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O caviar é um alimento, considerado uma iguaria de luxo, consistindo em ovas de esturjão não-fertilizadas,[1][2] sem qualquer tipo de aditivo, corante ou preservante. As ovas podem ser "frescas" (não-pasteurizadas) ou pasteurizadas, tendo estas um menor valor monetário.[3]
Tradicionalmente a designação "caviar" é apenas utilizada para as ovas provenientes das espécies selvagens de esturjão, principalmente as do Mar Cáspio e seus afluentes, de acordo com regra da Rússia ou do Irã (caviar Beluga, Ossetra e Sevruga). Estas ovas, consoante a sua qualidade (sabor, tamanho, consistência e cor), atingem preços entre 6.000€ e 12.000€ o quilo, no mercado europeu ocidental, estando associadas a ambientes gourmet e de alta cozinha (haute cuisine).
A designação "caviar" pode igualmente ser utilizada para ovas de outras espécies de esturjão selvagem ou para ovas de esturjões criados em aquacultura (das espécies do Cáspio ou outras).
Hoje, dependendo dos países e das legislações nacionais específicas, a designação "caviar" pode ainda ser utilizada para uma série variada de produtos de baixo preço substitutos ou sucedâneos de caviar, como as ovas de salmão, de truta, de lumpo, etc. Contudo, segundo a FAO, ovas de qualquer espécie que não acipenseriformes (incluindo estes os acipenseridae, ou esturjões stricto sensu, e os polyodontidae, ou peixes-espátula), não são caviar, mas sim "substitutos de caviar".[4] Esta posição é igualmente adoptada pela CITES,[5] pelo WWF,[6] pelos serviços aduaneiros dos Estados Unidos[7] e pelo Estado francês.[8] Igualmente a legislação europeia aplicável em Portugal define caviar como "Ovos não fecundados mortos transformados de todas as espécies de Acipenseriformes; igualmente designados por OVAS!!!"[9]
A palavra caviar entrou nas línguas europeias através do italiano caviari (plural de caviaro)[10] ou do francês caviare,[11] vindos do turco khäviar[12] ou havyar.[11] Em última análise deriva do persa khāvyār, de khaya "ovo" (do persa médio khayak "ovo", vindo do persa antigo *qvyaka-, diminutivo de *avya-, do proto-indo-europeu *owyo-/*oyyo- "ovo") + dar "portador".[10] Existe igualmente a hipótese de derivar do persa xâg-âvar ("gerador de ovas") ou chav-jar ("bolo de poder", uma referência à prática persa de comer o caviar em pequenos pauzinhos prensados como forma de elixir).[13] Em persa, a palavra designa quer o esturjão, quer as suas ovas.
Em russo, a palavra ikra (икра), "ovas", é usada embora não apenas para ovas de esturjão. A palavra ikra serve, de facto, para designar qualquer tipo de ovas. Por regra designa-se de "ovas negras" (черная икра - tchiérnaya ikra, daí a popular designação de "caviar negro") o verdadeiro caviar de esturjão e de "ovas vermelhas" (красная икра - krásnaya ikra, daí a popular designação de "caviar vermelho") as ovas de salmão ou, menos comummente, truta (embora estas denominações possam, por ignorância, ser utilizadas para sucedâneos que apresentem relativamente essas respectivas cores, naturalmente ou através de corantes). A palavra malossol (em russo малые соли - "pouco sal") aparece às vezes nas latas de caviar para salgas de fraca ou mínima intensidade.
