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Biota do período Ediacarano (635 a 542 milhões de anos) Da Wikipédia, a enciclopédia livre
Entende-se por Biota Ediacarana (anteriormente Vendiana), um enigmático conjunto de seres de aspecto tubular e sésseis em forma de fronde (estacionários) que viveram durante o Período Ediacarano (ca.635-542 Ma). Como até recentemente o nome do Período Ediacarano era Vendiano, também se usa a denominação Biota Vendiana. Além disso, boa parte dos seres em questão assemelham-se a animais primitivos, sendo comuns os termos Fauna Ediacarana e Fauna Vendiana. No entanto, como a classificação destes seres é incerta, biota é um termo mais apropriado do que fauna para designar o seu conjunto. Já o conceito de "Biota Ediacarana" é um pouco artificial, pois não pode ser geograficamente, estratigraficamente, tafonicamente nem biologicamente definido.[1]
Vestígios fósseis destes seres têm sido encontrados em todo o mundo, pensando-se que representavam os mais antigos organismos multicelulares complexos conhecidos. Apesar de seres multicelulares simples, tais como algas vermelhas já se terem desenvolvido há pelo menos 1200 Ma, recentemente foram descobertos macrofósseis de seres multicelulares com cerca de 2100 Ma,[2][3] Os antepassados da Biota Ediacarana têm a sua origem enquanto a Terra se debatia com as extensas glaciações do período Criogeniano, tendo surgido pela primeira vez há cerca de 580 Ma e florescido até ao seu desaparecimento quase completo durante o rápido aumento de biodiversidade conhecido como explosão cambriana, há 542 Ma atrás. Apesar de alguns fósseis raros que parecem representar sobreviventes destes seres terem sido datados tão recentemente como o Câmbrico Médio (510-500 Ma), as comunidades fósseis primitivas desaparecem do registo no final do Ediacarano, deixando para trás apenas esporádicos fragmentos de outrora ricos ecossistemas.[4] A maioria dos planos corporais actualmente existentes nos animais aparecem pela primeira vez nos registos fósseis do Câmbrico, tendo a Biota Cambriana substituído completamente os organismos que dominavam o registo fóssil ediacarano. Várias hipóteses tentam explicar o seu desaparecimento, incluindo amostragem polarizada, um ambiente em mudança, o advento de predadores e competição com outras formas de vida mais adaptadas.
A determinação do lugar destes organismos na árvore filogenética tem-se demonstrado impossível. A morfologia e hábito de alguns taxa (e.g. Funisia dorothea) sugere relações com os actuais Porifera e Cnidaria,[5] Kimberella parece mostrar similaridades com os moluscos, e outros organismos são suspeitos de demonstrar simetria bilateral, apesar disto ser controverso. A maioria dos fósseis macroscópicos são morfologicamente diferentes de formas de vida mais recentes: assemelham-se a discos, tubos, sacos cheios de lama ou mantos acolchoados. Devido à dificuldade na dedução de relações evolucionárias entre estes organismos, alguns paleontologistas sugerem que estes representam linhagens completamente extintas que não se assemelham a nenhum ser vivo actual. Um paleontologista sugeriu uma categoria taxonómica separada para estes seres ao nível hierárquico do reino, denominada Vendozoa, entretanto renomeada Vendobionta.[6] Se de facto estes organismos enigmáticos não deixaram descendência, as suas estranhas formas podem ser vistas como uma experiência falhada da vida multicelular, com uma re-evolução posterior e independente do multicelularismo a partir de organismos unicelulares não relacionados.[7] No entanto, um estudo de 2018 confirmou que um dos fósseis mais proeminentes e icónicos do período, Dickinsonia, incluía traços de colesterol, o que limita as suas afinidades com as dos animais.[8]
