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visão geral dos direitos LGBT no Brasil Da Wikipédia, a enciclopédia livre
O reconhecimento legal e judicial dos direitos LGBT no Brasil remonta ao Império do Brasil, quando foi uma das primeiras nações das Américas e do mundo a revogar a lei de sodomia vigente, herdada de Portugal e que proibia atos sexuais entre pessoas do mesmo sexo, em 1830, durante o reinado de Dom Pedro I, quando foi promulgado o Código Penal do Império.[7] Desde a redemocratização, o Poder Legislativo tem encontrado resistência para reconhecer as principais demandas por igualdade de direitos entre LGBTs e cis-héteros.[8] Coube então ao Poder Judiciário, sobretudo a partir da década de 2010, estender direitos para a comunidade LGBT e fazer do Brasil um país avançado em direitos dessa população.[9][10][11] O Poder Executivo garantiu alguns direitos, se destacando pela criação de medidas de combate à violênca e ao preconceito.[12] No entanto, o Brasil ainda registra altos índices de violência contra pessoas LGBT;[13] em 2016, o Brasil foi referido como o país mais mortal do mundo para LGBTs pelo jornal norte-americano The New York Times.[14][15][16]
Direitos LGBT no Brasil | |
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Brasil | |
Status | Legal desde 1830,[1] mesma idade de consentimento |
Identidade de gênero | Com cirurgia de redesignação sexual e decisão judicial permitida desde 2009, cirurgia e decisão judicial não exigidas desde 2018[2] |
Serviço militar | Todas as pessoas LGBT podem servir abertamente[3] |
Proteções contra discriminação | Proteções legais explícitas em todo o país com base na orientação sexual e identidade de gênero desde 2019 |
Direitos familiares | |
Reconhecimento de relacionamentos | O casamento entre pessoas do mesmo sexo é legal em todo o país desde 2013[4][5] |
Adoção | Legal desde 2010[6] |
Foram propostos no Congresso Nacional nas décadas anteriores três projetos de leis que, se aprovados, elevariam a legislação brasileira ao nível de diversos países europeus no que diz respeito aos direitos LGBT. São eles: o PL 1151/1995, que propõe a autorização da união civil entre pessoas do mesmo sexo, de autoria da política Marta Suplicy,[17] o PLC 122/2006, que pedia a criminalização da homofobia e da transfobia, de autoria da política Iara Bernardi, e o PL 5002/2013, sobre o direito à identidade de gênero, de autoria dos políticos Jean Wyllys e Erika Kokay.[18] Embora tais projetos de leis nunca tenham sido aprovados pelo Congresso, esses direitos foram garantidos à população LGBT através de decisões de órgãos e instituições do Poder Judiciário. Em maio de 2011, o Supremo Tribunal Federal, de forma unânime, reconheceu a união estável homoafetiva como entidade familiar[19] e, em outubro de 2011, o Superior Tribunal de Justiça afastou o óbice relativo à diversidade de sexos e determinou o prosseguimento do processo de habilitação de casamento entre duas mulheres, pois entendeu que o Código Civil de 2002 não veda expressamente o casamento entre pessoas do mesmo sexo e não há como se enxergar uma vedação implícita ao casamento homoafetivo sem afronta a caros princípios constitucionais. Consequentemente, em maio de 2013, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou a Resolução n° 175, que veda a todos os cartórios do País a recusa de habilitar e celebrar casamentos entre duas pessoas do mesmo sexo e converter a união estável homoafetiva em casamento.[20] Em março de 2018, o Supremo entendeu que a identidade de gênero é manifestação da própria personalidade da pessoa humana e, como tal, cabe ao Estado apenas o papel de reconhecê-la.[21] Assim, a Corte autorizou a mudança do prenome e da classificação de sexo/gênero por pessoas transgênero no registro civil sem a necessidade de qualquer exigência além da manifestação de vontade do indivíduo.[22] Em junho de 2019, o Plenário do Supremo entendeu que houve omissão inconstitucional do Congresso Nacional por não editar lei que criminalize atos de homofobia e de transfobia[23] e determinou que a LGBT-fobia seja enquadrada nos crimes previstos na Lei Nº 7.716/1989 (Lei do Racismo), que prevê penas de até 5 anos de prisão, até que o Legislativo edite lei sobre a matéria.[24] Em outro julgamento de agosto de 2023, o Supremo reconheceu que atos ofensivos praticados contra pessoas da comunidade LGBT também podem ser enquadrados como crime de injúria racial.[25]
Todos os principais direitos reivindicados pela população LGBT vieram através de decisões do Judiciário, com base em interpretações da Constituição, e não do Legislativo. Sendo assim, a população LGBT brasileira não possui nenhum de seus principais direitos assegurados na lei.[26] Cabe ressaltar que a falta de legislação faz com que os LGBTs sofram tentativas de violação de seus direitos em algumas regiões do país, a exemplo do que aconteceu na 13.ª Promotoria de Justiça de Florianópolis, que chegou a impugnar mais de 100 casamentos homoafetivos sob a alegação de que a resolução do CNJ não se sobrepõe à lei (depois, todos esses casamentos foram autorizados judicialmente).[27][28][29] No julgamento do Supremo que reconheceu a união homoafetiva, o ministro-relator, Carlos Ayres Britto, disse que "a ausência de lei não é ausência de direito, até porque o direito é maior do que a lei".[30][31] Até 2017, havia 99 projetos de leis sobre direitos LGBT tramitando no Congresso (muitos sobre os mesmos temas). No mesmo período, havia outros 24 PLs contrários aos direitos LGBT em trâmite no Legislativo brasileiro, todavia, ainda que aprovadas, tais leis poderiam ter sua constitucionalidade questionada na justiça.[32][33][34] Para o advogado Paulo Iotti, que participou de diversas ações sobre direitos LGBT que foram a julgamento no Supremo, a Corte se mostra alternativa para um Congresso conservador: "O Congresso Nacional, provavelmente representando a sociedade, está cada vez mais conservador, reacionário e insensível aos direitos humanos de minorias e grupos vulneráveis. Nessa situação, o Supremo acaba sendo a última esperança da população LGBT+", disse o jurista em entrevista para o site Ponte.[35] De acordo com o ministro Dias Toffoli, "O Supremo Tribunal Federal está atento às demandas dos LGBTI+ por respeito, tratamento isonômico e inclusão social, conforme ilustram os vários julgamentos tomados por esta Corte, lastreados na dignidade da pessoa humana e no direito à igualdade".[36] Para o ministro Luís Roberto Barroso, o Supremo tem cumprido “as duas grandes missões” da Corte, de proteger as regras da democracia e os direitos fundamentais de todos.[37]
