O sabiá-laranjeira (nome científico: Turdus rufiventris) é uma ave comum na América do Sul e o mais conhecido de todos os sabiás, identificado pela cor de ferrugem do ventre e por seu canto melodioso durante o período reprodutivo.[1] É especialmente apreciado no Brasil; segundo Decreto de 3 de outubro de 2002, as comemorações nacionais do Dia da Ave devem se concentrar no sabiá-laranjeira, "símbolo representativo da fauna ornitológica brasileira e considerado popularmente Ave Nacional do Brasil".[2] Já era símbolo do estado de São Paulo desde 1966.[3] É citado por diversos poetas como o pássaro que canta o amor e a primavera[4] e também esteve presente no emblema oficial da Copa das Confederações de 2013, realizada no Brasil.[5]
Sabiá-laranjeira | |||||||||||||||
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Estado de conservação | |||||||||||||||
Pouco preocupante (IUCN 3.1) | |||||||||||||||
Classificação científica | |||||||||||||||
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Nome binomial | |||||||||||||||
Turdus rufiventris (Vieillot, 1818) | |||||||||||||||
Distribuição geográfica | |||||||||||||||
Distribuição do sabiá-laranjeira |
Taxonomia, denominação popular e ocorrência
Pertence à ordem Passeriformes e à família Turdidae, que migrou da Europa para a América há cerca de vinte milhões de anos.[6] A denominação científica da espécie é Turdus rufiventris, tendo sido descrito pela primeira vez por Louis Jean Pierre Vieillot em 1818.[7] Foram descritas duas subespécies: Turdus rufiventris rufiventris e Turdus rufiventris juensis.[8]
O nome sabiá deriva do tupi haabi'á.[9] No Brasil tem uma quantidade de denominações populares, entre elas sabiá-cavalo, sabiá-ponga, piranga, ponga, sabiá-coca, sabiá-de-barriga-vermelha, sabiá-gongá, sabiá-laranja, sabiá-piranga, sabiá-poca, sabiá-amarelo, sabiá-vermelho ou sabiá-de-peito-roxo. Em espanhol é conhecido como tordo de vientre rufo, zorzal colorado, zorzal común.[1][8][9]
É nativo da Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai,[7] com uma ampla área de ocorrência que vai do nordeste do Brasil até o sul da Bolívia e norte-leste da Argentina. Não ocorre na Bacia Amazônica.[10] Sua população é considerada estável mas não foi quantificada, e é descrito como uma ave comum. Por isso a Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais a classificou como espécie em condição pouco preocupante.[7]
Descrição
Este sabiá mede 23 cm de comprimento, tem o bico reto de cor amarelo-oliva, as patas cinzas, o olho negro circundado finamente de amarelo e a penugem do dorso de um tom uniforme marrom-acinzentado. A garganta é esbranquiçada rajada de marrom, o peito é cinza-pardo, que vai mudando para um alaranjado opaco no ventre. Não há dimorfismo sexual significativo, mas as fêmeas tendem a ser maiores que os machos e um pouco mais claras no ventre.[1][11] A existência de colorações aberrantes, incluindo albinismo, não é rara, mas é pouco citada na literatura. A causa disso não é bem esclarecida, mas pode estar ligada a alterações no seu meio ambiente ou mutações genéticas.[12]
Ocorre também o leucismo as vezes denominado erroneamente de albinismo. O leucismo é a perda parcial ou total de melanina, segundo estudos tem uma frequência inferior a 1%. Ocorre principalmente na plumagem, e no restante do corpo geralmente a pigmentação é normal. Não se sabe como é transmitida geneticamente esta condição. Existem poucos casos de acompanhamento na natureza.[13]
Ecologia e biologia
Habita originalmente florestas abertas e beiras de campos,[11] mas como é uma espécie bastante adaptável[14] penetrou com sucesso nas áreas de lavoura e cidades, exigindo porém a proximidade de água. É visto com frequência percorrendo o solo, mas nunca longe das árvores.[11] É uma ave territorial mas relativamente tímida, e seu canto melodioso, aflautado e frequente logo denuncia sua presença, podendo ser ouvido a mais de 1 km de distância. Seu canto é longo, podendo durar até dois minutos sem interrupção. A frase principal tem de 10 a 15 notas, mas ele é capaz de imitar as vocalizações de outras aves como o curiango e o joão-de-barro e assimilar trechos em seu próprio canto, em inúmeras variações. Canta principalmente no período reprodutivo, antes do amanhecer e ao anoitecer, para atrair a fêmea e demarcar seu território.[1][15]