O esturjão era conhecido pelos povos da Antiguidade, havendo referências cartaginesas (datando de 600 a.C.), gregas (é mencionado nos escritos de Aristóteles e Heródoto) e romanas (é mencionado por Cícero e Ovídio). Os persas são em regra apresentados como os primeiros produtores e consumidores de caviar (até pela próprio palavra ter origem persa), mas, tanto quanto se sabe com certeza, foram os russos os primeiros a desenvolver essa arte (a partir do reinado de Vladimiro, Grão-príncipe de Quieve, na altura da conversão ao cristianismo dos russos em 988),[14] já que na Pérsia islâmica não se consumia esturjão, considerado um animal impuro (haraam ou não halal).[15]
A primeira referência comprovada ao caviar (no sentido moderno), contudo, data do século XII. É atribuída a Batu Cã, neto de Gêngis Cã, quando nos narra uma sua visita a um mosteiro a norte de Moscovo. Antes desta data não se possuem testemunhos da produção de caviar, embora se saiba que os ovários inteiros, salgados, prensados e secos, eram produzidos e consumidos. A partir desta data, contudo, as referências russas multiplicam-se em abundância, particularmente depois do século XVI, quando os russos, em consequência das conquistas do czar Ivan IV, o Terrível, passam a controlar toda a pesca no Rio Volga e no Mar Cáspio. É a introdução do caviar na corte russa desde então que levará à sua disseminação progressiva pelas cortes doutros países europeus.[16] O caviar permaneceu muito tempo, no entanto, como fonte alimentar para as classes sociais menos privilegiados (dada a sua acessibilidade e baixo preço em relação à carne), bem como substituto da carne em períodos religiosos de abstinência e jejum (como a Semana Santa cristã). Apesar de tudo a influência da corte russa foi decisiva na introdução do seu consumo noutros países europeu - é bem conhecida a história supostamente ocorrida aquando da recepção oferecida por Luís XV de França ao embaixador do czar russo Pedro, o Grande, onde este terá oferecido ao seu anfitrião uma lata de caviar a provar, que terá sido prontamente cuspido pelo rei francês devido ao inusitado do sabor.[17] Apesar destas anedotas, sabe-se que a produção de caviar ou produtos a ele semelhantes expandia-se já pelo continente europeu.
De facto, o esturjão foi muitas vezes uma prerrogativa real. Os ingleses chamavam-lhe royal fish (peixe real) desde os tempos do rei Eduardo II (1307-27), que decretou que toda e qualquer esturjão capturado deveria ser entregue ao senhores feudais.[18] A produção francesa de caviar era controlada pelo estado - Jean-Baptiste Colbert, ministro de Luís XIV em meados do século XVII, centralizou essa produção na Gironda (com o esturjão comum ou Solho, A. sturio, hoje ameaçado globalmente e praticamente extinto na maioria dos países europeus). A entrada de cozinheiros franceses na corte russa em finais do século XVIII (após a Revolução Francesa e no reinado de Catarina, a Grande) terá igualmente impulsionado o consumo de caviar por parte de outras aristocracias europeias.[17]
Na Rússia a produção de caviar era um monopólio estatal desde o reinado do czar Aleixo I (em 1675) e foi Pedro, o Grande, quem estabeleceu em 1695 o primeiro "Gabinete da Pesca" em Astracã, nas margens do Cáspio. Este monopólio real começa a ser abalado na passagem do século XVIII para o XIX, com o aparecimento dos primeiros empreendimentos privados modernos. Por volta de 1820 desevolvem-se as instalações de armazenamento refrigerado em Astracã, o que permite a ascensão comercial (para consumo interno e exportação) da variedade considerada mais desejável de caviar - o malasol fracamente salgado.[16]
A produção persa (iraniana), de crescente importância ao longo do século XIX, era, devido aos interditos religiosos islâmicos, totalmente controlado por empresas russas, que em regra enviavam a produção para Rússia com vista à re-exportação.[19]
Com o aumento progressivo da procura mundial e o aparecimento de novas empresas privadas (russas, mas também alemãs e estado-unidenses) que se tornam nos grandes agentes económicos de produção de caviar, nos finais do século XIX e na viragem para o XX desenvolvem-se intensamente outras regiões de produção de caviar de esturjão selvagem (de espécies que não as do Cáspio).[20]
Ao longo deste período, formas mais populares de caviar aparecem, nomeadamento com a produção norte-americana da segunda metade do século XIX. Aí o caviar era muitas vezes oferecido como aperitivo acompanhando bebida em saloons. Este desenvolvimento da pesca americana foi acompanhado da intensividade da pesca na Gironda, Rio Elba, Mar do Norte e Báltico. Aparecem assim uma série de caviares não-cáspios de muito baixa qualidade e vendidos a preços irrisórios. Nos finais do século XIX, os Estados Unidos (com o grande centro de produção no Rio Delaware em Penns Grove, New Jersey) chegaram momentaneamente a ser os maiores produtores mundiais de caviar, embora o seu produto fosse de baixa qualidade, muitas vezes danificado e vendido fraudulentamente como "Caviar de Astracã".[21] Na viragem do século, um quilo de caviar francês custava somente 20 centimes; antes da Primeira Guerra Mundial, 40 centimes compravam o mesmo quilo, colocando o preço do caviar apenas ligeiramente acima do do pão.
