Agostinho Pimenta (Ponte da Barca[1][2], 3 de maio de 1540 - Setúbal, 14 de março de 1619[3]), mais conhecido como Frei Agostinho da Cruz, foi um frade e poeta português[4]. Era filho de Catarina Bernardes Pimenta e de João Rodrigues de Araújo[5], teve onze irmãos, dos quais o mais velho foi, o poeta, Diogo Bernardes.[6][7]
Agostinho Pimenta | |
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Painel de azulejos no Convento da Arrábida | |
Nascimento | 3 de maio de 1540 Ponte da Barca |
Morte | 14 de março de 1619 (78 anos) Setúbal |
Nacionalidade | Portugal |
Ocupação | Frade e poeta |
Por volta dos catorze anos, integra a comitiva da casa do infante D. Duarte, filho de D. Duarte, quarto duque de Guimarães, e D.ª Isabel de Bragança.[4] O infante D. Duarte seria apenas um ano mais novo do que Agostinho Pimenta, pelo que ambos beneficiaram da mesma educação esmerada, rodeados de mestres e fidalgos instruídos.[8]
Com efeito, terá sido neste ambiente palaciego, que Agostinho conheceu e travou amizade com D. Álvaro de Lencastre, que viria a tornar-se no terceiro Duque de Aveiro e padroeiro do Convento de Santa Maria da Arrábida.[4][8]
Frei Agostinho da Cruz, Elegia XVI[9] | «Na ribeira do Lima fui nascido, |
Terá sido ainda nesta fase da vida que se iniciou na senda da poesia, tendo primeiro produzido versos de amor profano, os quais, por desgosto amoroso, terá acabado por queimar.[8] Com efeito, faz menção disso mesmo em versos religiosos que dedica à sua patrona, D.ª Isabel de Bragança:[8]
«Os versos que cantei importunado |
Vida de frade
Em 3 de Maio de 1560, no dia de Vera Cruz, contando com 20 anos, iniciou o noviciado, sob as ordens do Provincial, Frei Jácome Peregrino, o Tio.[10] Um ano mais tarde, quando se tornou frade arrábido, ao fazer a profissão de fé expressa e oficial, adoptou o nome Frei Agostinho da Cruz aos vinte e um anos de idade .[11]
Escreveu um poema a respeito desse momento da sua vida[12]:
“Nasci e renasci na casa em dia |
Esta profissão de fé terá sido feita às escondidas do irmão, Diogo Bernardes, que, em correspondência, manifestou o seu desgosto, por Agostinho não lhe ter contado, antes de o facto estar consumado.[13] A historiografia tem vindo a especular que Agostinho poderia ter receado que o irmão mais velho, por quem nutria grande admiração, pudesse demovê-lo de enveredar pela via religiosa.[13] Em todo o caso, há autores modernos que entendem que Diogo Bernardes, não obstante o desgosto, não se terá oposto à profissão de fé de Agostinho, tendo mantido boas relações com ele ao longo da vida.[13]
Professou no Convento de Santa Cruz, em Sintra, onde permaneceu durante cerca de quarenta e cinco anos.[14] Em 1605, no dia 19 de Março, dia de São José, foi para o Convento de São José de Ribamar, em Algés, tendo assumido o cargo de guardião.[15][16] Mais tarde, ainda nesse ano de 1605, foi autorizado pelo Provincial, Frei António da Assunção[17], a fazer vida de eremita na Serra da Arrábida. Depois de ter passado seis meses, a viver numa choupana, acabou por aceder aos pedidos do amigo de longa data, o Duque de Aveiro, que para ele mandara construir um eremitério, no âmbito do Convento da Arrábida, mudando-se para esse local e aí permanecendo durante cerca de catorze anos.[18]
Faleceu em 14 de março de 1619, na enfermaria da Anunciada (situada no bairro de Troino, em Setúbal, junto da igreja paroquial homónima).[3] O seu corpo foi sepultado no Convento da Arrábida, junto à Igreja da Arrábida, ao pé da sacristia. A sua campa foi objecto de devoção, tendo algumas gerações de devotos acorrido a ela, para lhe prestar homenagem.[19]