O ninho é feito entre setembro e janeiro em arbustos, árvores de folhagem densa e cachos de banana, empregando fibras e gravetos ligadas por um pouco de lama, num formato de tigela funda. Por dentro são revestidos de materiais mais macios como hastes de flores e capim. Põe de 3 a 4 ovos verde-azulados pintados de sépia, que medem 28 x 21 mm.[1][16] Os filhotes nascem após treze dias de choco, recebendo atenção de ambos os pais. Em três semanas podem deixar o ninho.[15] Cada fêmea choca três vezes por ano e pode gerar até 6 filhotes por temporada.[1] O sabiá-laranjeira pode viver até dez anos na natureza.[17]
Sua nutrição se compõe basicamente de artrópodes, larvas, minhocas e frutas maduras.[16] Pode se tornar um predador importante de sapos e rãs logo que deixam a fase de girino.[18] É um importante dispersor de sementes das espécies frutíferas que consome, pois ou regurgita as sementes em outros locais ou elas saem em suas fezes fertilizantes e com isso se tornam mais aptas à germinação.[19][20] Como outras espécies de sua família, pode se reunir em bandos mistos que empregam diferentes estratégias para melhorar suas chances de boa alimentação, o que lhe confere uma vantagem adaptativa para ocupação de áreas degradadas e urbanas.[6]
Não há na literatura especializada muitos registros de inimigos naturais do sabiá-laranjeira, mas já foi observado que o tucano Ramphastos dicolorus preda jovens e até exemplares adultos.[21] Em meio urbano o gato doméstico é um importante predador.[12] Em algumas regiões está ameaçado pela destruição do habitat e pelo tráfico de animais silvestres.[22]
Importância cultural
É uma das aves mais populares do Brasil, sendo uma presença comum em seu folclore e mesmo na cultura erudita,[15][12] sendo indicado por decreto presidencial de 2002 como centro das comemorações do Dia da Ave.[2] De acordo com o ornitólogo Johan Dalgas Frisch, um dos principais defensores da nomeação, ela se justifica porque este sabiá é conhecido por crianças e adultos, é comum nas zonas rurais povoadas e nas cidades, e por isso é sentido como uma ave familiar por grande parte da população, e porque "tem qualidades impares. Não existem dois sabiás que cantem da mesma maneira.... os sons maravilhosos do sabiá desabrocham nos jovens corações veios poéticos, tão puros e belos como se um cego abrisse seus olhos ao ver a luz e as cores das flores na terra.... uma lenda indígena assegura que quando uma criança ouve, durante a madrugada, no início da Primavera, o canto do sabiá, será abençoada com muita paz, amor e felicidade".[23] Em ofício ao presidente Fernando Henrique Cardoso, a comissão de ministros encarregada da escolha justificou-se dizendo que o sabiá-laranjeira tem larga distribuição nacional e porque é, dentre as aves, "a mais inspiradora e, conseqüentemente, a mais aclamada e decantada pelo sentimento popular e cultural". Em pesquisa de opinião realizada pelo jornal Folha do Meio Ambiente 91,7% dos entrevistados manifestou seu apoio à decisão.[24]
Na literatura é frequentemente citado como o pássaro que canta o amor e a primavera,[4] as origens, a terra natal, a infância, as coisas boas da vida,[25] sendo imortalizado por Gonçalves Dias na abertura de seu célebre poema Canção do Exílio:[4]
- Minha terra tem palmeiras,
- Onde canta o Sabiá;
- As aves que aqui gorjeiam,
- Não gorjeiam como lá.
Chico Buarque escreveu em 1968 em conjunto com Tom Jobim uma canção onde o sabiá também figura em destaque, embora ali a ave apareça com o gênero feminino, o que, segundo o autor, deriva dos usos dos caçadores.[26] Segue a primeira estrofe:
- Vou voltar
- Sei que ainda vou voltar
- Para o meu lugar
- Foi lá e é ainda lá
- Que eu hei de ouvir cantar
- Uma sabiá
- Cantar uma sabiá.[27]
Outros autores famosos também deram ao sabiá-laranjeira notoriedade artística, como Carlos Drummond de Andrade[28], Jorge Amado.[4] Luiz Gonzaga, Milton Nascimento e Patativa do Assaré.[25] Como sua cantoria é muito apreciada, tornou-se uma ave de estimação e pode ser criado em cativeiro com sucesso. Precisa de gaiolas grandes e não tolera bem mudanças em suas instalações, podendo, se ocorrerem, apresentar distúrbios de comportamento e desenvolver pânico, que podem levar à sua morte.[15]. Note-se que no Brasil constitui crime a manutenção e/ou criação de animais silvestres em cativeiro sem a devida licença do IBAMA.
