O violão (português brasileiro) ou guitarra clássica (português europeu)[1] é um instrumento musical de cordas (cordofone) acústico, possivelmente derivada do alaúde árabe ou da cítara romana há quase 2000 anos,[2] modernamente produzida na Espanha para a interpretação de peças de música erudita, sendo formado por um corpo oco e chato, em forma de oito,[3] feito de várias madeiras diferentes. O braço possui trastes que o torna um instrumento temperado, comumente é composto de seis cordas (de tripa ou com materiais sintéticos como nylon, nylgut, fluorocarbono), mas há variações com outras configurações, como o violão de sete cordas e o violão baixo com quatro cordas, afinadas uma oitava abaixo das quatro cordas mais graves do violão/viola.
Violão (português brasileiro) ou guitarra clássica (português europeu)[1] | |
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Informações | |
Classificação Hornbostel-Sachs | |
Extensão | |
Outras extensões possíveis de acordo com o encordoamento e afinação. | |
Instrumentos relacionados | |
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Características gerais
A sua configuração moderna e desenho foram confeccionados na Espanha. Presente hoje em quase todos os géneros musicais populares, sua abrangência só se compara à do piano. Ao longo do tempo este instrumento sofreu grandes evoluções e, hoje em dia, possui uma grande variedade de formatos e tamanhos, cada qual mais apropriado a um estilo de execução. Entre os géneros que mais utilizam a guitarra clássica estão a música erudita, o flamenco espanhol, a valsa peruana, a cúmbia colombiana, o joropo venezuelano, as rancheras mexicanas, a MPB, o samba, o fado português, a modinha, a morna, o choro, a bossa nova, as gaitas, entre outros.
Etimologia
Na língua portuguesa, o nome "guitarra" se aplica ao instrumento acústico ou elétrico indistintamente. No Brasil manteve-se a designação mais comum violão para a guitarra clássica. Em Cabo Verde utiliza-se também a designação violão (a par de "viola" e "guitarra clássica") para a guitarra clássica. Acredita-se que o nome derive diretamente do termo "viola", que designa as violas portuguesas, da qual a viola caipira brasileira é uma evolução. Embora possua várias diferenças de timbre e de número de cordas, a viola é muito semelhante em formato à guitarra, apenas menor. Apesar de referir-se ao mesmo instrumento que a guitarra, a origem linguística do nome "violão" foi o termo "viola", acrescido da desinência de grau "ão".
O nome violão hoje faz parte do vocabulário de todos os brasileiros e designa de forma inequívoca a guitarra clássica. Muitos compositores e estudiosos tentaram, sem sucesso, fazer com que o termo guitarra voltasse a ser utilizado no Brasil para unificar a nomenclatura a todas as outras línguas. Apenas no século XX o nome guitarra retornou ao vocabulário corrente dos brasileiros, mas apenas para designar a versão eletrificada (guitarra elétrica). O nome guitarra clássica também acaba sendo alternativamente utilizado, muitas vezes, para designar os modelos de guitarras semiacústicas do jazz e blues tradicionais.
Uso na música popular
Diversas características do violão o tornam propício ao acompanhamento do canto. Entre elas, a extensão, o volume sonoro, a relativa riqueza harmônica, o baixo custo e o peso reduzido. Isso também o torna o instrumento preferido de alguns intérpretes. Como é fácil de transportar, é comum ver grupos de pessoas reunidas em torno de um violão em festas, bares, praias, estádios, estações de trem ou outros locais ou situações em que as pessoas se agrupam. A execução puramente harmônica para o acompanhamento do canto é facilmente dominada e as revistas com cifras e tablaturas dos sucessos musicais do momento são facilmente encontráveis em qualquer quiosque de jornais. Poucos instrumentos são tão presentes no cotidiano, executados por músicos amadores tanto quanto por profissionais.
No Brasil, apresentações com "um banquinho e um violão", em pequenos espaços, com um cantor se acompanhando ao violão são comuns na bossa nova e na MPB.