O Poder Executivo, apesar de participação pouco expressiva, garantiu direitos à população LGBT. Entre eles, destaca-se o decreto presidencial de Dilma Rousseff que permite a transgêneros usarem seu nome social em todos os órgãos públicos, autarquias e empresas estatais federais.[38] O Executivo também tem buscado enfrentar a discriminação e a violência contra LGBTs, podendo citar-se como exemplo o programa "Brasil Sem Homofobia" lançado no governo Lula.[39] Praticamente todos os presidentes brasileiros do século XXI, Fernando Henrique Cardoso,[40] Luiz Inácio Lula da Silva,[41] Dilma Rousseff[42] e Michel Temer,[43] se mostraram favoráveis aos direitos LGBT e defenderam a igualdade de direitos, sendo a única exceção Jair Bolsonaro.[44]
Atividade sexual entre pessoas do mesmo sexo legal | Sim, desde 1830[7] |
Mesma idade de consentimento | Sim, desde 1830[7][45] |
Pessoas LGBT autorizadas a servirem abertamente nas Forças Armadas | Sim, a legislação militar não estabelece proibições ao alistamento.[46] |
Homossexualidade desclassificada como doença | Sim, desde 1985[47] |
Proibição da terapia de reorientação sexual | Sim, proibida aos psicólogos de 1999 a 2017, e desde 2019.[48][49][50] |
Refúgio para estrangeiro perseguido em seu país de origem por motivos relacionados a orientação sexual e/ou identidade de gênero | Sim, desde pelo menos 2002[51] |
Visto de permanência para estrangeiro em união homoafetiva com brasileiro | Sim, desde 2003[52] |
Proteção à mulheres LGBTs da violência doméstica e familiar | Sim, desde 2006 para mulheres lésbicas e bissexuais e que vivem em relação homoafetiva e desde 2022 para mulheres transgêneros.[53][54][55] |
Cirurgia de redesignação sexual gratuita pelo Sistema Único de Saúde | Sim, desde 2008[56] |
Mudança de nome e retificação do sexo nas certidões de nascimento e casamento de pessoas transgêneros | Sim, desde 2009 com exigência da cirurgia de redesignação sexual e decisão judicial e desde 2018 com base apenas na autodeterminação.[57][58] |
Adoção por casais homoafetivos | Sim, reconhecida oficialmente desde 2010[59] |
União estável entre pessoas do mesmo sexo | Sim, desde 2011 em todo o País.[19] |
Licença parental para casais homoafetivos | Sim, desde o reconhecimento da união homoafetiva em 2011, casais homoafetivos que tenham filhos têm direito aos diversos tipos de licença parental.[60] Em 2024 foi reconhecido que a mãe não gestante em união estável homoafetiva também tem direito à licença-maternidade.[61] |
Casamento entre pessoas do mesmo sexo | Sim, desde 2013 em todo o País.[20][27][28] |
Reprodução assistida para casais homoafetivos | Sim, desde 2013[62][63][64] |
Paternidade ou maternidade automática para ambos os cônjuges ou companheiros após o nascimento da criança gerada por técnica de reprodução assistida | Sim, desde 2016[65] |
Direito ao uso do nome social por pessoas transgêneros | Sim, desde 2016 em nível federal.[66] |
Transexualidade desclassificada como doença e proibição da terapia de conversão para transgêneros | Sim, desde 2018[67] |
Criminalização da LGBTfobia | Sim, desde 2019
A Lei nº 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), em seu artigo 2°, protege toda mulher da discriminação com base na orientação sexual.[70]
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HSH autorizados a doarem sangue | Sim, de 2011 a 2013, e desde 2020[74] |
Transgêneros privados de liberdade autorizados a cumprir pena em presídios destinados ao gênero com o qual se identificam e LGBT privados de liberdade autorizados a cumprir pena em presídios que tenham alas ou celas destinadas ao público LGBT, se assim desejarem | Sim, desde pelo menos 2020[75][76] |
Registro de nascidos intersexo com o campo sexo ignorado no registro de nascimento | Sim, desde 2021[77] |
Profissionais da educação autorizados para trabalhar as questões relacionadas a orientação sexual e identidade de gênero | Sim Embora tenham sido criadas diversas leis estaduais e municipais proibindo o ensino sobre gênero e orientação sexual nas escolas inspiradas no movimento Escola Sem Partido, o Supremo Tribunal Federal tem derrubado todas elas.[78][79][80][81][82] |
Autorização para o uso da linguagem neutra de gêneros gramaticais | Sim Embora tenham sido criadas leis estaduais e municipais proibindo o uso de linguagem neutra no ensino, o Supremo Tribunal Federal tem derrubado tais leis.[83] |
Estudantes de escolas públicas e particulares protegidos da discriminação por orientação sexual e identidade de gênero e do bullying de cunho machista e homotransfóbico | Sim, desde pelo menos 2024[84] |
Transgêneros autorizados a utilizar banheiros, vestiários e demais espaços segregados por sexo de acordo com a sua identidade de gênero | / Pendente; em junho de 2024, o STF rejeitou, por questões processuais, um recurso que discutia se uma pessoa trans pode ou não usar banheiros conforme sua identidade de gênero. A questão específica do direito de pessoas trans de utilizarem banheiros e demais espaços de acordo com sua identidade de gênero, sem discriminação, foi trazida ao Supremo em cinco Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs 1169, 1170, 1171, 1172 e 1173), que aguardam julgamento.[85][86] Todavia, instâncias inferiores têm condenado a indenização por dano moral quem veta o uso do banheiro conforme a identidade de gênero.[87][88] |
Terceira opção de gênero no registro civil | / Incerto; não há um reconhecimento oficial de uma terceira opção de gênero, mas desde 2020 pessoas não binárias têm conseguido autorizações judiciais para registrar o gênero com uma terceira opção em seus documentos.[89][90][91] |
Nascidos intersexo incapazes protegidos contra procedimentos cirúrgicos desnecessários quando sejam realizados sem seu consentimento prévio, livre e informado, exceto em casos de risco médico ou de necessidade | Não,[92] a resolução CFM nº 1.664/2003 não prevê a proteção.[93] |
As decisões judiciais a seguir foram conseguidas antes que houvesse qualquer norma garantindo tais direitos à população LGBT.