Motivação
No que respeita à motivação que o levou a envergar o hábito arrábido, há alguma difidência entre os historiadores.[20] Para os autores Ruy Ventura[11] e José Quadros[21], Agostinho terá ficado entusiasmado pelos relatos alusivos às virtudes e à pregação do arrábido Frei Jácome Peregrino, o Tio, e terá desejado emulá-lo.[22]
Hemetério Arantes, por seu turno, defende que Agostinho teria tomado o hábito por virtude de um desgosto amoroso, que teve na juventude.[22][23] Ao passo que outros autores, como Pires de Lima[11] e Manuel Gamito[24] desvalorizam qualquer possível desamor que o jovem Agostinho tivesse sofrido, antes sufragando a tese de que teriam sido as injustiças praticadas contra si pelos seus semelhantes, que o teriam levado a abandonar a vida mundana e a envergar o hábito de frade, como refugio. Mais concretamente, alguma grande traição ou alguma difamação grave.[20][25]
Alguns autores, como Lucília Sombreireiro e Pires Lima, do cotejo dos poemas trocados em correspondência por Agostinho Pimenta, com o irmão, Diogo Bernardes, julgam poder depreender-se que o amigo que teria traído a confiança de Agostinho, seria uma figura nobre de grande importância social na época.[26] Com efeito, Pires Lima aventa inclusive que se tratará do próprio infante D. Duarte, amigo de infância de Agostinho.[26][27]
É de ressaltar, em todo o caso, que Lucília Sombreireiro, embora reconheça que estes temas têm sido alvo de grande discussão entre os biógrafos do poeta e frade, ao longo dos anos, tende a menorizar a importância destes motivos de natureza mais mundana, defendendo, em vez disso, que a motivação principal que terá levado Agostinho a tornar-se frade, e mais tarde eremita, terá sido a vocação religiosa, que já demonstrava desde longa data.[28]
Poesia
Frei Agostinho da Cruz escreveu elegias, éclogas, odes, endechas e sonetos. As suas obras só vieram a lume no século XVIII com a publicação, em 1728, do Espelho dos Penitentes, e, em 1771, da colectânea Obras. Em 1918 foi publicada uma nova edição, por Mendes dos Remédios, incluindo alguns inéditos entretanto localizados[29].
Referências
- Cardoso, Jeronymo. «Agiologio lvsitano dos sanctos, e varoens illvstres em virtvde do Reino de Portvgal, e svas conqvistas: consagrado aos gloriosos S. Vicente, e S. Antonio, insignes patronos desta inclyta cidade Lisboa e a sev illvstre Cabido Sede Vacante, Em Lisboa, 1652- - Biblioteca Nacional Digital». purl.pt. Consultado em 14 de maio de 2022.
Jacta-se o lugar da Ponte da Barca no arcebispado de Braga de aver dado ao mundo o P. Fr. Agostinho da Cruz.
- Sombreireiro, Lucília (2012). A FIGURA DE JESUS NA POESIA DE FREI AGOSTINHO DA CRUZ (PDF). Lisboa: Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. p. 10. 127 páginas
- Sombreireiro, Lucília (2012). A FIGURA DE JESUS NA POESIA DE FREI AGOSTINHO DA CRUZ (PDF). Lisboa: Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. pp. 25–26
- Ventura, Ruy (2021). «Frei Agostinho da Cruz: um poeta para o nosso tempo». Teoliterária (23): 233–245. ISSN 2236-9937. doi:10.23925/2236-9937.2021v23p233-245. Consultado em 14 de maio de 2022
- Ventura, Ruy (2019). Antologia poética de frei Agostinho da Cruz. Évora: Licorne. 290 páginas. ISBN 978-989-8789-44-0
- Cf. Frei Agostinho da Cruz, na página do Projeto Vercial.
- VENTURA, Ruy. Frei Agostinho da Cruz : um poeta da liberdade. Versão reduzida do prefácio da antologia poética de Frei Agostinho da Cruz, editada pela Licorne, de Évora, no âmbito das comemorações centenárias do poeta.