Os primeiros fósseis ediacaranos descobertos foram os de um ser em forma de disco, Aspidella terranovica, em 1868. O seu descobridor, A. Murray, um prospector geológico, utilizou-os como marcadores na correlação da idade de rochas na Terra Nova.[9] No entanto, uma vez que se dispunham abaixo da camada sedimentar conhecida como Estrato Primordial, o estrato câmbrico que se julgava na altura conter os primeiros vestígios de vida, só quatro anos após a sua descoberta alguém se atreveu a propôr que estes vestígios podiam corresponder a fósseis. A proposta de Elkanah Billings foi rejeitada pelos seus pares, devido às suas formas simples, tendo sido consideradas estruturas formadas devido ao escape de gases, concreções inorgânicas e, até mesmo, truques colocados por um Deus maldoso a querer semear a descrença.[9] Na altura, não eram conhecidas mais estruturas semelhantes noutros pontos do globo, e o enviesado debate depressa resvalou para a obscuridade[9] Em 1933, Georg Gürich descobriu espécies na Namíbia.[10] No entanto, a crença firme de que a vida tinha tido origem no Câmbrico levou a que tivessem sido atribuídos a este período. Em 1946, Reg Sprigg noticia a existência de fósseis de medusas nos Montes Ediacara na cordilheira australiana dos Montes Flinders,[11] tendo, no entanto, sido considerados do início do Câmbrico, pelo que apesar da descoberta ter despertado algum interesse, não cativou nenhuma atenção séria.[carece de fontes]
Foi apenas após a descoberta britânica da icónica Charnia, em 1957, que se considerou seriamente a possibilidade do Pré-Câmbrico conter vida. Este fóssil em forma de fronde foi descoberto na Floresta de Charnwood, Inglaterra,[12] e devido à detalhada carta geológica da British Geological Survey, não existiam dúvidas de que estes fósseis se encontravam em rochas pré-cambrianas. O paleontólogo Martin Glaessner fez, finalmente, a ligação entre este e achados anteriores,[13][14] que combinando com uma melhor datação de espécimes existentes e um novo fulgor na procura, levou a que novos aspectos fossem reconhecidos.[15]
No entanto, todos os espécimes descobertos até 1967 estavam preservados em arenito de grão grosso, que impedia a preservação dos detalhes mais delicados, tornando a sua interpretação difícil. A descoberta, por S.B. Misra, de camadas de cinza vulcânica fossilífera em Mistaken Point, Terra Nova, mudou tudo isto, uma vez que os detalhes mais ínfimos tinham sido preservados na cinza fina, permitindo a descrição de pormenores até então invisíveis.[16][17]
A fraca comunicação, combinada com a dificuldade em correlacionar formações geológicas globais distintas, levou a uma miríade de diferentes denominações da Biota. Em 1960, o nome francês Ediacarien - a partir dos Montes Ediacara na Austrália Meridional, cujo nome provém do aborígene Idiyakra, ("a água está presente") - foi adicionado aos termos concorrentes Siniana e Vendiana,[18] para as rochas do final do Pré-Câmbrico, nomes também aplicados às formas de vida dessa altura. Ediacarana e Ediacariana foram, subsequentemente, aplicadas à época ou período de tempo geológico e rochas correspondentes. Em Março de 2004, a União Internacional de Ciências Geológicas acabou com as inconsistências, nomeando formalmente o período terminal do Neoproterozóico com o nome da localidade australiana.[19]
Praticamente todo o registo fóssil consiste na robusta fracção esquelética de corpos decompostos, pelo que, o facto de seres de corpo mole e sem esqueleto como a Biota Edacariana ter deixado vestígios abundantes, é surpreendente. A ausência de criaturas escavadoras e decompositoras vivendo nos sedimentos foi, sem dúvida, de grande importância;[20] após a evolução deste tipo de organismos no Câmbrico, impressões de seres de corpo mole passaram a ser normalmente perturbadas antes de poderem fossilizar.[carece de fontes]
Os tapetes microbianos são porções de sedimentos estabilizadas pela presença de colónias de microorganismos, que segregam fluidos pegajosos ou ligam as partículas sedimentares de outra forma. Parecem movimentar-se em direcção à superfície quando cobertas por uma fina camada de sedimento, no entanto esta é uma ilusão criada pelo crescimento da colónia; os indivíduos, em si, não possuem capacidade de locomoção. Se for depositada uma camada demasiado espessa de sedimento, antes do tapete poder crescer e se reproduzir através dela, partes da colónia morreram, deixando para trás fósseis com uma textura tipicamente enrugada e tubercular (tipo pele de elefante).[21]
Alguns estratos ediacarianos com a textura típica dos tapetes microbianos contêm fósseis e os fósseis ediacarianos quase nunca são descobertos em leitos que não contenham estes tapetes. Apesar dos tapetes terem sido muito abundantes na época, o desenvolvimento de organismos herbívoros no Câmbrico reduziu fortemente o seu número e abundância,[22] sendo que estas comunidades estão actualmente limitadas a refúgios inóspitos, onde os predadores não sobrevivem tempo suficiente para as consumir.[carece de fontes]