Abaixo, a cronologia dos direitos LGBT adquiridos em nível federal, isto é, válidos para toda a população brasileira, não incluindo decisões restritas a estados ou municípios.
Este artigo ou seção pode conter informações desatualizadas. |
O marco inicial na luta pelo reconhecimento das uniões entre pessoas do mesmo sexo é a apresentação na Câmara dos Deputados do projeto de lei n.º 1151, de 1995, da então deputada federal Marta Suplicy, que instituía a união civil entre pessoas do mesmo sexo, a partir do qual iniciou-se o debate nos meios de comunicação de massa do país, com inúmeras manifestações de apoio e de repulsa.[149] O relator designado, Roberto Jefferson, apresentou um substitutivo instituindo a parceria civil registrada entre pessoas do mesmo sexo, que foi aprovado na comissão especial em final de 1996, mas aguarda até hoje sua votação no plenário da Câmara.
Homossexualidade ilegal: | |
Prisão; pena de morte não posta em prática | |
Morte sob milícias | |
Prisão, com encarceramento ou detenção | |
Prisão, mas não posto em prática1 |
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Homossexualidade legal: | |
Reconhecimento de casamentos feitos em outras jurisdições | |
Reconhecimento limitado (de residentes estrangeiros) | |
Sem reconhecimento legal, mas algumas instituições oferecem certificação não vinculativa | |
Reconhecimento de uniões: | |
Coabitação não registrada | |
Nenhum | |
Restrições à liberdade de expressão |
Enquanto o projeto continuava parado no Congresso Nacional (onde além do plenário da Câmara, teria ainda que ser apreciado no Senado Federal e submetido à sanção presidencial para que pudesse entrar em vigor), interessados em obter o reconhecimento de sua união se dirigiam ao Poder Judiciário, que em muitas partes do país reiteradamente reconhecia os direitos decorrentes dessas uniões. As decisões favoráveis, contudo, não abrangiam todos os estados, sendo que no Rio de Janeiro o Tribunal de Justiça local vinha predominantemente negando a equiparação dessas uniões à união estável entre sexos opostos.
Merece destaque também a vigência da Lei Maria da Penha (Lei n.º 11.340/06), que em seu art. 5º explicita a existência de uniões homoafetivas femininas.[116][150] A lei, destinada a proteger a mulher da violência doméstica, deixou claro que também merece proteção a mulher que sofre violência de sua companheira. Embora o âmbito da lei seja em matéria penal, a menção de unidades familiares homoafetivas é um avanço no conceito de família existente na lei brasileira.[151]
O Tribunal Superior Eleitoral já proferiu decisão equiparando um relacionamento homoafetivo às uniões estáveis, ao decidir que o companheiro homoafetivo tem o mesmo impedimento eleitoral que o cônjuge ou companheiro do sexo oposto do ocupante de cargo eletivo.
A equiparação da união estável entre homossexuais e a prevista no artigo 1.723 do Código Civil foi objeto da Arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) n.º 132, que tramita no Supremo Tribunal Federal. A ação foi proposta pelo governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral Filho,[152] e como os efeitos de ações dessa natureza atingem a todos, em todo o território nacional, sua eventual procedência poderá significar o efetivo reconhecimento das uniões homoafetivas, dando-lhes os mesmos direitos reconhecidos ao companheiro heterossexual, sem a necessidade de se ter que reivindicá-los judicialmente. Após parecer do Advogado Geral da União concordando com o pedido em parte, mas ressaltando que os efeitos da decisão não poderiam atingir direitos de indivíduos de todo o território nacional (por se tratar de pedido formulado por governador de estado), a Procuradora Geral da República interina, Deborah Duprat, ingressou com ação de mesma natureza, solicitando tramitação em conjunto.
O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu no dia 5 de maio de 2011, em decisão unânime, a equiparação da união homoafetiva à heterossexual.[19] A decisão tem eficácia contra todos e efeito vinculante. Os Ministros do tribunal reconheceram que a relação homoafetiva é uma família e afirmam que um casal gay, numa união estável, tem os mesmos direitos de um casal heterossexual, numa união estável. Adoção de filhos, pensão/aposentadoria, plano de saúde e herança são alguns dos exemplos.
