O Estado de bem-estar social, ou estado-providência, ou estado social, é um tipo de organização política, económica e sócio-cultural que coloca o Estado como agente da promoção social e organizador da economia. Nesta orientação, o Estado é o agente regulamentador de toda a vida e saúde social, política e económica do país, em parceria com empresas privadas e sindicatos, em níveis diferentes de acordo com o país em questão. Cabe, ao Estado de bem-estar social, garantir serviços públicos e proteção à população, provendo dignidade aos naturais da nação.[1]
O Estado de bem-estar social moderno nasceu na década de 1880, na Alemanha, com Otto von Bismarck, como alternativa ao liberalismo económico e ao socialismo.[2]
Pelos princípios do Estado de bem-estar social, todo indivíduo tem direito, desde seu nascimento até sua morte, a um conjunto de bens e serviços, que deveriam ter seu fornecimento garantido seja diretamente através do Estado ou indiretamente mediante seu poder de regulamentação sobre a sociedade civil. São as chamadas prestações positivas ou direitos de segunda geração,[3] em que se inclui gratuidade e universalidade do acesso à educação, à assistência médica, ao auxílio ao desempregado, à aposentadoria, bem como à proteção maternal, à infantil e à senil.
Os apoiantes demonstram como exemplo de sucesso na adoção integral do Estado de bem-estar social a experiência de países nórdicos.[4] Por outro lado, críticos alegam que pode haver compreensão equivocada do funcionamento do Modelo nórdico, e que os defensores do Estado de bem-estar social em outros lugares tentam copiar apenas os direitos e não as obrigações implementadas por aqueles países. De todo modo, os dados frios nórdicos, oriundos de nações que adotaram o sistema corretamente, independentemente de apoiadores onde o modelo não foi adotado por completo, mostram eficiência desse modelo de dignidade universal refletida em seu IDH, que, ao contrário do senso comum, não elimina a possibilidade de enriquecimento, apenas diminui a miséria quase por completo com distribuição de recursos e de renda realizadas sob regras reforçadas, objetivando mera dignidade para todos.[5][6][7]
Etimologia
O termo alemão Sozialstaat ("estado social") tem sido usado desde 1870 para descrever programas de apoio estatal criados por Sozialpolitiker ("políticos sociais") alemães e implementados como parte das reformas conservadoras de Bismarck.[8]
O equivalente literal inglês "estado social" não pegou nos países anglófonos.[9] No entanto, durante a Segunda Guerra Mundial, o arcebispo anglicano William Temple, autor do livro Christianity and the Social Order (1942), popularizou o conceito usando a expressão "welfare state".[10] O uso do "estado de bem-estar" pelo Bispo Temple foi ligado ao romance de 1845 de Benjamin Disraeli, Sybil: or the Two Nations onde ele escreve "o poder tem apenas um dever" para assegurar o bem-estar social de as pessoas ".[11]
O estado de bem-estar sueco chama-se folkhemmet e origina-se na campanha política de Per Albin Hansson em 1932.[12] O termo italiano é stato sociale ("estado social"), em francês, o conceito é expresso como l'État-providência. O espanhol e muitas outras línguas empregam um termo análogo: estado del bienestar - literalmente, "estado de bem-estar".
Em português, existem duas frases semelhantes: estado de bem-estar social e estado-providência denotando a missão do Estado de garantir o bem-estar básico dos cidadãos. Também são chamados de "direitos de segunda geração" ou "direitos sociais".[13]
História
Iniciativas isoladas e pontuais de programas assistenciais são encontradas desde à antiguidade. Porém, o Estado de bem-estar social moderno é creditado ao alemão Otto von Bismarck na década de 1880, que introduziu os primeiros programas compulsórios de assistência social em escala nacional: seguro de saúde em 1883, indenizações de trabalhadores em 1884 e pensões de velhice e invalidez em 1889. O exemplo da Alemanha foi logo seguido pela Áustria e Hungria.[14]
Na Inglaterra, o governo de Herbert Henry Asquith foi responsável por introduzir uma série de reformas sociais entre 1914 e 1918 incluindo as pensões para aposentados, o seguro de saúde nacional e o seguro desemprego nacional.[15] Na Suécia foram adotadas a partir das políticas de Per Albin Hansson em 1932.[12] Nos Estados Unidos, o Estado de bem-estar social' ganhou vulto na administração de Franklin D. Roosevelt com o New Deal entre 1933 e 1937.
Os estados de bem-estar sempre diferiram de país para país. Em 1990, Gøsta Esping-Andersen, um sociólogo dinamarquês, descreveu três variedades de “capitalismo assistencialista”:[16]
- As versões “social-democratas” na Escandinávia, com tributos altos e benefícios universais;
- Os estados de bem-estar anglo-americanos, com tributos baixos e que enfatizam a garantia de um mínimo existencial e não benefícios universais;
- Os modelos mistos, como os da Alemanha, que foram construídos em torno do princípio contributivo.
