Maioria silenciosa

Frustrada iniciativa de mobilização de massas pelo então presidente Spínola e seus apoiantes Da Wikipédia, a enciclopédia livre

Maioria silenciosa é a designação pela qual ficou conhecida em Portugal a iniciativa política de alguns sectores conservadores da sociedade portuguesa, civil e militar, que decidiram organizar uma manifestação, em 28 de Setembro de 1974, de apoio ao então Presidente da República General Spínola. A manifestação visava o reforço de posição política deste militar.

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Perspectiva

Preparação pela organização

Dia 9 de Setembro reúnem-se para preparar a manifestação da “maioria silenciosa”, elementos dos partidos PP/MFP, PDC e PL, tendo sido escolhidos para a comissão organizadora José Filipe Rebelo Pinto, António Sousa Macedo, Manuel Sá Coutinho, Francisco de Bragança van Uden, António da Costa Félix e Manuel João Ramos de Magalhães, que viria a ser presidida por Fernando José Pereira Marques Cavaleiro, na sequência de contactos entre o Tenente-coronel António Figueiredo e o general Kaúlza de Arriaga.[1][2]

No dia 10 de Setembro, nas instalações da SINASE, o tenente-coronel Figueiredo, Almeida Araújo e António Ávila reúnem-se com os membros da Comissão Organizadora da manifestação, distribuindo tarefas. A 13 de Setembro, o Partido Liberal distribui uma carta-circular apelando à participação na manifestação de apoio ao Presidente da República que seria denominada de “maioria silenciosa” e a realizar em data a anunciar.[3]

Dia 23 o Governador Civil de Lisboa autoriza a manifestação.[4]

Na tarde de 26 tem lugar o Concurso Hípico Internacional de Lisboa em que Spínola recebe um cartaz da “maioria silenciosa” entre os aplausos dos presentes. Nessa ocasião, Galvão de Melo, trajado de cavaleiro, declara o seu apoio à manifestação. Passados dois dias, estando ele enquanto chefe de Estado numa corrida de touros no Campo Pequeno, será a vez do cavaleiro tauromáquico José João Zoio fazer o mesmo.[5][6]

Reações de oposição à manifestação

No dia 27, o Brigadeiro Otelo Saraiva de Carvalho do COPCON e o Ministro da Defesa Mário Firmino Miguel reagem, com o conhecimento de Costa Gomes. Otelo monta uma operação visando a prisão de antigos membros da Legião Portuguesa, de pessoas ligadas ao Estado Novo e dos envolvidos na preparação da manifestação.[7]

O Ministro da Comunicação Social lê um comunicado do Governo Provisório na Emissora Nacional, emitido de meia em meia hora. A manifestação é interditada pelo MFA. Os partidos políticos de esquerda distribuem entretanto comunicados apelando “à vigilância popular” e denunciam as tentativas contra-revolucionárias dessa minoria tenebrosa. São levantadas barricadas populares nos acessos a Lisboa e noutras localidades. Durante a noite, grupos de militares tomam o lugar dos activistas civis. São detidas várias figuras políticas afectas ao velho regime, quadros da Legião Portuguesa e alguns manifestantes.

Nas entradas de Lisboa, foram apreendidas:

  • 699 espingardas caçadeiras;
  • 44 espingardas de pressão de ar;
  • 118 pistolas e revólveres;
  • 23 pistolas de alarme;
  • 332 armas brancas;
  • 549 matracas e congéneres;
  • e 9885 munições.[8]

Derrota de Spínola

António de Spínola tenta entretanto reforçar o poder da Junta de Salvação Nacional, que comanda, e, em vão, estabelecer o estado de sítio.[9] Em consequência disso, a Comissão Coordenadora do MFA impõe-lhe a demissão dos três generais mais conservadores do grupo: Galvão de Melo, Manuel Diogo Neto e Jaime Silvério Marques. Derrotado, Spínola demite-se a 30 de setembro do cargo de Presidente da República, sendo substituído pelo general Costa Gomes. No seu discurso de renúncia, Spínola ataca as políticas do governo e alega que haveria caos, anarquia e “novas formas de escravatura”.[10]

Com a “vitória sobre a reação” e a derrota da direita civil, declaradas pelo então Primeiro Ministro Vasco Gonçalves, fecha-se assim o que seria considerado o primeiro ciclo do PREC.