Se a distintividade e altos preços do caviar do Cáspio nunca foi propriamente abalada, só no século XX, depois da Primeira Guerra Mundial e no que se convencionou chamar de Anos Loucos (Années folles em francês, convencionalmente de 1918 a 1929), é que o caviar (entendido como iguaria de produção complexa e delicada) se tornou em símbolo da distintividade e luxo aristocráticos. Tal foi essencialmente o resultado da procura desse produto, particularmente em Paris, por parte de refugiados aristocratas russos, que escapavam à Revolução Bolchevique.[17]
Neste momento foi central a acção dos irmão Melkon e Mougcheg Petrossian (arménios de Bacu, hoje no Azerbeijão e então parte do Império Russo), fundadores da casa homónima, e que popularizaram o consumo de caviar em França, detendo na altura os direitos exclusivos de exportação do caviar russo (agora soviético). Chegaram mesmo a dar a provar o seu caviar na Exposição Gastronómica do Grand Palais de 1925 em Paris (tendo tido a precaução de instalar cuspidores para prevenir a reacções negativas, que foram, apesar de tudo, minoritárias).[17] A sua influência foi, no entanto, mais importante junto das classes privilegiadas. Momento importante nesta apropriação do caviar enquanto iguaria de luxo e elemento central da haute cuisine, foi quando o multimilionário Charles Ritz, filho de César Ritz (fundador do Hôtel Ritz Paris e outros), o incluiu nos menus gourmet dos seus hotéis.
Com a Revolução russa o Estado soviético tomou controlo da pesca do esturjão, quase inteiramente localizada em Astracã, no norte do Mar Cáspio. Assim, até ao desmantelamento da URSS, apenas dois estado, a URSS e o Irão, controlaram toda a pesca de esturjão no Cáspio, e assim mais de 90% da produção mundial de caviar. Um acordo entre a URSS e o Irão, de 1927, foi feito com o objectivo de assegurar a constante oferta de caviar do Cáspio e a sobrevivência dos stocks de esturjão selvagem nessa região (impedindo, por exemplo, a pesca de esturjão em mar aberto, permitindo-a apenas nas regiões hidro-fluviais do Cáspio).
A União Soviética impôs critério estritos e uma vigilância apertada à produção de caviar, sendo durante a sua existência o maior produtor mundial. Mesmo com a construção de grandes empreendimentos hidro-eléctrico (como as barragem do Volga em 1959), que fecharam cerca de 85% do espaço de reprodução do esturjão, programas intensivos de repovoamento estiveram em curso desde a década de 1950. A companhia estatal monopolista encarregue da produção de caviar soviético era CIBPO (Caviar Caspian Balyk[22] Industry Association na designação oficial em inglês[23]).
