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filo de invertebrados Da Wikipédia, a enciclopédia livre
Platyhelminthes (do grego πλατύ, platy, "achatado" e ἕλμινς, helminth-, "verme"),[2] comumente designados por platelmintes,[3] platelmintas, platelmintos ou vermes planos, é um filo de invertebrados com simetria bilateral, não-segmentados, protostómios, de corpo mole e relativamente simples. A par com os nematelmintas e anelídeos, são considerados vermes.
Os Platyhelminthes são animais bilateralmente simétricos, em cuja anatomia o lado esquerdo e direito se espelham como imagens invertidas um do outro. Esta simetria implica que apresentem face inferior e superior distintas e que no seu corpo é possível destrinçar as extremidades anterior (cabeça) e posterior (cauda). Medindo desde alguns milímetros até metros de comprimento, para além das características anatómicas básicas atrás apontadas, o corpo é mole e não segmentado.[4]
Como os restantes animais com simetria bilateral (os Bilateria ou bilaterianos), os Platyhelminthes apresentam três camadas principais de células, denominadas endoderme, mesoderme e ectoderme,[5] o que os distingue dos animais radialmente simétricos, os cnidários e os ctenóforos, que apresentam apenas duas camadas celulares.[6] Essa estrutura triblástica traduz-se na presença de uma epiderme uniestratificada, abaixo da qual existem duas camadas musculares, sendo a primeira composta por músculos circulares e a segunda por músculos longitudinais. A esse conjunto dá-se o nome de tubo músculo-dermático, ao qual cabem funções de protecção, locomoção (suportando as restantes estruturas anatómicas).
Para além das características anatómicas e citológicas atrás apontadas, os Platyhelminthes são "definidos mais por aquilo que não apresentam do que por qualquer conjunto particular de especializações".[7] Entre as características em falta, os Platyhelminthes, ao contrário dos restantes bilaterianos, não apresentam cavidade corporal interna, sendo por isso descritos como acelomados. Também não apresentam sistema circulatório ou sistema respiratório com órgãos especializados, ausências que são consideradas aspectos definidores para a classificação anatómica deste grupo de organismos.[5][8]
Nos platelmintos de vida livre, a epiderme apresenta cílios, utilizados na locomoção. Nas espécies parasitas, existe uma cutícula que envolve o tubo músculo-dermático, conferindo-lhe resistência à acção dos sucos digestivos.
Em resultado de serem organismos acelomados, para além da ausência de sistemas respiratório e circulatório especializados, não formam um sistema digestivo completo, apresentando uma única abertura, a boca, por onde ingerem alimentos e eliminam as fezes, não apresentando ânus. Outra consequência, especialmente devida à falta de sistema circulatório especializado, é a forma achatada, necessária para que as células fiquem próximas ao meio externo (para respirar) e próximas ao intestino (para obter nutrientes).