A preservação destes fósseis é um dos enigmas científicos mais fascinantes da ciência. Pelo facto de serem organismos de corpo mole, sem estruturas esqueléticas, normalmente não fossilizariam. Ao contrário de outras formas de vida de corpo mole mais recentes (como as do folhelho Burgess ou o calcário de Solnhofen) os organismos ediacaranos não estavam localizados em ambientes restritos sujeito a condições locais pouco normais; eram pois um fenómeno global. Portanto, os processos que intervieram na fossilização terão sido sistemáticos e ocorrido em todo o mundo. Além disso, outro factor muito diferente do ocorrido com outras Biota deverá ter permitido a conservação destas criaturas delicadas. Pensa-se que os fósseis foram preservados devido à sua rápida cobertura com cinza ou areia, aprisionando os organismos contra a lama ou tapetes microbianos em que viviam.[23] Os leitos de cinza proporcionam mais detalhes fósseis e podem ser mais fácil e rapidamente datados com uma margem de erro de um milhão de anos, ou melhor, através de datação radiométrica.[24]
No entanto, é mais comum encontrar fósseis ediacaranos sob estratos arenosos depositados por tempestades ou outros eventos naturais de extremamente fortes, como correntes oceânicas de turbidez profunda que arrastavam as camadas superficiais do fundo marinho, dando origem a turbiditos.[23] Os organismos de corpo mole quase nunca fossilizam durante estes eventos, mas a presença nessa altura de tapetes microbianos a uma escala global, auxiliou, provavelmente, na sua preservação através da estabilização das impressões dos organismos no sedimentos em que se encontravam depositados.[25]
A taxa de cimentação do substrato superior em relação à taxa de decomposição do organismo determina qual a superfície deste que é conservada, se a superior, se a inferior. A maioria dos fósseis em forma de disco decompuseram-se antes do sedimento ter cimentado, tendo a cinza ou a areia preenchido o vazio, deixando um molde da parte inferior do ser. Pelo contrário, fósseis acolchoados tenderam a se decompor após a cimentação do sedimento superior; desta forma as suas partes superiores são preservadas. A sua natureza mais resistente está patente no facto de em raras ocasiões, fósseis acolchoados serem encontrados em leitos de tempestade, em que a sedimentação de elevada energia não os destruiu da mesma forma que teria feito aos menos resistentes discos. Além disso, em alguns casos, a precipitação bacteriana de minerais formou uma máscara mortuária, criando um molde do organismo.[26]
Formas de fósseis ediacaranos | |
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Tateana inflata (= Cyclomedusa radiata) é o disco de anexamento de um organismo desconhecido. | |
Um molde da acolchoada Charnia, a primeira forma de organismo complexo pré-cambriano aceite. Charnia foi em tempos interpretada como um antepassado dos corais da ordem Pennatulacea. | |
Spriggina, um possível precursor das trilobites ou um membro dos anelídeos ou ainda um variante do Charnia, talvez um dos predadores que levou à diminuição da Biota Ediacarana[27][28][29] e subsequente diversificação de animais.[30] | |
Um rasto fóssil do final do Ediacarano, preservado num leito sedimentar. | |
Uma cadeia de fósseis vestigiais criada pela alimentação de uma Yorgia, terminando com o corpo do próprio animal (direita). |
A Biota Ediacarana exibia um vasto leque de características morfológicas. O seu tamanho variava entre alguns milímetros a alguns metros; apresentavam uma complexidade desde uma bolha a detalhadamente intricada; rigidez de resistente e forte a mole como gelatina. Quase todas as formas de simetria estavam presentes.[23] Estes organismos diferiam de fósseis anteriores por apresentarem uma construção multicelular organizada e diferenciada, com tamanhos superiores ao centímetro.[carece de fontes]
Estas formas morfológicas podem ser agrupadas em:
A classificação da Biota Ediacarana é difícil, e existem várias hipóteses em relação ao seu posicionamento na árvore filogenética.