- Ouça o canto do sabiá-laranjeira:
Referências
- Sabiá laranjeira[ligação inativa]. Diagnóstico do Tráfico de Animais Silvestres na Mata Atlântica, RENCTAS
- Presidência da República. Decreto de 3 de outubro de 2002.
- Gorgulho, Silvestre. "Laudo Natel o Bandeirante ambiental" Arquivado em 2 de dezembro de 2013, no Wayback Machine.. In: Folha do Meio Ambiente Online, 22 de agosto de 2011
- "Sabiá. In: Revista Mackenzie, Ano IV - Nº 22 - 2003, pp. 6-9
- «Fifa apresenta logo da Copa das Confederações do Brasil». MSN Esportes. 24 de dezembro de 2007
- Vogel, Huilquer Francisco; Zawadzki, Cláudio Henrique & Metri, Rafael. "Coexistência entre Turdus leucomelas Vieillot, 1818 e Turdus rufiventris Vieillot, 1818 (Aves: Passeriformes) em um fragmento urbano de floresta com araucárias, Sul do Brasil". In: Biota Neotrop., vol. 11, no. 3, 2011, pp. 35-45
- BirdLife International 2009. Turdus rufiventris. In: IUCN 2011. IUCN Red List of Threatened Species. Version 2011.2
- Ferreira, A. B. H. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. Segunda edição. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986. p. 1531
- Schulenberg, T. S. (ed.). "Rufous-bellied Thrush (Turdus rufiventris)". In: Neotropical Birds Online. Ithaca: Cornell Lab of Ornithology, 2010
- Ridgely, Robert S. e Tudor, Guy. The Birds of South America: The oscine passerines. University of Texas Press, 1989, p. 119
- Gonçalves Junior, Carlos Campos et alii. "Record of a leucistic Rufous-bellied Thrush Turdus rufiventris (Passeriformes, Turdidae) in São Paulo city, Southeastern Brazil". In: Revista Brasileira de Ornitologia, 16(1):72-75, março de 2008
- Giannico, Amalia Turner. "Leucismo em sabiá-laranjeira". In: Revista CRMV-PR, 2012; XI (38)
- Dario, Fabio Rossano. "Composição da avifauna de restinga no Estado do Espírito Santo, Brasil". In: Revista Biociências, UNITAU. Volume 15, número 2, 2009, p. 102
- Sabiá Laranjeira. Clube do Criador
- Sabiá-laranjeira (Turdus rufiventris). Ambiente Brasil
- Cantoria de sabiá-laranjeira na madrugada divide ouvidos paulistanos - Folha.com, 16 de setembro de 2013
- Canevari, Pablo e Narosk, Tito. Cien aves argentinas. Editorial Albatros, 2009, p. 97
- Scherer, Adriano. O Componente Arbóreo de Matas de Restinga Arenosa no Parque Estadual de Itapuã, Rio Grande do Sul: Fitossociologia, Regeneração e Padrões de Interação Mutualística com a Avifauna. Dissertação de Mestrado em Botânica. Porto Alegre: UFRGS, 2005, p. 40
- Leite, Gabriel Augusto et alii. "Predação do sabiá-laranjeira Turdus rufiventris (Passeriformes: Turdidae) por tucano-de-bico-verde Ramphastos dicolorus (Piciformes: Ramphastidae) no município de Campos do Jordão, SP / Brasil". In: Atualidades Ornitológicas On-line, Nº 158 - Novembro/Dezembro 2010, pp. 55-56
- Sabiá laranjeira (Turdus rufiventris) Arquivado em 30 de dezembro de 2011, no Wayback Machine.. VivaTerra.org
- Sabiá-laranjeira, ave símbolo do Brasil. Apoena.org
- Lopes, Milano. "Sabiá, Ave Nacional do Brasil" Arquivado em 2 de dezembro de 2013, no Wayback Machine.. In: Folha do Meio Ambiente Online, 01 de outubro de 2002
- Silva, Maria Luísa da. Estrutura e organização de sinais de comunicação complexos: o caso do Sabiá-laranjeira Turdus rufiventris (Aves, Passeriformes, Turdinae). Tese de Doutorado em Psicologia. São Paulo: Instituto de Psicologiada Universidade de São Paulo, 2001, pp. 6-8
- Oliveira, Luiz Roberto. Entrevista com Chico Buarque. Clube do Tom
- Nova Canção do Exílio. Projeto ProIn. UFRGS
Ligações externas
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