Alguns nem tubo digestivo têm, por estarem adaptados à vida parasitária, absorvendo, através da pele o alimento previamente digerido pelo organismo hospedeiro.[9]
A comparação das características anatómicas dos Platyhelminthes com os Bilateria e Cnidaria e Ctenophora pode ser resumida da seguinte forma:
Cnidaria e Ctenophora[6] | Platyhelminthes[5][8] | Bilateria mais "avançados"[10] | |
---|---|---|---|
Simetria bilateral | Não | Sim | |
Número de camadas celulares | Duas, com uma camada gelatinosa entre elas | Três | |
Cérebro individualizado | Não | Sim | |
Sistema digestivo especializado | Não | Sim | |
Sistema excretório especializado | Não | Sim | |
Cavidade corporal com órgãos internos | Não | Sim | |
Órgãos circulatórios e respiratórios especializados | Não | Sim |
A falta de órgãos circulatórios e respiratórios específicos limita os platelmintas a tamanhos e formas que permitam ao oxigénio alcançar e ao dióxido de carbono deixar todas as partes dos seus corpos através de simples difusão. Por isso, muitos apresentam tamanhos microscópicos e as espécies de maiores dimensões apresentam corpos com formas planas semelhantes a fitas ou folhas. O sistema digestivo das espécies de maiores dimensões apresentam muitas ramificações, permitindo que os nutrientes possam atingir todas as partes do corpo por simples difusão.[7]
A respiração através de toda a superfície do corpo torna estes animais vulneráveis à perda de fluidos o que os restringe a ambientes onde a desidratação seja improvável, nomeadamente o mar, as massas de água doce e os habitats terrestres húmidos (tais como sob a manta morta ou entre os grãos de solo) e como parasitas dentro de outros animais.[5]
O espaço entre a pele e a parede do intestino é preenchido com mesênquima, um tecido conjuntivo constituído por células reforçadas por fibras de colagénio que actuam como um tipo de esqueleto, proporcionando pontos de fixação para os músculos. O mesênquima contém todos os órgãos internos e permite a passagem de oxigénio, nutrientes e produtos excretórios. O tecido é composto por dois tipos principais de células: (1) células fixas, algumas das quais com vacúolos cheios de líquido; e (2) células estaminais, que se podem transformar em qualquer outro tipo de célula, utilizados na regeneração de tecidos após lesão ou para reprodução assexuada.[5]
A maioria dos platelmintas não têm ânus e regurgitam o material não digerido pela boca. No entanto, algumas espécies de corpo alongado têm um ânus e algumas espécies com intestino complexo ramificado podem ter mais de um ânus, uma vez que a excreção apenas através da boca seria difícil.[8] O intestino é revestido com uma camada única de células derivadas da endoderme que absorvem e digerem os alimentos. Algumas espécies iniciam o processo digestivo pela quebra e suavização do alimento através da secreção de enzimas para o intestino ou da faringe.[5]
Todos os animais necessitam para manter a concentração de substâncias dissolvidas nos fluidos corporais a um nível relativamente constante. Os parasitas internos e os animais marinhos de vida livre vivem em ambientes com altas concentrações de materiais dissolvidos e geralmente deixam seus tecidos manter um nível de concentração semelhante ao do ambiente, enquanto os animais de água doce precisam de impedir que seus fluidos corporais se tornem demasiado diluídos. Apesar desta diferença, resultado das especificidades ambientais, a maioria dos platelmintas usa o mesmo sistema para controlar a concentração dos seus fluidos corporais: células especializadas, designadas por células-chama (ou células-flama), assim chamadas porque quando visto ao microscópio o batimento dos seus flagelos se parece com a chama bruxuleante de uma vela, extraem do mesênquima a água que contém resíduos e algum material reutilizável, conduzindo o fluido retirado através de redes de células tubulares revestidas por flagelos e microvilosidades. Os flagelos das células do tubo conduzem a água para saídas chamados nefridióporos, enquanto as microvilosidades reabsorvem materiais reutilizáveis e água, tanta quanto necessário para manter os fluidos do corpo na concentração correcta. Estes agrupamentos de células-chama e células tubulares são chamados protonefrídeos.[5][10]
Em todos os platelmintas, o sistema nervoso está concentrada na extremidade da cabeça. Estas concentração é menos marcada nos Acoelomorpha, que apresentam redes nervosas semelhantes às dos cnidários e ctenóforos, embora mais densas em torno da cabeça. Outros platelmintas têm anéis de gânglios na cabeça e troncos nervosos principais que funcionam ao longo dos seus corpos.[5][8]
Possui apenas uma abertura em todo o sistema, portanto é incompleto. Constitui-se por boca, faringe e intestino ramificado que termina em fundo cego. Os cestóides (endoparasitas, como a ténia) não possuem sistema digestivo. A digestão é extra e intracelular.[9]
Apresentam sistema nervoso central formado por um anel nervoso ligado a cordões longitudinais ou por um par de gânglios cerebroides dos quais partem filetes nervosos laterais que percorrem todo o corpo, emitindo ramificações. Isso permite uma melhor coordenação do sistema muscular, bem desenvolvido, o que disciplina os movimentos do animal e lhe dá mais orientação.[9]
A excreção é feita através dos protonefrídeos que incluem células terminais multiciliadas denominadas de células-flama (ou solenócitos). Estruturas típicas dos platelmintes, as células-flama eliminam os excreta para dentro de ductos anastomosados, e por vezes ciliados, que se abrem para o exterior por um ou mais poros.[9]
São amoniotélicos, pois excretam amónia e não ureia como os mamíferos.[9]
Os platelmintos não possuem sistemas ou órgãos especializados em trocas gasosas ou respiração nem destinados à distribuição de nutrientes pelo corpo. O oxigénio e o dióxido de carbono são transferidos através da pele e dos tecidos por difusão molecular.[9] Os nutrientes são absorvidos directamente pelos tecidos a partir do tracto digestivo ou da pele (no caso dos endoparasitas).