Uma vez que os eumetazoários - animais multicelulares com tecidos - mais primitivos são os cnidários, a primeira tentativa de categorizar estes fósseis passou por designá-los como medusas e corais.[63] No entanto, o estudo detalhado dos seus padrões de crescimento colocou de lado esta hipótese.[64][65]
Em 1984, Martin Glaessner propôs no seu livro The dawn of animal life ("A alvorada da vida animal"), que a Biota Ediacarana era reconhecida como antepassados dos filos animais modernos, parecendo, no entanto, estranha a estes pelo facto das características utilizadas para as classificações modernas ainda não terem evoluído.[66] Adolf Seilacher respondeu a esta afirmação sugerindo que o Ediacarano assistiu à usurpação dos animais aos protistas gigantes como a forma de vida dominante.[67]
Em 1986 Mark McMenamin afirmou que estes seres não possuíam um estágio embriónico, por isso não poderiam ser animais. Ele acreditava que tinham evoluído independentemente um sistema nervoso e cérebro, significando que "o caminho em direcção à vida inteligente foi trilhado mais do que uma vez neste planeta", apesar desta ideia não ser fortemente aceite.[39]
No seu trabalho mais famoso, Seilacher sugere que os organismos ediacaranos representavam um grupo único e extinto de formas relacionadas que descendiam de um ancestral comum (clado), formando um reino denominado Vendozoa,[68][69] assim chamado devido à actualmente obsoleta denominação de era Vendiana. Mais tarde, excluiu os fósseis identificados como metazoários e renomeou o conjunto como filo Vendobionta.[carece de fontes]
Descreveu os Vendobionta como cnidários acolchoados, que não possuíam cnidócitos. Esta ausência é contrária ao actual método de alimentação dos cnidários, pelo que Seilacher sugeriu que poderão ter sobrevivido através de simbiose com organismos fotossintéticos ou quimioautotróficos.[70]
A hipótese de Gregory Retallack de que os organismos ediacaranos seriam líquenes[71] não conseguiu granjear muitos adeptos.[72][73] É sustentado que os fósseis não estavam tão achatados como medusas fossilizadas em condições semelhantes, e que o seu relevo estava mais próximo do de madeira petrificada. Retallack afirma que as paredes quitinosas das colónias de líquenes fornecem resistências à compactação, e ainda que o grande tamanho dos organismos - por vezes com mais de um metro, muito maior que alguma das galerias preservadas - é contrária a uma classificação conjunta com os animais.[carece de fontes]
Quase todos os filos existentes já foram utilizados em determinada altura para acomodar a Biota Ediacarana,[74] desde as algas,[75][76] até aos eucariontes unicelulares conhecidos por foraminíferos,[77] passando pelos fungos,[78] bactérias ou colónias microbianas[40] e intermediários hipotéticos entre plantas e animais.[79]
Foram precisos quase 4000 milhões de anos desde a formação da Terra para que os fósseis do Ediacarano surgissem pela primeira vez, há 655 Ma. Apesar da identificação de prováveis fósseis com 3460 Ma,[80][81] a primeira evidência sem margem para dúvidas de vida é encontrada há 2700 Ma,[82] sendo que há 1200 Ma já existiam, certamente células nucleadas[83]. Assim sendo, por que razão as formas com um grau de organização ao nível do Ediacarano levaram tanto tempo a surgir?[carece de fontes]
Poderá ser desnecessária qualquer explicação especial: pura e simplesmente o processo evolutivo necessitou de 4000 Ma para acumular as adaptações necessárias. De facto, parece existir um ligeiro incremento no nível máximo de complexidade observado ao longo deste tempo, com mais e mais formas de vida complexas evoluindo à medida que o tempo avança, com os vestígios de vida semi-complexa antiga, como a Nimbia, encontrada na formação Twitya com 610 Ma,[84] mostrando, provavelmente, a morfologia mais complexa da sua época.[carece de fontes]
A corrente alternativa de pensamento sugere que apenas não era vantajoso ser grande até ao aparecimento dos ediacaranos: O meio ambiente favoreceu os tamanhos pequenos em relação aos grandes. Exemplos actuais de tais cenários incluem o plâncton, cujo tamanho pequeno lhe permite uma reprodução rápida de forma a tirar partido da abundância efémera de nutrientes, formando explosões de algas. No entanto, para que o tamanho grande nunca fosse favorável, o ambiente teria de ser drasticamente diferente.[carece de fontes]
