Na tentativa de pôr cobro às diferenças ortográficas entre Portugal e o Brasil, como resultado da adoção em Portugal da Reforma Ortográfica de 1911, foram feitos diversos encontros entre as Academias dos dois países, dos quais resultou um acordo preliminar assinado em 1931. No entanto, como os vocabulários que se publicaram, em 1940 (pela Academia das Ciências de Lisboa) e em 1943 (pela Academia Brasileira de Letras),[2] continham ainda algumas divergências, houve necessidade de novas reuniões, em Lisboa, que deram origem ao Acordo Ortográfico de 1945. Este acordo tornou-se lei em Portugal,[3] mas no Brasil não foi ratificado pelo Congresso Nacional, continuando os brasileiros a regular-se pelo Formulário Ortográfico de 1943.
O texto do Formulário Ortográfico de 1943 é composto por duas partes:
Introdução: composta por 12 artigos, explicitou os princípios de fixação para a grafia do português brasileiro.
Bases do Formulário: composta por 17 bases, apresentou os princípios que regeram a ortografia da língua portuguesa no Brasil desde 1943, com as alterações realizadas pela Lei 5 765, de 18 de dezembro de 1971.
Bases do Acordo
Base I - Alfabeto: determina a composição do alfabeto português com 23 letras, permitindo o emprego das letras K, W e Y apenas em casos especiais.
Base II - K, W, Y: apresenta as mudanças gráficas de termos que até então empregavam essas letras - k por qu (antes de e e i) ou por c (antes de a, o e u). O w, substituído por v ou u, de acordo com seu valor fonético. O y substituído sempre por i. As únicas exceções foram as letras que compõem abreviaturas internacionais ou fazem parte de antropônimos estrangeiros.
Base III - H: esta letra passou a ser conservada apenas no princípio das palavras cuja etimologia o justificasse, nos dígrafosch, lh e nh, em interjeições e nos compostos com hífen. Foi abolido em compostos sem hífen.
Base IV - Consoantes mudas: extinção completa de quaisquer consoantes que não se proferissem, ressalvadas as palavras que tivessem variantes com letras pronunciadas ou não.
Base V - SC: eliminação do sc no início das palavras e manutenção apenas quando os vocábulos já estivessem formados.
Base VI - Letras dobradas: permanência dos grupos rr e ss com som único e do grupo cc (ou cç) com sons distintos.
Base VII - Vogais nasais: fixação da grafia dessas vogais.
Base VIII - Ditongos: regras para a grafia de ditongos orais e nasais.
Base IX - Hiatos: uso de oe e ue nos verbos terminados em oar e uar na 1ª, 2ª e 3ª do singular do subjuntivo.
Base X - Parônimos e vocábulos de grafia dupla: fixação de grafias de e/i, o/u, c/q, ch/x, g/j, s/ss/c/ç, s/x, s/z e com os vários valores fonéticos do x.
Base XI - Nomes próprios: regras do Formulário para aportuguesamentos e nomes próprios. Ressalva ao direito de manter a grafia original dos nomes próprios de empresas.[4] Exceção feita aos topônimos de tradição histórica, tais como "Bahia".[5]
Base XII - Acentuação gráfica: regras para grafar os acentos nas oxítonas, paroxítonas e proparoxítonas.
Base XIII - Apóstrofo: apenas para supressão de letras em versos, reprodução de pronúncias populares, supressão de vogais em palavras compostas com consagração pelo uso, como em d'oeste, d'alho, d'arco, etc.
Base XIV - Hífen: uso de hífen em verbos e palavras compostas com prefixos e sufixos, além de verbos.
Base XV - Divisão silábica: determinou que a separação silábica devesse ser feita pela soletração e não mais pela etimologia.
Base XVI - Emprego das iniciais maiúsculas: apresentou as regras para o uso de maiúsculas, excluindo-o para meses do ano, pontos cardeais, nomes de povos e nacionalidade.
