassa, em 9 de Abril de 1974.[176][177][178] A falta de popularidade da Guerra Colonial entre muitos portugueses, alguns deles universitários,[179] levou à criação de vários jornais e revistas da esquerda radical, como o Cadernos Circunstância, Polémica[180] Cadernos Necessários, Tempo e Modo[181] que apelavam por soluções políticas para os problemas coloniais.[181]
No último ano do conflito, a opinião generalizada entre os militares era a de que esta guerra se encontrava numa situação insustentável.[182] O desconforto dos militares portugueses dá o seu primeiro sinal oficial em Agosto de 1973 com a contestação a um decreto-lei que incorporava oficiais milicianos que não tinham participado na guerra; o decreto-lei atribuía-lhes o posto de Capitão passando a comandantes de uma companhia de caçadores.[17][183] No seguimento desta contestação, é criado o Movimento dos Capitães que, em Setembro, apresenta um pedido individual de demissão de oficial do Exército. Nos meses seguintes, o movimento reuniu-se em vários locais de Portugal, Guiné, Moçambique e Angola, para prosseguir com a mobilização dos oficiais e a pensar numa revolução.[17] No início de 1974, depois de graves acontecimentos em Moçambique, o Movimento dos Capitães reúne-se, e expõe as suas preocupações numa carta ao General Spínola, assinada por 180 oficiais.[17] Em Lisboa também se dão movimentações políticas e, em Março, tanto Costa Gomes como Spínola, são demitidos, o que determina o fim das operações militares em Angola.[184] A crescente instabilidade em Portugal culminaria em 25 de Abril de 1974, com a Revolução dos Cravos, um golpe de estado realizado pela esquerda militar em Lisboa, que depôs o governo de Marcelo Caetano.[34][185]
O "25 de Abril" terá apanhado de surpresa os movimentos de libertação de Angola assim como as grandes potência mundiais, que tinham reduzido o seu apoio aos movimentos. A China, por seu lado, viu aqui uma oportunidade de aumentar a sua influência na região enviando 100 instrutores militares para apoiar a FNLA; não querendo ficar para trás, a URSS fez o mesmo com o MPLA.[175][186] Do lado angolano, as três forças de libertação continuavam sem chegar a um entendimento, embora já tivessem sido feitas algumas tentativas para a constituição de organismos comuns às duas organizações, nomeadamente entre o MPLA e a FNLA, em 1966 e 1972.[17][187] Militarmente, a FNLA era o mais forte dos movimentos, e preparava-se para operações no Norte; a UNITA estava, nesta altura, limitada ao Huambo e ao Bié, com uma pequena estrutura militar, o que lhe retirava poder negocial; e o MPLA passava por momentos difíceis internamente devido a uma cisão com a saída dos irmãos Andrade que tinham criado a "Revolta Activa".[187]
Em Julho de 1974, o Almirante Rosa Coutinho, politicamente próximo do MPLA, é nomeado para presidente da Junta Governativa de Angola,[17][188] ao mesmo tempo que Agostinho Neto consegue assumir, de novo, o controlo do MPLA, que se encontrava numa fase bastante negativa de disputas internas. No entanto, na primeira conferência do partido, ocorrida em Lusaca, Neto e Chipenda obtêm a mesma votação, provocando nova separação entre ambos, e dando origem, posteriormente, às Forças Armadas Populares de Libertação de Angola (FAPLA) apoiantes de Neto.[188]
Até ao final do ano, foram vários os confrontos entre as forças de libertação, sendo o principal motivo o controlo da capital, Luanda.[188] Após o cessar-fogo com os portugueses em Outubro, no mês seguinte os três movimentos entram em Luanda, ocorrendo violentos confrontos a 10 de Novembro dos quais resultaram cerca de 50 mortos.[188] Até ao final do ano serão assinados, novamente, novos acordos entre eles,[17] mas os confrontos iriam continuar, intermitentemente, não só em Luanda, como por todo o país.[188] No início de 1975, a 3 de Janeiro, os três movimentos, pressionados pela OUA, reuniram-se em Mombaça e assinaram um acordo de entendimento em que ficou estabelecido unirem-se numa única frente independente para negociar com Portugal e manter a paz em Angola.[17][189]
Finalmente, a independência de Angola foi estabelecida a 15 de Janeiro de 1975, com a assinatura do Acordo do Alvor, no Algarve, entre os três movimentos no conflito e o Governo português. Foi igualmente estabelecida a formação de um Governo de Transição, composto por todas as partes que assinaram o acordo, assim como a integração das três forças numa única Força Militar Mista, que também incluía, até 29 de Fevereiro de 1976, militares das Forças Armadas Portuguesas. A independência e a passagem de soberania ficaram marcadas para o dia 11 de Novembro desse ano.[18]
Durante a Guerra Colonial Portuguesa, as forças portuguesas utilizaram a designada Acção Psicológica (baseada na doutrina militar norte-americana e francesa),[190] cujo objectivo era obter o apoio da população; desmoralizar o inimigo, procurando mesmo que este passasse a cooperar com o seu adversário; e manter elevado o moral das próprias tropas.[191] Para controlar e conquistar "o coração" das populações, foram criados de programas de educação, ajuda sanitária, económica e religiosa, dando-lhes melhores condições de vida,[191] através dos chamados "aldeamentos" e "reordenamento rural".[190]