Um dos factores primários limitantes do tamanho é a quantidade de oxigénio atmosférico. Sem um sistema circulatório complexo, baixas concentrações de oxigénio não conseguem atingir o centro de um organismo com rapidez suficiente que lhe permita sustentar as suas necessidades metabólicas.[carece de fontes]
Na jovem Terra, elementos reactivos como o ferro e o urânio existiam numa forma reduzida; estes iriam reagir com qualquer oxigénio livre produzido por organismos fotossintetizantes. O oxigénio não conseguiria acumular-se na atmosfera até que todo o ferro, bem como qualquer outro mineral reactivo, tivesse oxidado (enferrujado), produzindo formações de ferro em banda.[carece de fontes]
Donald Canfield detectou registos das primeiras quantidades significantes de oxigénio atmosférico mesmo antes do aparecimento dos primeiros fósseis ediacaranos,[85] sendo a presença deste em grandes quantidades na atmosfera considerado um possível despoletador da radiação do Ediacarano.[86] O oxigénio parece ter-se acumulado em dois picos; o aparecimento de criaturas pequenas e sésseis (estacionárias) parece correlacionar-se com o primeiro pico, enquanto criaturas maiores e móveis parecem ter surgido aquando do segundo pico.[87] No entanto, as premissas relacionadas com a reconstrução da composição atmosférica têm atraído algum criticismo, devido ao facto da anoxia global (diminuição do oxigénio) ter tido pouco impacto na vida durante alguns eventos ocorridos no início do Câmbrico e no Cretáceo.[88]
Tem também sido sugerido que períodos de intenso frio podem ter constituído uma barreira à evolução de vida multicelular. Os embriões mais antigos conhecidos, provenientes da Formação Doushantuo na China, aparecem apenas alguns milhões de anos após a Terra ter saído de uma glaciação global, sugerindo que a cobertura de gelo e oceanos frios podem ter evitado o surgimento de organismos multicelulares.[89] Vida multicelular complexa pode ter potencialmente evoluído antes destas glaciações, tendo sido posteriormente exterminada. No entanto, a diversidade de vida existente na moderna Antárctida tem desencadeado desentendimentos quanto ao facto de as temperaturas baixas aumentarem ou diminuírem a taxa evolutiva.[carece de fontes]
No início de 2008, uma equipa analisou um leque de estruturas corporais básicas ("disparidade") de organismos ediacaranos, provenientes de diferentes sítios fosssilíferos: Avalon no Canadá (575 Ma - 565 Ma); Mar Branco na Rússia (560 Ma - 550 Ma); e Nama na Namibia (550 Ma - 542 Ma), imediatamente antes do início do Câmbrico. Descobriram que, apesar da colecção do Mar Branco possuir o maior número de espécies, não existia uma diferença significativa na disparidade entre os três grupos, concluindo-se assim que antes do início do período de tempo correspondente à colecção de Avalon, estes organismos devem ter passado pela sua própria "explosão" evolucionária, semelhante à famosa explosão câmbrica.[90]
A baixa resolução do registo fóssil leva a que o desaparecimento da Biota Ediacarana permaneça envolto em algum mistério. Parece ter ocorrido um desaparecimento relativamente abrupto no final do período Ediacarano, sendo que relatos de organismos ediacaranos durante o período Câmbrico são universalmente aceitas. A causa, bem como a realidade, sobre este desaparecimento está aberta a debate.[carece de fontes]
O súbito desaparecimento de fósseis do tipo ediacarano na fronteira com o Câmbrico poderá acontecer devido a pura e simplesmente as condições ambientais terem deixado de favorecer a sua fossilização, tendo os organismos continuado a florescer, apesar de não serem fossilizados.[21] No entanto, se estes fossem comuns, seria esperado que mais exemplares do que um espécime ocasional[4] em conjuntos fossilíferos excepcionalmente bem preservados (Lagerstätte), tais como os sítios Folhelho Burgess e Folhelhos Maotianshan[91] (a menos que tais sítios fossíferos representem um ambiente que os organismos ediacaranos nunca habitaram, ou que não possuísse condições favoráveis à sua preservação.[carece de fontes]