A partir de 1953, não tendo havido renovamento do tratado soviético-persa de 1927 (que entregava apenas 15% dos benefícios da exploração de caviar do Cáspio ao Irão), o caviar iraniano passou a ser controlado pelo monopólio estatal Shilat[24] (controlando não só toda a pesca e produção, como também o comércio doméstico e internacional). Desde essa data que o Irão tem vindo a aumentar continuamente a sua capacidade e rigor na produção de caviar, embora no seguimento da Revolução Islâmica de 1979 se tenham verificado algumas dificuldades internas devido ao resurgimento da querela sobre o carácter impuro (haraam ou não halal) do esturjão.
Várias medidas foram tomadas pela URSS e Irão com vista à manutenção ecológica do esturjão e com vista a assegurar a qualidade da produção de caviar. A apertada gestão ambiental soviética contrabalançaram os efeitos da poluição e alteração dos cursos fluviais até finais da década 70, momento até ao qual a produção de caviar manteve uma tendência crescente. A partir desta data a tendência é claramente decrescente.
Ambos os países canalizavam internacionalmente a sua produção de caviar através de um número selecto de parceiros comerciais - antes da queda da URSS os principais parceiros soviéticos eram a casa francesa Petrossian, praticamente com um monopólio do mercado europeu ocidental, e a casa Romanov, o principal distribuidor no mercado americano em competição com a Petrossian. O caviar iraniano era essencialmente distribuído pela corporação George Fixon Eagle.
Dado o seu elevado preço e o seu carácter de iguaria, o caviar é hoje em dia sinónimo de riqueza, luxo e sofisticação gastronómica.
O esturjão é o maior peixe de água salgada do mundo depois do tubarão-baleia, sendo o Mar Cáspio a região tradicionalmente considerada como produtora dos melhores caviares. Hoje em dia o caviar do Cáspio é produzido principalmente pelo Irão e pela Rússia, bem como, em menor quantidade, pelo Azerbeijão e Cazaquistão.
Presentemente as espécies tradicionais de caviar do Cáspio encontram-se ameaçadas, devido à sobrepesca (legal e ilegal) e poluição que atingiu esta região durante a segunda metade do século XX. De facto, a produção mundial de esturjão tem vindo a diminuir acentuadamente, particularmente nas últimas duas décadas do século XX (acentuando-se ainda mais com o desmantelamento da União Soviética em 1991), o que provocou o aumento acentuado dos preços de caviar, bem como o desenvolvimento de alternativas de produção por aquacultura a nível mundial. Neste período assistiu-se igualmente ao surgimento em força de novos distribuidores para o mercado ocidental, tais como as companhias Caviar House (Suíça), Caviarteria e Caviar Russ (ambas dos Estados Unidos), que contrabalançaram o até então quase-duopólio da Petrossian (França) e Romanov (Estados Unidos).
Em três dos países ex-soviéticos do Cáspio assistiu-se à criação de grandes empresas de capital aberto (joint-stock companies) que tomaram conta das actividades, levadas anteriormente a cabo em monopólio estatal, da instituição soviética CIBPO (Caviar Caspian Balyk Industry Association em inglês). São elas a TIC UH do Azerbeijão (de capital checo, produzindo as marcas Azerbaijan Caviar e Aristocrat Caviar e controlando toda a oferta de caviar azeri mundialmente; estes caviar é originado no Cáspio, recebe um primeiro processamento in situ e em poucas horas é enviado para a República Checa, onde leva processamento final e é embalado), a Atyraubalyk Joint Stock Company do Cazaquistão e a Open Joint Stock Company “Russian Caviar”[25] da Rússia[26] (de capital russo e controlando grande parte das actividades da indústria de esturjão e caviar na Rússia;o seu maior accionista é a companhia Mirchal, que funciona como distribuidor; produz a marca Russian Caviar[27], sendo que toda a sua produção de caviar é pasteurizada e não fresca). Note-se, no entanto, que existem outros produtores de caviar na Rússia, como o Fishing group «Delta-plus» (em russo Дельта плюс), sediado na região de Astracã (onde se localizam a maioria das unidades fabris de produção de caviar russo). Recentemente o governo russo declarou a intenção de estabelecer um monopólio estatal sobre a produção de caviar (ainda que incluindo participação privada).[28] Estas empresas, , bem como outras com vago estatuto legal, além de caviar, na maioria das vezes pasteurizado, com salgas elevadas e com forte adição de químicos conservantes, produzem igualmente sucedâneos de várias outras espécies de peixe.