O principal objectivo do programa de aldeamentos a Norte e a Leste era o controlo da população, nomeadamente em zonas onde se verificava mais acção. Nas regiões Centro e Sul, onde os confrontos foram em muito menor número, não era suposto ter lugar o dito programa. Nestas regiões, o frente-a-frente entre os colonos europeus e a população local era pela posse de terras e pelos mercados.[192] No início da década de 1970, cerca de um milhão de pessoas tinham sido realojadas no âmbito do programa.[193]
Após o início do conflito, centenas de milhar de angolanos refugiaram-se no vizinho Zaire, a norte de Angola. Esta saída em massa da população acabou por provocar um forte abandono das plantações de café. Por isso, uma das preocupações das forças portuguesas foi o criar aldeamentos na região Norte do país para assim atrair a população; uma parte considerável dos refugiados acabaria por regressar, criando, de novo, condições para a produção de café que, embora melhorasse a situação de vida dos refugiados dando-lhes emprego, servia mais os interesses económicos de Portugal. No entanto, dado o elevado esforço de guerra português ao longo do conflito, o orçamento atribuído aos programas educacionais era cada vez mais reduzido, deteriorando, assim, a qualidade do ensino, do apoio social e do emprego. A Norte, o programa não teve o sucesso esperado, pois a acção dos movimentos nacionalistas limitava-se a entradas em território angolano a partir das bases que tinham no Zaire, e o contacto com as populações era diminuto.[194]
As forças de libertação, no caso, o MPLA e a UNITA, ter-se-ão apercebido da estratégia portuguesa e, em meados da década de 1960 começaram preparar a concentrar as suas forças na frente Leste. Portugal, partindo do princípio de que os ataques se iriam processar de forma idêntica ao Norte, iniciou, também, uma concentração das suas tropas na fronteira com a Zâmbia, descurando a zona rural onde se situavam as populações que davam apoio aos nacionalistas. Com o início dos combates na frente Leste verificou-se um novo êxodo da população angolana para a Zâmbia e para o Botswana. De novo, Portugal utilizou os "aldeamentos" para segurar as populações e, de acordo com os militares, até 1969, mais de 70% daquelas estavam já realojadas. O programa de realojamento da região Leste foi mais difícil do que o da região Norte dado o contacto prévio havido entre os guerrilheiros e a população, havendo uma maior resistência desta perante a acção mais violenta dos portugueses. A qualidade do programa nesta região acabou por se revelar de inferior qualidade, chegando mesmo a piorar a situação económica e social da população, tal como no Norte, não só pelo aumento das despesas de guerra, como pela resistência em arranjar mão de obra qualificada para ir trabalhar para uma zona de maior conflito. Também nesta região se verificou uma forte diminuição da actividade agrícola que poria em causa o abastecimento de bens alimentares.[195] Embora Portugal conseguisse controlar a população, no início de 1970, os ataques dos guerrilheiros às tropas portuguesas, e às aldeias, tiveram um aumento significativo face ao ano anterior; este facto é também verificável face ao aumento das zonas controladas pelos movimentos nacionalistas.[196]
A região Centro de Angola, zona com maior densidade populacional, era maioritariamente habitada pelos ovimbundos. Dado haver haver alguma colaboração destes com os portugueses, e pelo facto de esta região se localizar longe das fronteiras com a Zâmbia e com o Zaire, não era expectável que houvesse alguma ligação significativa com os guerrilheiros. Assim, o Governo português garantiu que o programa de realojamento da população não teria lugar nesta zona. No entanto, um ano após a abertura da frente Leste, em 1966, as forças de libertação estavam a evoluir favoravelmente no terreno, o que causou sérias preocupações entre as forças portuguesas, levando a que o Governo recuasse nas suas promessas de não haver aldeamentos, sendo estes implementadas a partir de 1968. A população, por seu lado, não compreendeu o porquê desta decisão dado viverem longe das zonas de conflito; pensavam que era uma forma de os colonos tomarem posse das suas terras. De facto, entre 1968 e 1970, a terra ocupada pelos colonos no Huambo duplicou; em contrapartida, a terra arada pela população nativa reduziu em mais de um terço. O aumento de terra na posse dos colonos era vista como um aumento da segurança para os portugueses.[197]