Geralmente são hermafroditas, podendo ou não praticar a autofecundação, sendo que alguns se reproduzem por partenogénese.[9]
Nos turbelários e trematódeos monogenéticos o desenvolvimento é direto. Já nos digenéticos e cestoides é indireto. Os platelmintes de menor porte podem-se dividir por fissão(também chamada de bipartição). As planárias reproduzem-se por reprodução assexuada através de um processo de fissão longitudinal em que cada metade regenera e forma uma nova planária.
Os platelmintos também podem realizar reprodução sexuada, sendo disso exemplo as planárias, que se unem e trocam sémen, reproduzindo-se por fecundação cruzada.[9]
As antigas classificações, actualmente consideradas parafiléticas e obsoletas do ponto de vista taxonómico, dividiam os Platyhelminthes em quatro grupos, considerados como sendo classes:[11]
Esta classificação foi há muito reconhecida como artificial[12] e em 1985 foi proposto um novo sistema de classificação, filogenicamente mais correcto, no qual o grupo Turbellaria, que era em larga escala polifilético, foi dividido numa dúzia de ordens e os grupos Trematoda, Monogenea e Cestoda foram agrupados na nova ordem Neodermata.
Apesar disso, e sem prejuízo da nova classificação (apresentada abaixo) ter obtido amplo consenso entre os taxonomistas e geneticistas, a classificação tradicional continua a ser rotineiramente utilizada em alguns campos do saber, especialmente nas ciências biomédicas e na parasitologia, excepto em artigos científicos.[5]
Os fósseis mais antigos de vermes-planos parasíticos que até agora foram identificados com confiança são ovos de um céstode encontrados num coprólito de um tubarão datado do Pérmico, mas ganchos de helmintas encontrados presos a acantódios e placodermes datados do Devoniano podem provir de platelmintas parasíticos com ciclos de vida simples.[13] O espécime mais antigo de platelminta de vida livre que se conhece é um fóssil preservado em âmbar báltico datado do Eoceno e colocado no género monotípico Micropalaeosoma como Micropalaeosoma balticus.[14] Os mais antigos espécimes de subfóssil conhecidos são ovos de Schistosoma encontrados em antigas múmias egípcias.[4]
Os Platyhelminthes apresentam um número diminuto de sinapomorfias, no caso entendidas como as características morfológicas partilhadas por todos os membros do agrupamento e que nenhum outro animal, que não seja membro dos Platyhelminthes, tenha. Esta pobreza de características distintivas torna difícil determinar tanto as relações filogenéticas com os outros grupos de animais como as relações entre os diferentes grupos que são considerados, na actual circunscrição taxonómica, membros dos Platyhelminthes.[15]
A visão taxonómica "tradicional", dominante antes da década de 1990, considerava os Platyhelminthes como o grupo irmão de todos os restantes animais com simetria bilateral, grupo que inclui, por exemplo, artrópodes, moluscos, anelídeos e cordados. Desde então, os progressos conseguidos no campo da filogenia molecular, campo de estudo que visa determinar as "árvores genealógicas" evolucionárias pela comparação das características bioquímicas de diferentes organismos, recorrendo a compostos como o DNA, o RNA e as proteínas, mudaram radicalmente essa visão e permitiram conhecer toda uma nova teia de relações evolucionárias entre espécies animais.[16]