Atos subsequentes

Vários apoiantes militares de Spínola fogem para o estrangeiro.

Spínola continuaria a sua influência, contribuindo na organização da tentativa de golpe a 11 de março de 1975, mas também na criação e liderança da organização terrorista MDLP. Esta organização realizará mais de 500 atentados incluindo ataques a sedes políticas e cívicas, bombas e assassinatos até 1979.[11]

Notas

  • A expressão "maioria silenciosa" foi usada pela primeira vez pelo Presidente Nixon dos EUA para designar a parcela do povo americano que, segundo ele, o apoiaria na sua política de guerra no Vietnam, em alusão “ad contrarium” à activíssima “minoria” que se lhe opunha e de que os media faziam eco.

Ver também

Referências

  1. ... o financiamento da manifestação terá sido organizado por Kaúlza de Arriaga e o Tenente-coronel Fernando Cavaleiro que garantiram o apoio financeiro do Banco Espírito Santo e Comercial de Lisboa. ...para uma conta colectiva onde um dos titulares, Silvino Castro Moreira, era membro do Secretariado Regional do Norte do Partido Liberal. - Spinolismo: Viragem Política e Movimentos Sociais, por Francisco Felgueiras Bairrão Ruivo,Tese de Doutoramento em História Contemporânea, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa, Julho, 2013, pág. 392 e 393
  2. Segundo o relatório dos acontecimentos, Fernando Cavaleiro, em reunião dia 13 com a Comissão Organizadora, terá imposto como condição para a presidir, dar conhecimento da manifestação a Spínola e Costa Gomes, com quem tinha relações de amizade. Enquanto o segundo levantou várias objecções, Spínola terá manifestado a sua concordância - Spinolismo: Viragem Política e Movimentos Sociais, por Francisco Felgueiras Bairrão Ruivo,Tese de Doutoramento em História Contemporânea, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa, Julho, 2013, pág. 390
  3. [https://expresso.pt/presidenciais2016/2016-01-18-Spinola-demite-se-num-discurso-ao-pais-e-Costa-Gomes-eleito-Presidente-por-dois-votos Spínola demite-se num discurso ao país e Costa Gomes eleito Presidente por dois votos] - CIT. semanário Expresso: "Já na posse do II Governo, em julho de 1974, o general António de Spínola apelara à “maioria silenciosa” do povo português. Idêntico chamamento fizera a 10 de setembro, na cerimónia do reconhecimento da independência da Guiné-Bissau. Melo Antunes, o ideólogo do Movimento das Forças Armadas, recorda que “era uma expressão muito utilizada” por Spínola, “facilmente relacionável” com a famosa marcha sobre Roma, decisiva na subida ao poder do Partido Nacional Fascista, de Mussolini.", 18 de janeiro 2016
  4. Neves, Orlando. «Textos Históricos da Revolução». marxists.architexturez.net. Consultado em 11 de outubro de 2024
  5. Álvaro, Cunhal (1999). A Verdade e a Mentira na Revolução de Abril (PDF). [S.l.]: Edições Avante. p. 160. ISBN 978-97-25505-80-9
  6. «PORTUGAL: The Fall of a Hero-General». Time (revista). 14 de outubro de 1974. Consultado em 1 de dezembro de 2009
  7. Carvalho, Miguel (6 de fevereiro de 2017). Quando Portugal Ardeu. [S.l.]: Leya

Bibliografia

Ligações externas

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