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Ora maritima (Orlas marítimas) é um livro do século IV da autoria do escritor latino Avieno.
Trata-se de um poema descritivo geográfico que nos chegou incompleto. Conservam-se 713 versos do livro primeiro, sendo provável que a obra constasse de ao menos dois.[1] Está dedicado a seu amigo Probo e contém uma descrição geográfica das costas europeias, desde a atual França até a Península Ibérica, chegando, talvez até as Ilhas Britânicas.[2]
A Ora maritima é a fonte mais antiga sobre os povos que habitavam o atual território português.[3]
É atualmente difícil saber em que se baseou o autor para a criação da Ora. O estudioso alemão Adolf Schulten, que entre 1914 e 1916 visitou os lugares descritos no poema, lançou a teoria de que Avieno baseou-se nalguma obra mais antiga, um Périplo massaliota do século IV aC. Essa conclusão, porém, é hoje questionada.[2] Uma fonte possível é Himilcão (séc V-VI aC), viajante cartaginês cujos escritos se perderam mas que é citado três vezes por Avieno na Ora.[2][4][5] André Berthelot (1934), por outro lado, acreditava que a obra não está baseada num périplo antigo, uma vez que contém descrições tanto das costas como do interior. Segundo este estudioso, Avieno compôs a Ora maritima utilizando um grande número de fontes de vários autores, hipótese que foi adotada por muitos historiadores.[2]
O livro primeiro da Ora maritima, junto com outras obras de Avieno, foi impresso pela primeira vez em 1488 em Veneza por Victor Pisanus.[6] Há manuscritos posteriores a essa primeira edição impressa que também abrangem apenas o livro primeiro e não adicionam mais material à obra. Um destes manuscritos pertenceu ao ilustre cartógrafo flamengo Abraham Ortelius.[6] A Ora foi impressa novamente em 1590 (Paris), 1634 (Madrid) e várias vezes no século XVIII.[6]
Avieno menciona acidentes geográficos, povoações e povos que são, hoje, muitos difíceis de identificar. Uma das razões para isso é que o poeta utilizou muitos nomes já em desuso para as regiões descritas, refletindo um gosto pelo antigo dos autores latinos da época.[2]
A Ora maritima é uma das fontes mais importantes sobre a antiga civilização de Tartessos, que é descrita como uma cidade localizada numa baía, junto à desembocadura de um rio.[4] Avieno, porém, identifica a cidade de Tartessos com Cádiz, fruto de uma confusão dos autores da Antiguidade.[4] O poema também afirma que Tartessos mantinha relações comerciais com as Estrímnidas (Oestrimnides), provavelmente intercambiando o estanho ibérico.[4][5] As terras e ilhas Estrímnidas são de localização controversa: enquanto alguns pensam que se trataria da Galiza, outros autores as identificam com lugares nas Ilhas Britânicas ou na Bretanha.[5][2]
Uma parte da Península Ibérica é, na Ora, chamada Ofiússa, literalmente "Terra de serpentes".[2][3] Segundo Avieno, Ofiússa era antigamente habitada pelos estrímnios, um povo que poderia ser um representante da cultura megalítica europeia.[2] Segundo uma lenda recolhida por Avieno, os estrímnios foram expulsados de suas terras por uma invasão de serpentes, o que deu origem às mais variadas interpretações pelos estudiosos.[2] Schulten acreditava que a invasão das serpentes simbolizava os sefes, povo celta que teria migrado e expulsado os estrímnios.[2][3]
Em Ofiússa, o poema menciona vários acidentes geográficos, atualmente localizados em território português: uma ilha dedicada a Saturno, possivelmente o Arquipélago das Berlengas; o Cabo de Ofiússa, provavelmente o Cabo da Roca; o estuário do Tejo; o Cabo Cémpsico, que seria o Cabo Espichel; e a Ilha de Ácala, possivelmente hoje incorporada à Península de Troia.[2]
Os povos de Ofiússa são, segundo Avieno, os cempsos, assentados no Alto Alentejo, os sefes, assentados nos vales do Douro e Tejo e os draganos, que viviam no norte da Península, atualmente Galiza e Astúrias.[2][3] Também menciona os Ligus, Lusis ou Lycis, considerados por vários autores como possível referência aos Lusitanos.[2][3] Em Portugal, Martins Sarmento publicou em 1880 um estudo sobre a Ora maritima em que usava o poema como base para defender a teoria da origem dos lusitanos a partir dos lígures.[7]
Mais ao sul, contíguos aos cempsos, Avieno menciona os cinetes, que habitavam a região ao redor do rio Anas, atualmente o Guadiana.[3] O Cabo de São Vicente, no Algarve português, é chamado por ele Cabo Cinético em referência a esse povo.[3][8] Segundo Avieno, a partir desse cabo, dedicado a Saturno, se entrava no Oceano (o Atlântico), habitado por muitos monstros.[8]
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