Apesar destas tentativas de organização da indústria, os países ex-soviéticos têm-se deparado com sérias dificuldades em gerir eficaz e sustentadamente os recursos de esturjão, em lutar contra a pesca furtiva e ilegal, contra a produção clandestina de caviar (em regra em condições deterioradas) e a sua venda ilegal e contrabando, incluindo a usurpação de recipientes e rótulos, que, cheios de sucedâneos com bastantes aditivos, são fáceis de encontrar nos mercados da Europa de Leste[29], mas também na Europa Ocidental[30][31] e Estados Unidos[32] (além de se verificar uma vasta oferta comercial supeita via internet), muitas vezes vendidos como se fossem verdadeiro caviar (a preços muito inferiores aos do caviar certificado), bem como na aplicação do regime do CITES na manutenção dos critérios de qualidade exigidos para a produção, envase e rotulagem de caviar do Cáspio.
De facto, além dos problemas próprios destas empresas, a existência de toda uma vasta e estruturada indústria paralela e ilegal, com características de organização criminosa,[33] aparenta ser o principal obstáculo quer ao surgimento de uma indústria regulada, com produtos de qualidade e sustentabilidade ecológica, quer à recuperação do eco-sistema do Mar Cáspio, já que, no início desta década, a pesca ilegal terá retirado da bacia do Cáspio dez vezes mais toneladas métricas de esturjão do que a quota legalmente permitida.[34]
O CITES e os seus estados membros procuram atacar estes problemas através da colaboração com a Interpol e outras instituições policiais, pelo estabelecimento de um sistema universal de rotulagem para o caviar[35], já obrigatório para todos os países da União Europeia[36], que permite o registo em base de dados de todas as licenças e cerificados que permitem a comercialização de caviar[37], e através de recomendações para a suspensão do comércio em espécies listadas em perigo com países envolvidos no comércio ilegal de tais espécies. Contudo, de acordo com o secretariado do CITES e a Interpol, os dados disponíveis sobre pesca ilegal e contrabando no Cáspio são demasiados limitados e a legislação existente não facilita os procedimentos de controlo e fiscalização. Tal situação levou à suspensão, em 2001, de todas as operações de pesca de esturjões do Cáspio no Azerbeijão, Cazaquistão e Rússia. A colheita e venda de caviar Beluga está interdita na Rússia desde 1 de Agosto de 2007 por um período de dez anos, embora a pesquisa científica e a criação de esturjões Beluga estejam isentas.
A indústria iraniana de esturjão e caviar aparenta ser a mais saudável do Mar Cáspio,[38] consituíndo um monopólio estatal nas mãos da poderosa Shilat[39] (Iran Fisheries Organization, na designação oficial inglesa), ainda que negociações para a sua privatização decorrem já há vários anos. A Shilat tem conseguido manter uma gestão sustentada dos stocks de esturjão debaixo da sua jurisdição e a sua aplicação do regime do CITES tem-se demonstrado efectiva na conservação desses recursos, tendo igualmente levado a cabo na década passada extensos programas de repovoamento dos stocks (particularmente de A. persicus), diversificado as actividades piscatórias no Cáspio e desenvolvido a criação em aquacultura, assim diminuindo a pressão sobre as populações selvagens de esturjão.[40] Tem igualmente punido severamente as actividades de pesca ilegal de esturjão, que podem acarretar a pena de morte.[41] Este cenário leva a que o Irão seja presentemente quase o único fornecedor de caviar do Cáspio com qualidade e tratamento certificados, dando à Shilat um poder quase monopolista (na imposição de preços e obrigatoriedade de compras em grosso sem avaliação prévia) face aos grandes fornecedores ocidentais.