Até o reconhecimento no STF, o fato de não existir lei federal reconhecendo qualquer forma de união entre pessoas do mesmo sexo (pela Constituição Federal, apenas lei federal pode dispor sobre direito civil, que inclui aspectos como casamento, família, direito à herança) não significa que duas pessoas capazes não possam firmar um contrato e estabelecer direitos e obrigações entre elas. Não havendo disposições contrárias à lei, tais contratos podem ser registrados junto a um Oficial de Registro de Títulos e Documentos (conforme art. 127 da Lei de Registros Públicos - Lei Federal n.º 6.015, de 1973).
A possibilidade de se registrar tais contratos gerou dúvidas, e alguns oficiais de registro (mais conhecidos como cartórios) no Rio Grande do Sul se recusavam a registrar contratos dispondo sobre a união entre pessoas do mesmo sexo, interpretando que a Constituição Federal só permitiria tais uniões entre um homem e uma mulher. A Corregedoria Geral da Justiça do Estado, considerando que o fato de que a simples omissão na Constituição não veda as uniões, expediu em 2004 norma determinando que os cartórios efetuassem tais registros, baseado no art. 127 da Lei de Registros Públicos, que permite que qualquer título ou documento não registrável em outro ofício (cartório) seja registrado em Títulos e Documentos.[153] Decisão nesse sentido já obrigava os cartórios da cidade de São Paulo a registrarem esses contratos.[154]
Esse registro, contudo, não tem força por si só de gerar direitos aos casais contra terceiros. O registro traz publicidade, podendo usar como prova em processo judicial ou para comprovar a união perante terceiros que reconheçam que tais uniões têm o mesmo tratamento que a união estável entre um homem e uma mulher.
Posteriormente, Roraima (também em 2004)[155] e Piauí (em 2008)[156] estabeleceram normas semelhantes. Os contratos, entretanto, não são registráveis apenas nos estados ou localidades que têm normas obrigando os oficiais a registrarem os contratos. A lei aplicável é federal (Lei de Registros Públicos), assim como o Código Civil e a Constituição Federal. Dessa forma, sua aplicação abrange todo o território nacional e eventual recusa por algum registrador (que possa ter uma interpretação diferente) permite que os interessados solicitem que esse mesmo registrador envie o caso para decisão pelo juiz corregedor.
Desde 2003, decisões judiciais têm concedido ao estrangeiro que comprove ter um relacionamento homossexual estável com um brasileiro o direito ao visto de permanência no país, dando o mesmo tratamento às uniões entre sexos opostos.[157][158][159] No mesmo ano, o Conselho Nacional de Imigração, ligado ao Ministério do Trabalho, determinou que as solicitações de vistos temporários e permanentes para companheiros de pessoas do mesmo sexo sejam examinadas da mesma forma que as uniões entre pessoas de sexos opostos.[52]
Em fevereiro de 2008, o Conselho Nacional de Imigração publicou a Resolução Normativa CNI nº 77, de 29 de janeiro de 2008, que dispõe sobre os critérios para a concessão de visto, sem distinção quanto ao sexo dos companheiros.[160] Ainda em 2008, foi noticiado que o Ministério da Justiça elaborou projeto de lei alterando a Lei n.º 6.815, de 1980 (Estatuto do Estrangeiro), para que a disposição seja incluída na lei (o projeto de lei nº 1151, de 1995, que institui a parceria civil registrada e aguarda há mais de uma década sua apreciação no plenário da Câmara; também altera, dentre outros, o Estatuto do Estrangeiro, para prever os mesmos direitos aos parceiros homoafetivos), evitando que a matéria fique regulamentada apenas em um ato administrativo infralegal.[161][162]
Em 14 de maio de 2010, o Ministério das Relações Exteriores enviou circular a embaixadas e consulados de 207 países informando que passaria a conceder passaporte diplomático ou oficial aos companheiros homoafetivos de servidores do Ministério que prestam serviços no exterior. Para ter direito ao passaporte, o companheiro deve estar inscrito na Divisão de Pessoal como dependente do servidor para fins de assistência médica, benefício que o Ministério já reconhece desde 2006.[163]
O Brasil, apesar de registrar altos índices de violência contra pessoas LGBT, é reconhecido como um país avançado nos direitos dessa população e tem se tornado destino de alguns refugiados que precisam fugir de países com legislação anti-LGBT. Segundo dados da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) e do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), entre 2010 e 2016 o Brasil recebeu 369 solicitações de refúgio por motivo de fundado temor de perseguição relacionado à orientação sexual e/ou à identidade de gênero (OSIG). O maior número de solicitações (89%) foi realizado por pessoas provenientes de países africanos.[51][164] Em 2023, o Ministério da Justiça e Segurança Pública aprovou adoção de procedimento simplificado para análise de pedidos de refúgio de pessoas LGBTQIA+ provindas de países que aplicam pena de morte ou prisão para essa população.[143]
O artigo 35, inciso II, da Lei n.º 9.250, de 1995, define quem pode ser dependente para fins do imposto de renda das pessoas físicas, "o companheiro ou a companheira, desde que haja vida em comum por mais de cinco anos, ou por período menor se da união resultou filho". A interpretação corrente é que se aplica apenas a companheiros de sexos opostos.[165]
O Ministério Público Federal do Piauí, contudo, ingressou com ação civil pública em março de 2009 para permitir que o companheiro homossexual possa ser dependente do imposto de renda.[166] A justiça federal concedeu liminar deferindo o pedido, válida para aquele estado.[167] O deputado federal Maurício Rands é autor de um projeto de lei que tramita na Câmara dos Deputados incluindo o companheiro homossexual como dependente na legislação tributária.[167] O projeto (PL 3712/2008) ainda não foi votado em nenhuma comissão.[168]
Uma das consequências da instituição da união estável é conceder aos parceiros homoafetivos os mesmos benefícios previdenciários já existentes para casais ou companheiros de sexos opostos.