Algumas regras em relação à morfologia do português, no Brasil, anterior a 1943, em Portugal anterior a 1911,[6] muitas semelhantes às mesmas do inglês e francês (ainda em curso).
Consoante dobrada = era usado onde a etimologia o justificasse, como em difficil (difícil, latim difficilis) e cavallo (cavalo, latim caballum);
CH (som de K) = era usado em palavras de origem grega, onde se emprega a letra Χ (chi), como em christão (χριστιανός) e architectura (Αρχιτεκτονική);
MM = obedecia à grafia original em latim, como em commercio (commercium) e incommodar (incommodare), onde o primeiro M representava o som nasal antes do M silábico;
NN = caso semelhante aos dois anteriores, somente em relação ao som de N nasal precedido de N, como em connexão (connexionis) e innocente (innocentis);
PH = era usado em palavras de origem grega, onde se emprega a letra Φ (fi), como em pharmacia (φάρμακον) e philosophia (φιλοσοφία);
RH = era usado em palavras de origem grega, onde se empregava a letra Ρ (rô) quando vinha com um espírito áspero (Ῥ), como em rhetorica (ῥητορῐκός) e rhitmo (ῥυθμός);
TH = era usado em palavras de origem grega, onde se emprega a letra Θ (theta), como em theatro (θέατρον) e thorax (θώραξ);
XH = era comumente usado em casos de justaposição do prefixo ex com a letra H, como em exhibição (exhibitionis) ou exhalação (exhalationis).
Em obediência às regras descritas acima, os prefixos e sufixos de origem grega eram escritos da seguinte forma:
Grapho (escrever, gravar) = colocava-se o PH no lugar do atual F, como em caligraphia e telegraphista;
Antecedia vogais tônicas e em hiato, como em Jahu (Jaú) e sahida (saída).
A ênclise
Por exemplo, em amá-la, o L ficava separado do pronome e se juntava à palavra: amal-a.
Origens
Essa ortografia anterior a 1911, em Portugal, e a 1943, no Brasil, apareceu por volta de meados do século XVII, e foi elaborada por linguistas portugueses. Uma das causas primordiais da utilização desse sistema ortográfico, além da modernização do idioma, foi a tentativa da língua portuguesa se distanciar mais do espanhol. De 1580 até 1640, Portugal partilhou com a Espanha uma união dinástica, período denominado União Ibérica. E uma teoria muito frequente na Espanha da época, era que o português consistia em um dialeto do espanhol. Obviamente, essa teoria espanhola foi criada com o intuito de funcionar como uma espécie de "instrumento", para uma maior dominação sobre os portugueses. Essa teoria se perpetua em relação ao galego, que é alternativamente considerado como um dos dialetos do sistema linguístico galaico-português, ao lado do português.[7]
«Formulário ortográfico de 1943, oficial no Brasil», Instituto de lingüística teórica e computacional, Portal da língua portuguesa, Os nomes próprios personativos, locativos e de qualquer natureza, sendo portugueses ou aportuguesados, estão sujeitos às mesmas regras estabelecidas para os nomes comuns..
Como expressamente mencionado no item 42: Os topônimos de tradição histórica secular não sofrem alteração alguma na sua grafia, quando já esteja consagrada pelo consenso diuturno dos brasileiros. Sirva de exemplo o topônimo "Bahia", que conservará esta forma quando se aplicar em referência ao Estado e à cidade que têm esse nome. No entanto, os compostos e derivados desses topônimos obedecem às normas gerais do vocabulário comum, tais como baiano, baiana, etc. É de se notar que o Acordo Ortográfico de 1990, sucessor do FO-1943 no Brasil, não faz menção explícita a esta regra, e que portanto valida a grafia Baía no Brasil desde 1 de janeiro de 2009 e que Bahia deixará de ser formalmente correta a partir de 31 de dezembro de 2015.
ANDRADE, Gustavo de. Grammatica Intuitiva da Língua Portugueza. (Curso Elementar). Salvador: Livraria Catilina de Romualdo dos Santos - Livreiro Editor, 1935. 8ª Edição.