Construção
A guitarra clássica possui diversas características em comum com todas as outras guitarras. A principal diferença em relação às outras é o fato de usar cordas de nylon, a cabeça possui carrilhões em vez de cravelhas, o braço é mais largo e o tipo de madeiras usadas. A guitarra clássica pode ser eletrificada mediante o uso de microfones externos ou colocados junto às cordas. A figura abaixo mostra as partes de uma guitarra clássica.
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Cabeça, braço e escala
A cabeça (1) da guitarra clássica é geralmente feita da mesma madeira do braço e em alguns casos é entalhada no mesmo bloco de madeira. É fixada na extremidade do braço formando um pequeno ângulo para facilitar o posicionamento das cordas sobre pestana (feita de osso, plástico ou latão em alguns casos). Os carrilhões (cravelhas) dos instrumentos modernos são feitos de aço com abas de plástico, osso ou madrepérola. Na maior parte das guitarras acústicas há três carrilhões de cada lado da cabeça. Outras configurações são possíveis, como 4+2, 4+3 em violões de sete cordas e 2+2 para violões baixo.
O braço (7) do violão é mais largo que o de outras guitarras acústicas, como por exemplo, a guitarra folk. É composto basicamente de uma barra maciça e rígida de madeira fixada ao corpo. Madeiras de grande resistência à tração são preferíveis, as mais usadas são o mogno e o cedro. O braço é colado ao corpo com o auxílio de um reforço estrutural, o tróculo (8), em geral entalhado na mesma peça do braço, mas que também pode ser uma parte separada e colada ao braço e ao corpo.
Feita de uma madeira diferente do resto do braço, como ébano, a escala (20) é montada sobre o braço para fixar os trastes e servir de apoio aos dedos do executante. As guitarras clássicas geralmente não apresentam elementos decorativos sobre a escala. Os violões modernos são construídos com os trastes posicionados para proporcionar intervalos iguais em todos os semitons (temperamento igual). Em geral, a parte livre do braço é mais curta que nos instrumentos elétricos, com doze trastes da pestana até a junção com o corpo.
Corpo
Em todos os tipos de violão o corpo (9) tem as funções de caixa de ressonância e de fixação das cordas. A combinação de madeiras utilizadas não é meramente decorativa. Cada madeira é escolhida devido às suas características físicas, tais como flexibilidade, resistência à tração e absorção de humidade. As características combinadas de cada madeira permitem construir instrumentos com a sonoridade desejada, bem como garantem que o instrumento terá afinação e timbre estáveis em condições diferentes de temperatura, umidade e tensão das cordas.
Faixas laterais (16)
Feitas de madeiras resistentes à tração. A madeira preferida para esta parte do corpo é o jacarandá da Bahia. Como esta árvore está em risco de extinção, apenas luthiers que possuem estoques antigos utilizam essa madeira. Uma alternativa é o jacarandá da Índia, também chamado Rosewood. Também pode ser usado o mogno ou algumas outras madeiras. As finas lâminas, de no máximo 3 mm de espessura e com cerca de 10 cm de largura, são molhadas e moldadas no formato desejado do instrumento (normalmente no formato aproximado de um 8) com a ajuda de moldes de madeira e grampos. Após alguns dias as faixas adquirem a forma definitivamente. Várias peças de madeira em forma de "L" são coladas ao longo de toda a parte interna das faixas. Estas peças servirão para colar o fundo e o tampo.
Fundo (14)
Construído da mesma madeira que as faixas, o fundo também é uma lâmina fina de madeira, cortada para preencher exatamente o contorno definido pelas faixas. Na verdade, não é constituído de uma única chapa, mas de duas partes simétricas fixadas no meio a um estrutura que se estende longitudinalmente ao corpo. O resultado é um fundo que não é plano, mas levemente curvo em direção ao exterior. Essa montagem permite a dilatação e faz com que alterações da madeira decorrentes de variações de temperatura ou umidade sejam absorvidas sem danos às lâminas.