Em matéria previdenciária, cabe à União legislar sobre benefícios do INSS (para os trabalhadores do setor privado) e para o regime próprio de seus servidores públicos. Os benefícios previdenciários aos servidores estaduais e municipais (onde exista regime próprio de previdência para os servidores públicos) cabem às respectivas esferas.
Para trabalhadores do setor privado, em 2000, o Ministério Público Federal ajuizou uma ação civil pública junto à 3.ª Vara Previdenciária de Porto Alegre requerendo que o INSS reconhecesse o direito previdenciário do companheiro homoafetivo. A juíza titular da Vara Federal deferiu imediatamente o pedido, expedindo uma liminar obrigando o INSS a conceder tais benefícios. A abrangência da decisão é nacional, beneficiando casais homoafetivos em qualquer parte do Brasil. O INSS recorreu da decisão, tanto ao Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, como diretamente ao Supremo Tribunal Federal, não obtendo sucesso na tentativa de suspender a decisão. Posteriormente, o julgamento do mérito confirmou os termos da liminar (manteve o direito dos homoafetivos), tendo havido apelação por parte do INSS. A apelação também foi favorável aos homoafetivos e o INSS interpôs recurso especial e recurso extraordinário, ainda pendentes de julgamento junto ao Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal. Para cumprir a ordem judicial, o INSS regulamentou por meio de instrução normativa a maneira como o companheiro homoafetivo deve comprovar essa união. Atualmente essa regulamentação encontra-se nos artigos 30; 52, §4º; 271 e 292 da Instrução Normativa do INSS n.º 20, de 10 de outubro de 2007, que, sempre se referindo à ação judicial que originou a obrigação, prevê o benefício de pensão por morte e auxílio-reclusão, referente a óbitos ou prisões ocorridas a partir de 5 de abril de 1991, exigindo-se apenas a comprovação de vida em comum.
Para servidores públicos federais, o reconhecimento dos direitos previdenciários dos companheiros homoafetivos depende de decisão judicial específica, não havendo lei ou ordem judicial genérica que garanta seu reconhecimento a todos, independentemente de ação judicial. A jurisprudência, contudo, tem reconhecido tais direitos. No âmbito do regime previdenciário próprio dos servidores estaduais e municipais, nos últimos anos várias leis foram aprovadas garantindo igualdade de benefícios entre companheiros independentemente de oposição de sexo. Entre os estados e municípios que já reconhecem esses direitos (alguns devido à mudança na lei específica, outros em decorrência de normas administrativas estabelecidas pelo próprio poder executivo), podem-se citar os estados de São Paulo e Paraná e os municípios de Recife, Rio de Janeiro, Pelotas,[169] João Pessoa,[170] Belo Horizonte, Porto Alegre e Fortaleza.[171] No estado do Rio de Janeiro, a lei foi aprovada, mas o Tribunal de Justiça considerou-a inconstitucional (por vício de iniciativa, ou seja, deveria ter sido proposta pelo Governador).
Sobre a previdência complementar, várias empresas, notadamente estatais, têm reconhecido o benefício para o companheiro homoafetivo em seus planos privados de previdência, tais como a Petrobras,[172] Radiobrás, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e BNDES.[171]
A Câmara dos Deputados, em agosto de 2008, promoveu alteração da lei de adoção, mas não permitiu que a previsão para a adoção de casais homoafetivos constasse na lei.[173]
Há, contudo, decisões judiciais permitindo a adoção por casais homoafetivos. Em junho de 2008, conforme levantamento da Folha de S.Paulo, haveria dez casos finalizados ou em fase final, permitindo essas adoções, em seis estados diferentes (RS, SP, AM, PR, DF e AC).[174] No Rio Grande do Sul, já haveria um consenso entre os juízes quanto à possibilidade dessas adoções.[174] Em Pernambuco, também já foi noticiada uma adoção.[175] Um caso de adoção homoafetiva conjunta foi realizada em 2005.[97]
O Superior Tribunal de Justiça, sob a justificativa de que na adoção deve-se olhar o que é o melhor para a criança, manteve decisão que permitiu a adoção por um casal de lésbicas em 2010.[176]
Depois das decisões do STF e do STJ e da resolução do Conselho Nacional de Justiça já não existem óbices legais de qualquer natureza para que um casal homoafetivo pleiteie a adoção conjunta de uma criança. O art. 42, § 2.º, do Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece como requisito para a adoção conjunta que os candidatos sejam casados civilmente ou vivam em união estável, comprovada a estabilidade da família. Portanto, qualquer impedimento legal que se vislumbrasse, já não cabe mais dentro do ordenamento brasileiro hodierno.[177]
A luta contra o preconceito e discriminação por orientação sexual tem apresentado maiores avanços em nível estadual e municipal que em nível federal. A Constituição Federal de 1988, no inciso IV do artigo 3.º, não inclui expressamente a orientação sexual, listando como objetivo fundamental da república promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. A inclusão da expressão "orientação sexual" nesse inciso foi tentada na própria Assembleia Nacional Constituinte, por meio de destaque apresentado pelo deputado federal José Genoíno, sendo derrotada em votação em janeiro de 1988 com 130 votos a favor e 317 votos contra.[178] Posteriormente, foi objeto da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) n.º 67/99, do deputado Marcos Rolim (que reapresentou a PEC já proposta pela deputada Marta Suplicy em 1995,[179] arquivada em 2003.[180]