- Sombreireiro, Lucília (2012). A FIGURA DE JESUS NA POESIA DE FREI AGOSTINHO DA CRUZ (PDF). Lisboa: Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. pp. 11–12
- Cruz (Frei), Agostinho da; Rafael, António Gil (1994). Sonetos e elegias. Lisboa: Hiena. p. 215. 270 páginas
- Sombreireiro, Lucília (2012). A FIGURA DE JESUS NA POESIA DE FREI AGOSTINHO DA CRUZ (PDF). Lisboa: Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. pp. 27–28
- Anastácio, Vanda (1 de janeiro de 2000). «FARIA, Daniel Augusto da Cunha – A vida e a conversão de Frei Agostinho: entre a aprendizagem e o ensino da Cruz. Lisboa-Braga: Faculdade de Teologia, Universidade Católica Portuguesa, 1999. 355 p., Col. Épheta». Lusitania Sacra (12): 578–580. ISSN 2182-8822. doi:10.34632/lusitaniasacra.2000.7468. Consultado em 14 de maio de 2022
- Pontes, Maria de Lourdes Belchior (1971). Os homens e os livros: séculos XVI e XVII. Lisboa: Editorial Verbo. p. 235. 240 páginas
- Sombreireiro, Lucília (2012). A FIGURA DE JESUS NA POESIA DE FREI AGOSTINHO DA CRUZ (PDF). Lisboa: Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. p. 45-50
- Sombreireiro, Lucília (2012). A FIGURA DE JESUS NA POESIA DE FREI AGOSTINHO DA CRUZ (PDF). Lisboa: Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. p. 18. 127 páginas
- Piedade, José de Jesus Maria Antonio da (1737). Espelho de Penitentes, e Chronica da Provincia de Santa Maria da Arrabida, da regular, e mais estreita Observancia da Ordem do Serafico Patriarcha S. Francisco, no Instituto Capucho,... por seu author Fr. Antonio da Piedade,... Lisboa: na officina de Joseph Antonio Da Sylva
- Sombreireiro, Lucília (2012). A FIGURA DE JESUS NA POESIA DE FREI AGOSTINHO DA CRUZ (PDF). Lisboa: Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. pp. 20, 50–51
- Sombreireiro, Lucília (2012). A FIGURA DE JESUS NA POESIA DE FREI AGOSTINHO DA CRUZ (PDF). Lisboa: Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. p. 66. 127 páginas
- Sombreireiro, Lucília (2012). A FIGURA DE JESUS NA POESIA DE FREI AGOSTINHO DA CRUZ (PDF). Lisboa: Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. p. 20; 66-68. 127 páginas
- Sombreireiro, Lucília (2012). A FIGURA DE JESUS NA POESIA DE FREI AGOSTINHO DA CRUZ (PDF). Lisboa: Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. p. 27. 127 páginas
- Sombreireiro, Lucília (2012). A FIGURA DE JESUS NA POESIA DE FREI AGOSTINHO DA CRUZ (PDF). Lisboa: Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. p. 32. 127 páginas
- Mesquita Quadros, José Caetano (1794). Vida do Venerável Padre Frei Agostinho da Cruz. Lisboa: Régia Officina Typographica. p. 4
- Sombreireiro, Lucília (2012). A FIGURA DE JESUS NA POESIA DE FREI AGOSTINHO DA CRUZ (PDF). Lisboa: Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. p. 35. 127 páginas
- ARANTES, Hemetério (1909). Frei Agostinho da Cruz: Notas à margem d’uma História Quinhentista,. Lisboa: Guimarães & C.ª. p. 34
- GAMITO, Manuel (14 de março de 1940). «"O segredo de Frei Agostinho"». Anuário Oficinas Gráficas. A Indústria: 1.
«no espírito de Agostinho a crise que o determinou a deixar a vida do século e a refugiar-se na paz claustral, fugindo do mundo e dos homens, em busca da verdadeira liberdade, (…) O poeta deve ter sido difamado, vencido, perseguido, desprezado, abatido injustamente»
- Mesquita Quadros, José Caetano (1794). Vida do Venerável Padre Frei Agostinho da Cruz. Lisboa: Régia Officina Typographica. p. 3
- Sombreireiro, Lucília (2012). A FIGURA DE JESUS NA POESIA DE FREI AGOSTINHO DA CRUZ (PDF). Lisboa: Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. pp. 35–38
- Lima, Augusto C. Pires de (1941). Poesias Selectas de Frei Agostinho da Cruz. Lisboa: Domingos Barreira. 187 páginas. ASIN B06XWKLMPR
- Sombreireiro, Lucília (2012). A FIGURA DE JESUS NA POESIA DE FREI AGOSTINHO DA CRUZ (PDF). Lisboa: Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. pp. 33,35–38,40–41,44.
Na nossa modesta opinião, reside neste Amor a Jesus Crucificado, neste Amor à Santa Cruz a verdadeira razão que levou Agostinho Pimenta a abandonar-se às coisas do alto em detrimento das coisas do mundo.
- CRUZ, Frei Agostinho. Obras de Frei Agostinho da Cruz, com prefácio e notas de Mendes dos Remédios. Coimbra: França Amado, 1918. Conforme a edição impressa de 1771 e os códices manuscritos das bibliotecas de Coimbra, Porto e Évora. Cf. ficha bibliográfica na PORBASE: Base de Dados Bibliográfica Nacional.
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