A social democracia tende a defender o modelo nórdico enquanto o sistema anglo-americano é preconizado pelo conservadores liberais.[17] Os defensores do modelo nórdico alegam que esse traz menos desigualdade e mais mobilidade social.[18] Por outro lado, os proponentes do modelo anglo-americano argumentam que, devido ao aumento de tributos, redes de proteção universais afetam os investimentos do qual os benefícios se estendem a toda a humanidade.[19]
Discussão sobre os efeitos
Em 1974, o sociólogo e economista sueco Gunnar Myrdal, e o economista e filósofo austríaco Friedrich Hayek, dividiram o Nobel de Economia com pesquisas opostas sobre os efeitos do Estado de bem-estar social.
Dos argumentos favoráveis
Em 1932, o sociólogo e economista Social-democrata Gunnar Myrdal escreveu que as modernas políticas sociais diferiam totalmente das antigas políticas de auxílio à pobreza, uma vez que eram investimentos e não custos. As políticas sociais modernas seriam eficientes e produtivas devido à sua ação profilática e preventiva, direcionada para evitar o surgimento de problemas nos organismos político-sociais. Nesse sentido, as novas políticas sugeridas por Myrdal contrastavam fortemente com as antigas políticas de "remediar a pobreza", sendo destinadas a evitar o surgimento de bolsões de pobreza e a criar maiores riquezas. Myrdal, retornando dos Estados Unidos, onde tornou-se um admirador do New Deal, escreveu um artigo intitulado Qual é o custo da Reforma Social, onde desenvolvia sua argumentação e atacava os críticos das despesas sociais, da (antiga) escola de Estocolmo.[20]
Contra as recomendações dos que pregavam uma "maior economia orçamentária" para sair da Grande Depressão, Myrdal argumentava que as políticas sociais não eram meramente uma questão de redistribuição de renda, mas eram uma questão vital para o próprio desenvolvimento econômico e tinham, como objetivo principal, o aumento do produto interno bruto.[21] A orientação visava a maior eficiência dos mercados e via nas políticas sociais um meio de obter não só a segurança social dos indivíduos, mas sobretudo a organização eficiente da produção.[20][22]
Visão crítica
Friedrich Hayek concordava que "Todos os governos modernos têm organismos de previdência para os indigentes, os incapacitados e os deficientes e cuidam de áreas como saúde e difusão de conhecimentos. Com o crescimento da riqueza, seria concebível que essas atividades, essencialmente de serviços, também se ampliassem. Há necessidades comuns que só podem ser satisfeitas com a ação coletiva e que podem assim ser atendidas sem restrição da liberdade individual. Também é plenamente aceitável que o governo desempenhe certo papel ou mesmo tome a iniciativa em áreas como seguro social e educação, ou subsidie temporariamente certos projetos experimentais. Nosso problema, aqui, não são tanto os objetivos quanto os métodos da ação governamental.".[23]
Segundo Hayek, o poder concentrado e coercitivo do Estado Previdenciário, se assemelhava a um modelo de Economia planificada, que resultaria na agressão à liberdade dos indivíduos em escolherem os seus próprios meios de proteção social porque “seguro social significou, desde o início, não apenas o seguro compulsório, mas a contribuição compulsória a um organismo unitário controlado pelo Estado."[24] Além disso, planejadores centrais sofrem da limitação de conhecimento levando à oferta de bens e serviços piores do que em um ambiente competitivo. Assim, mesmo em sistemas que permitem a atuação de agentes privados, caso esses sofram regulação excessiva, com controle de preços e dirigismo contratual, tampouco existe uma competição de verdade porque foge do sistema livre de formação de preços.[25] Hayek também critica que a redistribuição de renda tornou-se o principal objetivo do seguro social e não mais o combate à pobreza. Para Hayek a luta contra a desigualdade é utópica e arbitrária e acaba por produzir mais pobreza. O autor defendia o modelo anglo-americano, com tributos baixos e que enfatiza a garantia de um mínimo existencial.[26]