O STF, ao julgar habeas corpus que contestava o artigo 235 do Código Penal Militar (que criminaliza o ato libidinoso, homossexual ou não, em local sujeito à administração militar), decidiu que a discriminação por orientação sexual é proibida pelo atual texto do artigo 3º, inciso IV, da Constituição Federal (sem ser necessário, portanto, incluir expressamente "orientação sexual" em seu texto): "Naquela ocasião [julgamento do HC 82.760], ficou assentado que o dispositivo 'visa a coibir a prática de qualquer ato libidinoso, homossexual ou não, nas dependências militares. Com isso, a lei busca resguardar, sobretudo, a ordem e a disciplina castrense, e não a incriminar determinada opção sexual, até porque, se tal ocorresse, haveria inconstitucionalidade palmar por discriminação atentatória ao art. 3º, inciso IV, da Carta Magna' ".[181]
Por outro lado, a punição da discriminação ou preconceito por orientação sexual e identidade de gênero foi objeto do Projeto de Lei nº 5003, de 2001, de autoria da deputada federal Iara Bernardi,[182] que foi aprovado na Câmara dos Deputados em 23 de novembro de 2006,[183] tendo sido encaminhado ao Senado Federal, onde recebeu o número PLC 122/06, ainda em tramitação.[184] O projeto equipara a punição do crime de preconceito por raça ou cor, definido na Lei nº 7.716/89, havendo quem defenda sua inconstitucionalidade[185] (mas também há defesa de sua constitucionalidade[186]). O projeto enfrenta oposição organizada, especialmente por grupos religiosos.[187][188]
Em âmbito estadual e municipal, há muitas leis que vedam a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero (eventuais punições, contudo, não têm caráter penal, pois crime só pode ser definido por lei federal). Na justificativa da PEC 67/99, encontra-se uma lista de estados e municípios cujas constituições e leis orgânicas já previam, até junho de 1995, a proibição de discriminação por orientação sexual, como as constituições estaduais de Sergipe e Mato Grosso e 69 leis orgânicas municipais, dentre as quais as de São Paulo, Rio de Janeiro e Salvador.[179]
Em 13 de junho de 2019, o Supremo Tribunal Federal julgou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO 26), enviada à Corte em 2013 pelo PPS (Partido Popular Socialista), e o Mandado de Injunção (MI 4733), que foi protocolado em 2012 pela Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT).[24] Segundo as ações, o artigo 5º da Constituição Federal de 1988 determina que qualquer "discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais" seja punida criminalmente. A justificativa usada pelos responsáveis para entrar com as ações é que, ao não legislar sobre a homofobia e a transfobia, deputados e senadores estariam se omitindo inconstitucionalmente, por "pura e simples má vontade institucional". O STF determinou que o crime de racismo seja enquadrado nos casos de agressões contra pessoas LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros) até que uma norma específica seja aprovada pelo Congresso Nacional.[24]
O País realiza as uniões estáveis e casamentos homoafetivos sem que haja uma legislação para isso[189] e, apesar de ser relatado pelo Grupo Gay da Bahia (GGB) como tendo a maior taxa de homicídios LGBT do mundo,[190][191] não possui uma lei que criminalize explicitamente a homofobia e a transfobia, tendo sido necessária a intervenção do Supremo para incluir provisoriamente a discriminação contra LGBTs numa lei já existente (Lei do Racismo - Lei n° 7.716, de 5 de janeiro de 1989), até que o Congresso venha a aprovar uma lei específica.[24]
A possibilidade de o transexual, após a cirurgia de redesignação sexual (CRS), alterar seu nome no registro de nascimento, também tem sido reconhecida pela justiça em várias partes do país, como São Paulo,[192] Distrito Federal,[193] Goiás[194] e Pernambuco,[195] sendo que na decisão do Distrito Federal ficou claro que o transexual pode corrigir também o sexo no seu registro civil.
A Justiça Federal obrigou também o Sistema Único de Saúde (SUS) a custear as operações de redesignação sexual . A ação, proposta pelo Ministério Público Federal em 2001, em Porto Alegre, não foi favorável em primeira instância, mas o Tribunal Regional Federal da 4ª Região deu provimento ao recurso, em agosto de 2007, ordenando que o SUS custeasse as operações em todo o país.[196] A União recorreu da decisão ao Supremo Tribunal Federal, alegando que a obrigatoriedade traria grande ônus aos cofres públicos. A Presidente do STF, ministra Ellen Gracie Northfleet, suspendeu a decisão em 12 de dezembro de 2007, mas no dia seguinte o Ministério da Saúde divulgou que pretendia incluir o procedimento na tabela do SUS.[197] O Ministério da Saúde comunicou que até o final de 2008 começaria a custear as operações.[198]
Em julho de 2009, a Procuradoria Geral da República ingressou com ADIN no STF com o objetivo de permitir que transexuais possam mudar seu nome no registro civil independentemente da realização da cirurgia de redesignação sexual.[199]
A alteração de atribuição de gênero no Brasil é legal, de acordo com o Tribunal Superior da Justiça do Brasil, como declarou em uma decisão proferida em 17 de outubro de 2009.[200]
Por unanimidade, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça aprovou, permitindo a opção de nome e mudança de sexo na certidão de nascimento de uma pessoa transexual que foi submetida a cirurgia de redesignação de gênero.