Outras áreas de produção de caviar no mundo deparam-se com problemas semelhantes no respeitante às suas populações de esturjão. Essas áreas são:[40]
Estes stocks de esturjão selvagem tornaram-se cada vez mais rarefeitos ou pura e simplesmente desapareceram, ao ponto de a produção de caviar com esturjões selvagens fora do Irão e ex-União Soviética ser praticamente negligenciável, com a extinção ou queda populacional para níveis de forte ameaça de extinção dessas espécies de esturjão em estado natural.
De acordo com os dados da FAO[40] a indústria de criação de estujões em aquacultura[42] tem aumentado continuamente a sua produção, assim compensando o declínio da apanha selvagem e mesmo ultrapassando os montantes desta. Os principais países produtores de esturjão de criação para comercialização eram, em 2000, a Rússia, a Itália[43] e a Polónia. Outros países com empreendimentos relevantes eram a Espanha,[44] a França e o Uruguai.[45] . Em França a aquacultura do esturjão está bastante difundida na região da Aquitânia, onde o Estuário da Gironda era um dos habitats naturais do Esturjão Europeu ou Solho (Acipenser sturio), hoje quase completamente extinto. A criação na Aquitânia, que muito ajudou a relançar a indústria francesa de caviar depois do colapso soviético e do estabelecimento do monopólio tendencial iraniano, é quase exclusivamente de Esturjão Siberiano (A.) [carece de fontes]Nos últimos anos a Coreia do Sul tem igualmente desenvolvido a criação de esturjões e produção de caviar, bem como de sucedâneos de caviar (em regra para o mercado japonês). Igualmente nos Estados Unidos várias companhias de aquacultura têm-se desenvolvido nos últimos anos, particularmente na California.[46]
Os principais países importadores de caviar (excluíndo sucedâneos) foram em 2000[40] os Estados Unidos, a França e a Alemanha, sendo que a União Europeia conjuntamente comsome mais dos que os Estados Unidos.[33]
Devido ao decréscimo das populações selvagens de esturjão, o Serviço de Pesca e Vida Selvagem dos Estados Unidos[47] baniu, em 2005, a importação de caviar Beluga de todo o Mar Cáspio e bacia do Mar Negro. Em 2006 o CITES suspendeu todo o comércio de caviar (Beluga, Ossetra e Sevruga) das espécies selvagens tradicionais do Cáspio devido à incapacidade dos países produtores em seguirem as recomendações internacionais,[48] insentando apenas o Irão.[49] Em 2007 esta suspensão foi parcialmente levantada, permitindo-se vendas 15% abaixo do nível oficial de 2005.[50] As quotas de produção para 2008 permaneceram iguais às do ano anterior.[51] A situação permanece, no entanto, preocupante, tendo-se assistido a uma diminuição de 45% das populações de Beluga entre 2004 e 2005 - isto no quadro de uma diminuição total de 90% dessa população nos últimos vinte anos. A situação das outras espécies (Sevruga e Ossetra) é também bastante preocupante, já que todas elas apresentam um estado de conservação em perigo, sendo definidas como espécies ameaçadas, podendo vir a extinguir-se na natureza em poucos anos.[52] As perspectivas para a indústria russa de caviar apresentam-se sombrias[53]
O processo de transformação das ovas não-fertilizadas e frescas de esturjão em caviar de qualidade (salgadas e não-pasteurizadas) é um processo complexo e delicado. Globalmente, as ovas precisam de ser retiradas de uma fêmea ainda viva, imediatamente peneiradas, lavadas e escorridas, triadas (segundo a consistência, tamanho e cor) e salgadas num tempo máximo de 15 minutos após extracção. Seguidamente são levemente secas e acondicionadas em latas hermeticamente fechadas (onde processos de maturação podem ocorrer).