O programa de concentração da população na região Sul foi a que menos sucesso teve dada a natureza económica e social da população: eram nómadas, ou semi-nómadas, dedicados à pastorícia ou à agro-pastorícia. As ligações que tinham à cultura ocidental eram mínimas, e defendiam as suas tradições e independência. Por outro lado, as características geográficas do sul de Angola - zonas áridas e semi-áridas - dificultava as manobras dos guerrilheiros, pela escassa existência de vegetação. Assim, haveria pouca probabilidade de os habitantes do sul se envolverem no conflito. Nesta região, os aldeamentos causaram sérios danos ao nível económico e cultural das populações pois foram afastados da terra onde sempre viveram. Dada a resistência de alguns em serem realojados, e de alegados contactos com os guerrilheiros, a PIDE foi chamada para o terreno. Para além de razões militares, havia também a questão da vontade de aumentar a posse de terras pelos colonos que, segundo estes, conseguiam conseguiam obter mais produtividade na criação de gado, com o seus meios mais avançados, que os angolanos. Desta forma, várias terras foram ocupadas tanto por fazendeiros portugueses como pelo próprio Governo. No entanto, se uns defendiam os aldeamentos, pois ficariam com mais terras, outros viam o programa de realojamento como uma desvantagem comercial pois ficavam sem quem lhes adquirisse os seus produtos. No fim, porém, quem ditava as ordens eram os militares, e não os fazendeiros ou comerciantes. Embora tivesse sido decidida uma redução dos aldeamentos, por parte dos militares, pois havia mais propaganda nacionalista entre a população realojada, aqueles continuaram dado o projecto, entre Portugal e a África do Sul, de construir uma série de barragens ao longo do rio Cunene.[198]
Em relação ao inimigo, a táctica dos portugueses era criar um fosso entre os guerrilheiros e a população, tentando criar uma má imagem daqueles junto desta; tentava-se, ainda, apelar à sua rendição garantindo-lhes toda a ajuda. Por seu lado, as forças independentistas dirigiam-se às populações com ideais de justiça, paz, independência e auto-determinação.[191]
Entre as tropas portuguesas também também era aplicada a acção psicológica reforçando-lhes o moral e transmitindo-lhes a ideia de que combatiam uma causa justa, recorrendo-se da exaltação patriótica.[191] Organizações como o Movimento Nacional Feminino (MNF)[199] e a Secção Feminina da Cruz Vermelha Portuguesa (CVP), foram de grande importância entre as tropas ao utilizarem a figura da mulher para, moralmente, os fortalecer através de eventos, como a festa de Natal, visita de artistas, angariação das madrinhas de guerra para troca de correspondência entre os soldados, apoio a feridos e envio de lembranças.[200]
Após o "25 de Abril", Portugal, durante o processo de descolonização, assistiu a um regresso forçado de milhares de pessoas, os chamados "retornados". O número de retornados não é certo mas, do total registado nos censos de 1981 - 505 078 - cerca de dois terços vinham de Angola, e grande parte dos retornados era natural de Angola.[201][202] Ainda assim, mesmo nas condições difíceis em que o país ficou, cerca de 10% dos antigos colonos permaneceram no país.[203] No período que decorreu de Maio a Novembro de 1975, decorreu uma operação de salvamento de civis por via aérea que, no total, transportou para Lisboa 173 982.[201] Por via marítima, meio menos utilizado, viajariam para Portugal 25 131 cidadãos, entre 1974 e 1975.[204]
A opinião generalizada dos retornados sobre a guerra é de que o conflito fez-se para acabar com o colonialismo e não contra os brancos, embora haja também um ponto de vista que defende que o objectivo era expulsar os colonos e apropriar-se dos seus bens.[205] Quando se deu o "25 de Abril" em Portugal, muitos dos portugueses que foram trabalhar para Angola, e também aqueles que eram naturais de lá, viram a revolução como uma possível hipótese de autonomia. Com a guerra, Angola assistiu a um forte desenvolvimento de várias infraestruturas - estradas, pontes, aeroportos, caminhos-de-ferro - construídas para apoiar logisticamente o esforço de guerra dos portugueses. Estas infraestruturas eram fulcrais ao nível comercial num país de grande dimensão que precisava exportar a sua produção. As diversas indústrias aí instaladas, mesmo como as empresas e as fábricas, assistiram a um grande desenvolvimento durante a guerra; a possibilidade de autonomia face a Portugal só traria mais vantagens.[205] Tal não aconteceria, pois pouco tempo antes da assinatura do primeiro cessar-fogo (com a UNITA, em Junho de 1974), as forças de libertação entrariam em conflito entre si, com períodos pontuais de acalmia.[206]
Várias cidades, vilas e aldeias fundadas pelos portugueses, e que se desenvolveram sob o governo de Portugal, viram os seus nomes alterados após a independência,[207] por exemplo, Nova Lisboa para Huambo, Vila Marechal Carmona para Uíge ou São Salvador do Zaire para M'banza Congo. Todas as estátuas e monumentos colocados que lembrassem o período da permanência portuguesa foram retiradas.[208]
A Guerra Colonial consumiu cerca de 44% do orçamento português.[209][210] Este gasto excessivo, desviou fundos necessários ao desenvolvimento das infraestruturas em Portugal e contribuiu para a instabilidade crescente na nação europeia. No entanto, o crescimento do PIB português durante o período da Guerra Colonial, 1961-1974, foi grande, atingindo uma taxa média de crescimento de 6%.[211] O PIB das províncias ultramarinas de África teve, também, um crescimento significativo, juntamente com a construção de infraestruturas.