A compreensão dos ministros era de que não fazia sentido permitir que as pessoas realizassem tais cirurgias no Sistema Único de Saúde e não permitir a alteração de seu nome e sexo no registro civil.[201]
Os ministros seguiram o voto da relatora, Nancy Andrighi. "Se o Brasil aceita a possibilidade da cirurgia, deve prover os meios para que o indivíduo possa ter uma vida digna em sociedade", disse ela. Na opinião do relator, impedir a alteração do registro para uma pessoa trans que passou por cirurgia de redesignação sexual pode constituir uma nova forma de preconceito social, e causar mais instabilidade psicológica.[202]
"A questão é delicada. No início da obrigatoriedade de registro civil, a distinção entre os dois sexos foi determinada de acordo com a genitália. Hoje, existem outros fatores, e que a identificação não pode ser limitada a aparente sexo. Há um conjunto de social, problemas psicológicos que devem ser considerados. Vetando essa troca estaria colocando a pessoa em uma posição insustentável, sujeita à ansiedade, a incerteza, e mais conflito", disse ela.[203]
De acordo com o Ministro João Otávio Noronha, do Superior Tribunal de Justiça, transgêneros devem ter a sua integração social, assegurado o respeito à sua dignidade, autonomia, intimidade e privacidade, a qual deve, portanto, incorporar o seu registro civil.[204]
Em 2008, o sistema de saúde pública do Brasil começou a fornecer cirurgia de reatribuição sexual gratuita em conformidade com uma ordem judicial. O Ministério Público Federal argumentou que a cirurgia de redesignação sexual foi coberta por uma cláusula constitucional garantindo a assistência médica como um direito básico.[205]
O Tribunal Regional Federal concordou, dizendo, na sua decisão, que "a partir da perspectiva biomédica, a transexualidade pode ser descrita como uma perturbação de identidade sexual, onde as pessoas precisam mudar sua designação sexual ou enfrentar graves consequências em suas vidas, incluindo o intenso sofrimento, mutilação e suicídio."
Os pacientes devem ter pelo menos 18 anos de idade e ser diagnosticados como transgêneros, sem outros transtornos de personalidade, e devem ser submetidos a avaliação psicológica, com uma equipe multidisciplinar por, pelo menos, dois anos, começando com 16 anos de idade. A média nacional é de 100 cirurgias por ano, de acordo com o Ministério da Saúde.[206]
Em 1º de março de 2018, o Supremo Tribunal Federal definiu que transgêneros têm o direito de alterar seu nome e sexo oficiais sem a necessidade de se submeterem a cirurgia ou de apresentarem laudos médicos ou pareceres psicológicos, bastando que a pessoa interessada declare sua identidade psicossocial. Em 28 de junho do mesmo ano, a Corregedoria Nacional de Justiça regulamentou o procedimento junto aos cartórios do País, conferindo efetividade à decisão.[57]
Outra luta contra a discriminação foi a proibição determinada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) de que os homossexuais masculinos doem sangue, conforme Resolução n.º 153, de 2004, da ANVISA. A proibição já existia desde 1993, quando o Ministério da Saúde determinou, pela Portaria 1.366/93, que os bancos de sangue de todo o país rejeitassem doadores que se declarassem homossexuais.[207] A crítica existente é que não se leva em conta o comportamento de risco, mas o simples fato de ser homossexual.
O Ministério Público Federal no Piauí ingressou com ação civil pública na tentativa de eliminar tal proibição. A liminar foi concedida em agosto de 2006, mas posteriormente derrubada, a pedido da ANVISA.[207] Em novembro de 2008, a juíza substituta da 2.ª Vara Federal de Teresina, Maria da Penha Gomes Fontenele, proferiu a sentença mantendo a negativa da doação de gays e homens bissexuais. O Ministério Público recorreu ao Tribunal Regional Federal da 1.ª Região, alegando que, além de discriminatória, a proibição era inócua, pois bastava que o doador mentisse sobre sua orientação sexual para que seu sangue fosse aceito.[208] Em 2016, a Defensoria Pública da União pediu ao Ministério da Saúde que revisasse a proibição, após um pedido semelhante por uma ONG paraense que defende os direitos LGBT.[209]
Em 8 de maio de 2020, o Supremo Tribunal Federal julgou inconstitucionais e suspendeu as normas do Ministério da Saúde e da ANVISA que restringiam a doação de sangue por homens gays e bissexuais.[74]
Não há na legislação brasileira qualquer dispositivo que impeça LGBTs de ingressarem nas Forças Armadas.[46] A única referência a homossexual na legislação militar é o artigo 235 do Código Penal Militar (Decreto-lei nº 1.001, de 21 de outubro de 1969), denominado "Pederastia ou outro ato de libidinagem", onde define o crime como: "praticar, ou permitir o militar que com ele se pratique ato libidinoso, homossexual ou não, em lugar sujeito a administração militar".[210] Não há, efetivamente, tratamento diferenciado na lei em relação ao sexo heterossexual ou homossexual em dependências militares, ainda que na prática raramente o sexo heterossexual seja punido. No entendimento majoritário do Plenário do Supremo Tribunal Federal, a criminalização de atos libidinosos praticados por militares em ambientes sujeitos à administração militar justifica-se, em tese, para a proteção da hierarquia e da disciplina castrenses (art. 142 da Constituição). No entanto, não foram recepcionadas pela Constituição de 1988 as expressões “pederastia ou outro” e “homossexual ou não”, contidas, respectivamente, no nomen iuris e no caput do art. 235 do Código Penal Militar, mantido o restante do dispositivo. A Corte entendeu que não se pode permitir que a lei faça uso de expressões pejorativas e discriminatórias, ante o reconhecimento do direito à liberdade de orientação sexual como liberdade existencial do indivíduo.[211]