A fêmea de esturjão, capturada viva, é transportada até uma mesa de metal onde é atordoada e lavada. O seu ventre é então aberto com precisão, enquanto ainda viva (já que a sua morte liberta toxinas nefastas para as ovas), sendo o saco de ovas extraído, lavado e imediatamente pesado. Tradicionalmente a fêmea é depois morta e encaminhada para processamento (com vista nomeadamente à comercialização da carne), embora hoje em dia, particularmente com esturjões de aquacultura, seja cada vez mais comum a remoção cirúrgica das ovas, assim permitindo que as fêmeas continuem a produzir mais durante o seu tempo de vida[54]
As ovas são então passadas através de uma peneira fina (com aberturas de 2 a 4 mm), separando-se assim da membrana envolvente (saco). São novamente lavadas e escorridas, sendo então avaliadas e triadas segundo a consistência das sua membranas, cor, tamanho, odor e sabor. Já triado, o caviar é pesado uma segunda vez, a fim de calcular a quantidade de sal (Cloreto de sódio) a juntar. Esta operação primordial é realizada por um especialista central denominado "mestre de caviar" (caviar master na designação internacional em inglês, às vezes master blender; ikrianchik em russo), já que a quantidade de sal utilizado é tão importante para a qualidade final do produto como a qualidade das ovas. Tipicamente o caviar apresenta 4% a 6% de sal,[54] sendo as variedades de marcas produtoras e distribuidoras mais afamadas geralmente ainda menos salgadas (com 2% a 4%)[55]. Antes de 1914[56] o sal utilizado na produção russa era o proviniente das estepe de Astracã (previamente guardado em seco durante sete dias, para remover o excesso de cloro). Hoje em dia o sal utilizado pode ter proviniências diversificadas, sendo muitas vezes quimicamente purificado e livre de iodo. Algumas casas de comercialização, como a suíça Zwyer Caviar, utilizam flor de sal portuguesa.[57]
Uma vez adicionado o sal, o caviar é rapidamente agitado para que o sal se distribua de maneira homogénea - se este passo toma demasiado tempo, a mistura será pegajosa em vez de solta; se for demasiado rápido, a conservação das ovas fica ameaçada. Nestes momentos a experiência do "mestre" é central, bem como a qualidade do sal natural adicionado. Ao mesmo tempo que o sal é, em regra, adicionada uma quantidade ínfima, inferior a 1%, de Bórax/Tetraborato de sódio-E285 (o mais comum), ou de Benzoato de sódio-E211, ou de Ácido bórico-E284. Estes aditivos, que dão ao caviar um acabamento mais suave e adocicado[58], estão proibidos como aditivos alimentares nalguns países consumidores,[59] como os Estados Unidos. Algumas produções, como a Mottra Caviar da Letónia, e os produtores estado-unidenses não adicionam nada mais do que sal; igualmente a espanhola Caviar de Riofrío produz uma variedade "orgânica" de Caviar do Estujão do Adriático apenas com sal.
O caviar é de seguida coado e ligeiramente seco numa peneira de crina, para perder o excesso de água absorvida pelo sal. Esta operação implica uma perda de 5% a 6% do peso das ovas. É seguidamente envasado em latas metàlicas redondas regulamentares de 1,8 quilos, ditas latas de origem (azuis para o Beluga, amarelas para o Ossetra, vermelhas para o Sevruga - as suas cores tradicionais). Estas latas são lacradas no interior, impedindo a oxidação do caviar e favorecendo a sua conservação. O enchimento das latas deve ser feito rapidamente, para que o caviar não se degrade, rompa ou perca consistência e untuosidade - esta operação é feita manualmente com uma espátula não-metálica. As latas são fechadas com uma prensa, possuíndo um tipo de tampa que optimiza o escoamento do excesso de líquido e de ar, mas deixando que a humidade interior permaneça suficiente para permitir às ovas de se deslocarem. A junta da lata e da tampa é então recoberta com uma banda elástica de borracha, que fecha hermeticamente o receptáculo, podendo então ser conservada vários meses para maturação a baixa temperatura (entre -2 e +2 grau Celsius).