Análises morfológicas detalhadas das características anatómicas realizadas na década de 1980 e as análises de filogenia molecular realizadas a partir do ano 2000 usando diferentes áreas do genoma (segmentos de DNA) convergem no sentido de considerar os Acoelomorpha, agrupamento que integra os Acoela (tradicionalmente considerados como turbelários muito simples[8]) e os Nemertodermatida (outro pequeno grupo anteriormente classificado entre os Turbellaria[17]) são o clado irmão de todos os outros animais com simetria bilateral, incluindo os restantes Platyhelminthes.[16][18] Contudo, um estudo publicado em 2007 concluiu que Acoela e Nemertodermatida são dois grupos distintos de Bilateria, apesar de concordar que ambos estão filogeneticamente mais próximos dos cnidários (medusas, etc.) do que os outros bilaterianos.[19]
Xenoturbella, um género de animais com simetria bilateral cujo único órgão bem definido é um estatocisto, foi originariamente classificado como um "turbelário primitivo",[20] mas foi recentemente reclassificado como um animal deuterostómico.[21][22]
Na sua actual circunscrição taxonómica, os Platyhelminthes (excluindo os Acoelomorpha) contêm dois grupos principais, Catenulida e Rhabditophora, ambos geralmente considerados como monofiléticos (cada um contém todos e apenas os descendentes de um ancestral que é membro do mesmo grupo).[18][23] As análises iniciais de filogenia molecular realizadas nos Catenulida e Rhabditophora deixaram incertezas sobre a possibilidade de combinar ambos os grupos num único grupo monofilético, mas um estudo realizado em 2008 concluiu por essa possibilidade, podendo por isso o agrupamento Platyhelminthes ser redefinido como os Catenulida mais os Rhabditophora, excluindo os Acoelomorpha.[18]
Análises de filogenia molecular mostraram que os platelmintos fazem parte do clado Spiralia. Inicialmente, considerou-se que eles formaram um clado chamado Platyzoa com Gastrotricha e Gnathifera,[16][24] mas atualmente as análises moleculares concluíram que esse clado é parafilético.[25] De acordo com análises moleculares recentes, os platelmintos estão intimamente relacionados aos nemertinos, que são vermes acelominados como os platelmintos, que por sua vez estão relacionados aos anelídeos e moluscos.[26][27][28]
Desde 1985 que se estabeleceu como consensual que um dos grupos totalmente parasíticos de Platyhelminthes (Cestoda, Monogenea e Trematoda) é monofilético e que conjuntamente estes agrupamentos formam um grupo monofilético alargado, denominado Neodermata, no qual os adultos de todos os membros apresentam neoderme, um tipo especial de derme sincícial.[29] Contudo, não existe consenso sobre a possibilidade de combinar os Cestoda e os Monogenea num grupo monofilético intermédio, os Cercomeromorpha, dentro dos Neodermata.[29][30] Também é geralmente considerado consensual que os Neodermata são um subgrupo, situado alguns níveis abaixo na "árvore genealógica", dos Rhabditophora.[18] Em consequência, o tradicional sub-filo "Turbellaria" é parafilético, pois não inclui os Neodermata paesar destes serem descendentes de um subgrupo de "turbelários".[31]
Com base nas relações acima expostas é possível estabelecer o seguinte cladograma explicitando a relação dos grupos tradicionalmente considerados como constituindo os Platyhelminthes com os restantes membros dos Bilateria:
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