Após o fim do conflito entre Portugal e as três forças de libertação angolanas, estas ocuparam os edifícios deixados vagos com a partida dos portugueses. Com um governo de transição formado pelos três movimentos e com representação portuguesa, o sentimento de paz aproximou as populações dos centros urbanos. No entanto, pouco tempo depois, têm início combates entre os três movimentos, nomeadamente entre o MPLA e a FNLA,[212] com vista ao controlo das diferentes regiões de Angola.[17][213] Os principais países aliados das forças independentistas, União Soviética, Cuba, EUA e China, encararam o Acordo do Alvor como apenas mais um efémero acordo e,[189] na prática, o Governo de Transição pouca acção teve nos meses que se seguiram à assinatura do Acordo:[212] se, por um lado, os três movimentos angolanos não se entenderam, por outro lado, o clima político em Portugal era de revolta, desta vez por parte da ala direita, que tentou um golpe militar, falhado, liderado pelo general Spínola, a 11 de Março.[214] Esta instabilidade política em Portugal, o Verão Quente, levou a uma menor atenção para Angola, ao mesmo tempo em que as tropas se recusavam a lutar naquele país.[212]
Por esta altura, a África do Sul, que apoiava Portugal há alguns anos, vê o crescente aumento de influência do MPLA como uma ameaça à sua presença em Angola, nomeadamente ao projecto de construção da barragem de Cunene, e envia tropas para Calueque para protecção dos trabalhadores. O governo português, de esquerda neste período, não vê com bons olhos a entrada daquelas tropas.[215] De tendência anticomunista, as forças sul-africanas depressa se uniram à UNITA e à FNLA, apoiando-os militarmente.[215] Verificando tratar-se de uma séria ameaça ao MPLA, Cuba decide, então, intervir no conflito.[216]
Com o apoio dos seus respectivos aliados,[217] o MPLA, a UNITA e o FNLA dão início a uma guerra civil que iria durar de 1975 até 2002. O principal confronto seria entre o MPLA, apoiado pela União Soviética e por Cuba, e a UNITA, na zona sudoeste de Angola; as forças do FNLA encontravam-se inseridas no exército da África do Sul.[218] O MPLA, constituído por elites e reconhecido pela OUA, foi o movimento dominante nos anos que se seguiram à independência.[219]
A partir do dia 11 de Novembro de 1975, dia da independência de Angola, mais de 30 países envolveram-se na longa guerra civil que se seguiu, apoiando ao nível logístico e em equipamentos os três movimentos. A União Soviética e Cuba aproveitaram o momento - a saída de Portugal (as últimas tropas chegam a Lisboa em 23 de Novembro)[17] e situação de fragilidade dos EUA -, para aumentarem o seu apoio ao MPLA. Pela frente iriam encontrar a ajuda do Zaire e da África do Sul que não queriam ficar para trás no processo de descolonização de Angola.[220]
Com o abandono de milhares de cidadãos portugueses, Angola viu-se perante uma situação económica e administrativa difícil, pois ficou sem uma boa parte da mão de obra qualificada, sem um governo organizado e em situação de guerra. As importantes indústrias do café e dos diamantes que, durante uma significativa parte da guerra assistiram a um forte aumento das exportações,[221] estagnaram, mantendo-se, no entanto, em pleno funcionamento a do petróleo, no enclave de Cabinda que,[203] a partir de 1974, regista um forte aumento das exportações.[222] O país depois da independência também aumentou a dependência em relação as receitas da extração do petróleo.[223]
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