Nas casas de comercialização o caviar é armazenado nas latas de origem à temperatura ideal, selecionado lata a lata e levado ao ponto desejado de maturação. É destas latas de origem que são retiradas as quantidades pedidas pelos compradores, que serão envazadas em latas mais pequenas (tipicamente de 30g, 50g, 125g, 250g, 500g, 750g e 1k[60], embora nos últimos anos tenham também aparecido latas de 10g e 20g), idealmente apenas no momento de compra e não previamente. Estas latas de compra podem ser mantidas até três meses no frigorífico (a contar desde o momento do envaze na lata final), também em torno dos -2 e +2 graus, e nunca devem ser congeladas. Uma vez aberta a lata de caviar, este deve de preferência ser inteiramente consumido, ou então num prazo máximo de 48 horas.
Na Europa ocidental as casas de produção e comercialização mais afamadas são a Caviar de Neuvic, Petrossian, Caviar House & Prunier, a Kaspia,, e a Imperial Caviar, [carece de fontes]todas elas envolvidas não só na comercialização de caviar iraniano, através de compra à Shilat, mas também na produção de caviar de esturjões de criação.
Certos fabricantes de produtos cosméticos[61] adicionam caviar ao seus produtos, já que este será rico em componentes naturais que favorecem a revitalização da pele. O caviar contém uma substância nutritiva chamada vitelline, rica em fosfolípidos e fosfoproteínas, constituintes essenciais das células.
De acordo com as várias entidades oficiais referidas na introdução, todo o caviar são ovas de Acipenseriformes, incluindo os esturjões stricto sensu (Acipenseridae, dos géneros Huso, Acipenser, Scaphirhynchus e Pseudoscaphirhynchus) e os peixes-espátula (Polyodontidae, dos géneros Polyodon e Psephurus).
As três variedades principais e mais caras de caviar provêm do Mar Cáspio e seus afluentes, sendo apenas extraídas de quatro espécies selvagens tradicionais dessa região:[62][63][64]
As variedades alternativas de caviar são por regra, hoje em dia, o produto de ovas de esturjões criados em aquacultura, particularmente de espécies não-típicas do Mar Cáspio (embora exista alguma pequena criação de ossetra e sevruga), ou, em muito menor quantidade, o produto de espécies selvagens igualmente não típicas do Cáspio. Em alguns casos o caviar provém de ovas de espécies híbridas de esturjão. Os mais comuns caviares alternativos aos clássicos do Cáspio são:
Devido aos elevados preços do caviar, bem como o facto de quase só poderem ser comprado em lojas de especialidade ou gourmet, toda uma série de substitutos, sucedâneos e imitações foram desenvolvidas para mercados mais abrangentes, sendo facilmente encontráveis na maioria das superfícies comerciais alimentares (como mercearias, supermercados e hipermercados), a preços bastantes inferiores, de poucos euros. Estes produtos, muitas vezes ostentando a designação "caviar de …"[112] e com vários aditivos e corantes, são aqueles com que maioria das pessoas está familiarizada e pensa, erradamente, tratar-se de caviar.
Produtos de ovas de peixe, que não esturjão, que tenham sido lavados, limpos de tecidos aderentes, salgados e por vezes prensados ou secos, com ou sem aditivos e corantes, são considerados substitutos de caviar.[113][114] Os mais comuns são:
Alguns outros produtos, que também pretendem apresentar-se como substitutos de caviar, não o chegam a ser já que não são feitos a partir de ovas, ou mesmo sequer de peixe, ou porque as ovas não são removidas dos seus sacos ou constituem apenas uma pequena fracção do produto.[115] Estes produtos, transformados para imitar o formato de ovas, têm sempre aditivos, corantes e conservantes. Os mais comuns são:
Não procurando ser alternativas ou substitutos ao caviar, várias especialidades gastronómicas, confeccionadas ou somente tratadas, são muitas vezes apelidades "caviar de …". Os mais comuns são:
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