Alinhado com Hayek, o economista americano Milton Friedman propôs uma solução: o imposto de renda negativo, uma espécie de Renda básica de cidadania.[27] Todas as prestações públicas diretas seriam eliminadas, não haveria escolas ou hospitais públicos. Ao invés disso, cada cidadão receberia uma renda universal para gastar como bem entendesse. Assim os cidadãos escolheriam os seus prestadores de serviços sociais privados. A proposta de Milton Friedman soluciona a crítica de Hayek ao monopólio estatal na prestação de serviços sociais possibilitando a competição também na área social. O Cheque escolar é considerado uma espécie dessa ideia. No entanto, seus críticos consideram a proposta ainda utópica devido à complexidade da sua implementação.[28]
Relação entre despesas sociais, PIB per capita e IDH
A tabela abaixo mostra despesas sociais em percentagem do produto interno bruto para alguns estados membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico omitindo e incluindo as despesas com educação pública,[29] relacionando-as ao produto interno bruto per capita (com paridade do poder de compra em dólar dos Estados Unidos) em 2001:
Nação | Despesas de Bem-Estar (% do PIB) omitindo educação | Despesas de Bem-Estar (% do PIB) incluindo educação[29] | PIB per capita (PPC US$) |
---|---|---|---|
Dinamarca | 29,2 | 37,9 | $29 000 |
Suécia | 28,9 | 38,2 | $24 180 |
França | 28,5 | 34,9 | $23 990 |
Alemanha | 27,4 | 33,2 | $25 350 |
Bélgica | 27,2 | 32,7 | $25 520 |
Suíça | 26,4 | 31,6 | $28 100 |
Áustria | 26,0 | 32,4 | $26 730 |
Finlândia | 24,8 | 32,3 | $24 430 |
Países Baixos | 24,3 | 27,3 | $27 190 |
Itália | 24,4 | 28,6 | $24 670 |
Grécia | 24,3 | 28,4 | $17 440 |
Noruega | 23,9 | 33,2 | $29 620 |
Polônia | 23,0 | N/A | $9 450 |
Reino Unido | 21,8 | 25,9 | $24 160 |
Portugal | 21,1 | 25,5 | $18 150 |
Luxemburgo | 20,8 | N/A | $53 780 |
República Tcheca | 20,1 | N/A | $14 720 |
Hungria | 20,1 | N/A | $12 340 |
Islândia | 19,8 | 23,2 | $29 990 |
Espanha | 19,6 | 25,3 | $20 150 |
Nova Zelândia | 18,5 | 25,8 | $19 160 |
Austrália | 18,0 | 22,5 | $25 370 |
Eslováquia | 17,9 | N/A | $11 960 |
Canadá | 17,8 | 23,1 | $27 130 |
Japão | 16,9 | 18,6 | $25 130 |
Estados Unidos | 14,8 | 19,4 | $34 320 |
Irlanda | 13,8 | 18,5 | $32 410 |
México | 11,8 | N/A | $8 430 |
Coreia do Sul | 6,1 | 11,0 | $15 090 |
É interessante comparar-se a percentagem do produto interno bruto de cada país que é investida em políticas sociais com seus respectivos Índices de Desenvolvimento Humano. Observa-se claramente que, dentre aqueles países que investiram um grande percentual do seu PIB em políticas sociais, todos eles obtiveram um IDH elevado (acima de 80%). A relação não é direta: nem sempre o país que mais investiu em políticas sociais é o melhor colocado no IDH, o que indica que não só o "investir" é importante, mas o "como investir" tem grande influência nos resultados obtidos:
Índice de Desenvolvimento Humano Muito Elevado > 0,900
Efeitos sobre a pobreza
A evidência empírica sugere que os impostos e as transferências de renda podem reduzir consideravelmente a pobreza na maioria dos países, cujo bem-estar dos estados comumente constituem pelo menos um quinto do PIB.[31][32]
País | Taxa de pobreza absoluta (limiar fixado em 40% da renda média E.U.A.)[31] | Taxa de pobreza relativa[32] | ||
---|---|---|---|---|
Pré-transferência | Pós-transferência | Pré-transferência | Pós-transferência | |
Suécia | 23,7 | 5,8 | 14,8 | 4,8 |
Noruega | 9,2 | 1,7 | 12,4 | 4,0 |
Países Baixos | 22,1 | 7,3 | 18,5 | 11,5 |
Finlândia | 11,9 | 3,7 | 12,4 | 3,1 |
Dinamarca | 26,4 | 5,9 | 17,4 | 4,8 |
Alemanha | 15,2 | 4,3 | 9,7 | 5,1 |
Suíça | 12,5 | 3,8 | 10,9 | 9,1 |
Canadá | 22,5 | 6,5 | 17,1 | 11,9 |
França | 36,1 | 9,8 | 21,8 | 6,1 |
Bélgica | 26,8 | 6,0 | 19,5 | 4,1 |
Austrália | 23,3 | 11,9 | 16,2 | 9,2 |
Reino Unido | 16,8 | 8,7 | 16,4 | 8,2 |
Estados Unidos | 21,0 | 11,7 | 17,2 | 15,1 |
Itália | 30,7 | 14,3 | 19,7 | 9,1 |
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