Mesmo não havendo disposição legal que impeça o homossexual de permanecer nos meios militares, casos de militares abertamente LGBTs retratados pela imprensa revelam a tentativa de afastamento dos quadros militares, sob fundamento de problemas psiquiátricos ou indisciplina. Policiais militares LGBTs revelam que sofrem preconceito tanto dentro da corporação como nas ruas, pela população em geral, quando em serviço externo.[212][213]
Quando de sua sabatina no Senado Federal decorrente da indicação para ministro do Superior Tribunal Militar, o general Raymundo Nonato de Cerqueira Filho afirmou que os soldados não obedecem comandantes homossexuais, e que esses deveriam procurar outras atividades, baseando-se em experiências que teriam sido verificadas, por exemplo, na Guerra do Vietnã.[214] O presidente do Clube Militar, general da reserva Gilberto Figueiredo, apoiou as declarações do general, afirmando que "Entre nós (militares) ainda é tema de chacota [a homossexualidade], de piada, de brincadeira. Uma pessoa que se sujeita a essa resistência toda fica difícil de ser respeitada, de ser entendida".[215] Para o almirante Luiz Pinto, não haveria problemas, desde que o militar mantivesse "sua dignidade".[214]
Em 20 de setembro de 2023, foi sancionada lei que removeu as expressões “pederastia ou outro” e “homossexual ou não”, contidas, respectivamente, no nomen iuris e no caput do art. 235 do Código Penal Militar, mantendo o restante do dispositivo, conforme a decisão do Supremo Tribunal Federal na ADPF 291, e criou uma qualificadora para o crime de injúria, se esta consistir na utilização de elementos referentes a orientação sexual, será punida com reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos.[145]
Fernando Henrique Cardoso, ao fim de sua presidência, falou abertamente a favor em defesa da união homoafetiva, ao lançar o segundo Plano Nacional de Direitos Humanos.[40] Posteriormente, durante a presidência de Luiz Inácio Lula da Silva foram lançadas campanhas de conscientização contra a homofobia, como a Brasil sem homofobia, além da I Conferência Nacional GLBT, onde o Ministro da Saúde José Gomes Temporão anunciou a publicação de portaria autorizando o Sistema Único de Saúde a realizar operações de redesignação sexual. Durante uma entrevista ao programa 3 a 1, da TV Brasil, Lula afirmou que era defensor da união civil.[216] Lula entrou para a seleta lista da revista espanhola Zero dos líderes latino-americanos que lutam para erradicar a homofobia.[41] Durante o segundo turno das eleições de 2006, a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT) declarou seu apoio a Lula, divulgando, em nota oficial, que ele "mantém um excelente diálogo com a comunidade LGBT".[217]
O governo Dilma também se mostrou favorável às leis que compreendem os direitos civis da comunidade LGBT. Em 2014, a presidente Dilma Rousseff, então candidata à reeleição, deu uma declaração defendendo a criminalização da homofobia no Brasil: [...] "No caso especifico da homofobia, eu acho que é uma ofensa ao Brasil. Então, fico triste de ver que temos grandes índices atingindo essa população. Acho que a gente tem que criminalizar a homofobia, que não é algo com o que a gente pode conviver".[42] O governo Temer, se, por um lado, reduziu a zero os repasses a políticas contra a homofobia, por outro deu continuidade às campanhas de conscientização da gestão anterior, como a distribuição de cartilhas com orientações sobre o turismo LGBT e uma propaganda vinculada na TV contra a transfobia.[218][219] Michel Temer tem um antigo histórico de apoio ao movimento LGBT; ainda em 1997, enquanto ocupava o cargo de presidente da Câmara dos Deputados, saiu em defesa de um projeto que pretendia reconhecer a união civil entre homossexuais: [...] "Não tenho objeção ao projeto. Pessoalmente acho que ele não está disciplinando relações sentimentais entre as pessoas, mas uma situação civil”, disse Temer na época.[43]
O ex-presidente da República Jair Bolsonaro é conhecido por inúmeras declarações consideradas discriminatórias ao longo de sua trajetória política, dentre as quais a de que preferia ter um filho morto a um filho homossexual.[44][220][221]
Uma pesquisa do Datafolha que ouviu 2 660 entrevistados entre os dias 20 e 21 de maio de 2010, quase dois meses após o STJ reconhecer que casais homossexuais têm o direito de adotar, revelou que 51% dos brasileiros eram contra a adoção por casais homossexuais e apenas 39% se disseram favoráveis à prática (6% são indiferentes e outros 4% não souberam opinar).[222] Em 2011, quando o STF equiparou as relações entre pessoas do mesmo sexo à de união estável, uma pesquisa feita pelo instituto IBOPE com 2 002 pessoas, mostrou que 55% dos brasileiros eram contrários à decisão da Corte e 45% favoráveis.[223]
A aceitação dos brasileiros referente aos direitos LGBT começou a mudar nos anos finais da década de 2010, como mostrou uma pesquisa do Instituto Big Data realizada entre os dias 1° e 10 de novembro de 2017, com cerca de 3 mil pessoas. O levantamento mostrou que cerca de 65,5% da população era a favor do casamento entre pessoas do mesmo sexo, enquanto 39,2% se disseram contra. O estudo também analisou a aceitação das pessoas a respeito da adoção de crianças por casais homossexuais: 62,4% dos entrevistados apoiavam esta configuração de família, contra 34,6% que se mostraram contrários.[224] No ano seguinte, uma pesquisa Datafolha, que ouviu 9 173 pessoas, mostrou que, para 74% dos brasileiros, a homossexualidade deve ser aceita por toda a sociedade, contra apenas 18% que pensam que a homossexualidade deve ser desencorajada por toda a sociedade (8% não opinaram).[225]
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