Tampo (15)
Esta é a principal parte do corpo do violão. Como as cordas são fixadas ao tampo, quando elas vibram todo o tampo vibra solidariamente. Este efeito é responsável pela maior parte da amplificação acústica. Como deve agir como uma membrana, o tampo deve ser construído de uma lâmina fina (em geral menos espessa que o fundo e laterais) de uma madeira altamente flexível, mas ainda assim resistente o suficiente para suportar a tração ocasionada pelas cordas. A madeira preferencial para o tampo é o cedro, mas várias outras madeiras podem ser usadas. Os melhores instrumentos são obtidos de árvores com pelo menos 200 anos, que possuem veios praticamente paralelos. Assim como o fundo, o tampo é obtido de uma única chapa de pinho dividida em duas metades unidas ao meio e colado aos suportes em "L". No ponto de junção entre as faixas e o tampo, um friso é colado como elemento decorativo e também como reforço estrutural do conjunto.
Aproximadamente no centro do tampo, uma abertura, a boca (17) serve para permitir a passagem do ar em vibração. Em geral, um mosaico feito em marchetaria decora e protege as bordas das aberturas. O desenho utilizado é característico de cada luthier.
Na parte interna do tampo, uma complexa estrutura de barras ou ripas de madeira é construída para "disciplinar" a vibração do tampo. Chamada de leque, esta estrutura é fundamental para permitir o reforço de determinados harmônicos e a absorção de ruídos indesejáveis. Em geral o número de barras e o desenho utilizado é característico de cada luthier ou de cada modelo.
Abaixo da boca é colado o cavalete (12), usado para fixar as cordas ao corpo. O cavalete possui furos para a fixação das cordas e sobre ele é montado o rastilho (19), uma barra de osso ou plástico que serve para apoiar e distanciar as cordas do corpo e da escala, além de transmitir a vibração das cordas ao tampo.
Encordoamento
As guitarras clássicas utilizam exclusivamente cordas (18) de nylon; a construção deste tipo de instrumento não suporta a tensão maior proporcionada pelas cordas de aço.
As cordas mais finas, chamadas de primas[4] ou agudas, são feitas de polímero monofilamento (um fio único), de nylon ou compostos utilizando carbono e titânio. As mais grossas, chamadas de bordões[4] ou baixos, consistem de um núcleo composto por multifilamentos de fios de nylon, enrolados em espiral por um fio metálico. Este fio é feito geralmente de cobre (puro ou suas ligas), cobre banhado a prata, ou mesmo de prata pura, tratado com revestimento antioxidante. Esta construção permite maior resistência à tração, maior estabilidade de afinação e maior flexibilidade do que seria possível caso se usassem fios de cobre também nas cordas mais grossas.
Execução
Música clássica
Este instrumento originou um ramo da música clássica composta por obras escritas especialmente para tirar partido das possibilidades expressivas do violão, geralmente prelúdios, sonatas e concertos, embora qualquer forma de composição musical possa ser utilizada. O violão é tocado sem o uso de palhetas, utilizando-se as unhas (normalmente da mão direita). As unhas devem estar bem polidas para um som mais perfeito. Já Francisco Tárrega, preconiza que o toque seja realizado pela mão direita com a parte "macia" do dedo, ou seja, a unha não deveria ser utilizada. O toque nas cordas pode ser sem apoio ou com apoio. No último, o dedo, após ferir a corda descansa na corda imediatamente acima.[5] Ao contrário da música popular a execução mais frequente é de uma linha melódica tocada nas cordas agudas e linhas de baixo, escalas e arpejos são tocados simultaneamente à melodia principal.
Principais compositores que escreveram para o instrumento
Século XIX
- Niccolò Paganini (1782 - 1840)
- Luigi Legnani (1790 – 1877)
- Franz Schubert (1797 — 1828)
- Carl Maria von Weber (1786 — 1826)
- Anton Diabelli – (1781 - 1858)
- Dionisio Aguado (1784 - 1849)
- Ferdinando Carulli (1770 - 1841)
- Fernando Sor (1778 - 1839)
- Giulio Regondi (1822 – 1872)
- Francisco Tárrega (1852 - 1909)
- Johann Kaspar Mertz (1806 - 1856)
- Matteo Carcassi (1792 - 1853[6])
- Mauro Giuliani (1781 - 1829)
- Napoleon Coste (1805 - 1883)
Século XX
- Manuel de Falla (1876 – 1946)
- Ottorino Respighi (1879 - 1936)
- Cyril Scott (1879 — 1970)
- Agustín Barrios Mangoré (1885 - 1944)
- Heitor Villa-Lobos (1887 - 1959)
- Frank Martin (1890 - 1974)
- Frederico Moreno-Torroba (1891 - 1982)
- Darius Milhaud (1892 – 1974)
- Andrés Segovia (1893-1987)
- Francisco Mignone (1897 - 1986)
- Leo Brouwer (1939 - )
- Francis Poulenc (1899 – 1963)
- Joaquín Rodrigo (1901) - (1999)
- Antonio José (1902 - 1936)
- William Walton (1902 - 1983)
- Lennox Berkeley (1903 - 1989)
- Cartola (1908-1980)
- Baden Powell (1937 - 2000)
- João Gilberto (1931 - 2019)
- João Bosco (1946 - )
- Rafael Rabello (1962 - 1995)
- Alan Rawsthorne (1905 - 1971)
- Hans Werner Henze (1926 - 2012)
- Pierre Boulez (1925 - )
- Alberto Ginastera (1916 – 1983)
- Radamés Gnattali (1906 - 1988)
- Mozart Camargo Guarnieri (1907 - 1993)
- Elliott Carter (1908 - 2012)
- Benjamin Britten (1913 - 1976)
- Toru Takemitsu (1926) - (1996)
- Nicholas Maw (1935 – 2009)
- Sofia Gubaidulina (1931 - )
- Peter Maxwell Davies (1934 - 2016)
- Brian Ferneyhough (1943)
- Ronaldo Miranda (1948 - )
- Einojuhani Rautavaara (1928 - 2016 )
Música popular
Na música popular as guitarras clássicas são utilizadas para acompanhamento do canto e a execução frequentemente é harmônica. Os acordes são montados com a mão esquerda e com os dedos da mão direita ou palhetas, são feitos diversos tipos de ritmos ou arpejos. Alguns géneros musicais permitem a utilização de linhas melódicas em introduções e solos. No jazz podem ser utilizadas técnicas mais elaboradas como o tapping e a execução com harmônicos. Na música popular é comum a amplificação das guitarras clássicas com microfones dinâmicos. Os amplificadores permitem ajustes de tonalidade e mesmo algumas leves distorções são toleráveis as vezes em alguns estilos populares.
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É importante considerar que o violão tem uso muito amplo na música instrumental brasileira tendo representantes como Baden Powell, Raphael Rabelo, Garoto, Canhoto, Dilermando Reis, Robson Miguel, Francisco Araújo, João Pernambuco, Paulinho Nogueira, Yamandu Costa, Penezzi e o notável Guinga, com seu CD Cheio de Dedos, todos notáveis compositores ou arranjadores.
A relação entre esses e o violão erudito é questão fundamental (em realidade muitos desses citados sequer enxergam alguma fronteira fixa entre erudito e popular). Desse modo pode-se compreender melhor que o violão popular é inseparável do violão erudito brasileiro e até Villa Lobos escreveu uma Suite Popular Brasileira, para violão solo. O nome da obra já indica a ligação entre os estilos. Radames Gnatalli é outro nome indispensável, sem esquecer do próprio Isaias Sávio, que para além de seu compromisso com o ensino do violão no país deixou obras de feição popular também.
Ver também
Referências
- Taubkin, Myriam (organizadora) (2007). Violões do Brasil. São Paulo: Edições SESC SP/Editora SENAC. 240 páginas. ISBN 978-85-98112-46-6
- «História do Violão». InfoEscola. Consultado em 7 de julho de 2021
- Andrade, Mário de (1989). Dicionário Musical Brasileiro 1 ed. [S.l.]: Villa Rica. 701 páginas. ISBN 8531900220
- Rocha Filho, Othon Gomes da (1996). Minhas Primeiras Notas ao Violão. 1 22 ed. São Paulo: Irmãos Vitale. 99 páginas. ISBN 85-85188-25-1
- Pinto, Henrique (1978). Iniciação ao Violão (em bilíngue:português e espanhol). 1. São Paulo: Ricordi. p. 12
- Carcassi, Matteo. 25 Estudos Melódicos e Progressivos Op. 60. para Violão. [S.l.]: Irmãos Vitale
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