É sugerido que por volta do início do Câmbrico, os tapetes microbianos tenham desaparecido em larga escala devido à alimentação por parte de organismos de um nível acima na cadeia alimentar da época. Se estes herbívoros tiverem aparecido pela primeira vez aquando do início do declínio da Biota Ediacarana, isso pode, então, sugerir que esses seres terão levado à destruição do substrato microbiano, levando ao descolamento e destacamento dos organismos fixos neste e à consequente desestabilização do ecossistema, causando a extinção da biota ediacarana.[carece de fontes]
Alternativamente, novos animais com esqueleto poderão ter-se alimentado directamente dos relativamente indefesos organismos ediacaranos.[39]
No entanto, se a interpretação da ediacarana Kimberella como um possível ser que "pastava" for correcta, isto sugere que a Biota já teria sido exposta, de forma limitada, à predação.[48] Apesar disso existem muito poucas evidências de rastos de alimentação por pastoreio no Ediacarano, o que fornece pouco suporte à teoria da pastagem activa neste período. Além disso, a alvorada do Câmbrico é definida pelo aparecimento global deste tipo de rastos em colecções fósseis, muito diferentes das existentes no Período Ediacarano.[carece de fontes]
É possível que o aumento da competição, devido à evolução de inovações-chave no seio de outros grupos, talvez como uma resposta a predação,[20] tenha afastado a Biota Ediacarana dos seus nichos ecológicos.[carece de fontes]
No entanto, este argumento não tem explicado com sucesso fenómenos semelhantes. Por exemplo, a "exclusão competitiva" dos braquiópodes pelos moluscos bivalves foi eventualmente o resultado coincidente de duas tendências não relacionadas com a competição entre grupos[92]
Apesar de ser difícil inferir os efeitos de alterações planetárias nos organismos, comunidades e ecossistemas da época, a verdade é que grandes mudanças ocorreram entre o final do Pré-cambriano e o início do Câmbrico. A fragmentação de supercontinentes,[93] aumentos do nível do mar que levaram à criação de mares costeiros pouco profundos e "convidativos" à vida,[94] uma crise de nutrientes,[95] flutuações na composição atmosférica, incluindo nos níveis de oxigénio e dióxido de carbono,[96] e alterações na química dos oceanos[97] (levando à promoção da biomineralização[98]), poderão ter tomado parte na extinção.
Escala do eixo: há milhões de anos, datação por U / Pb de zircões. |
A biota macroscópica da metade superior do Período Ediacarano, caracterizada por vendobiontes e possíveis animais, pode ser dividida em amplas assembleias, cada uma representando inovações evolutivas importantes. São conhecidos fósseis ediacaranos em vinte e cinco localidades de todo o mundo e numa grande variedade de condições de deposição ("acumulação"),[19] pelo que são geralmente agrupados em três tipos principais (assembleias ou grupos), que recebem o nome das localidades que lhes são comuns. Cada conjunto tende a ocupar a sua própria região de "morfoespaço" e, depois de um impulso inicial de diversificação, não sofreram grandes alterações durante o restante período em que viveram.[100]
A assembleia Avalon define-se com relação ao sítio de Mistaken Point, em Terra-Nova e Labrador, no Canadá, o primeiro local onde foi identificado um grande número de fosséis ediacaranos.[101] O agrupamento é facilmente datado a partir das várias camadas finas de cinza, uma excelente fonte de zircão, utilizado no método de datação radiométrica de urânio-chumbo. Estas finas camadas de cinza também preservam detalhes muito delicados. Os membros deste biota particular aparentemente sobreviveram até à extinção de todos os organismos ediacaranos, no início do câmbrico.[100]
Os organismos incluem rangeomorfos das profundidades subaquáticas, como Charnia, que compartilham um ciclo de crescimento fractal.[102] É provável que se tenham conservado in situ (ou seja, que o seu local não se alterou depois de mortos), muito embora esta premissa não possua aceitação universal. Esta associação, apesar de ser menos diferente que a do tipo Ediacara ou Nama, assemelha-se às comunidades carboníferas de alimentação por suspensão, o que pode sugerir a presença de alimentação por filtração,[103] pois segundo a maioria das interpretações os organismos encontravam-se em águas demasiado profundas para que fosse possível a fotossíntese. A baixa diversidade pode reflectir a profundidade em que se encontravam — que limitaria as probabilidades de especiação — ou, por outro lado, o conjunto poderia simplesmente ser demasiado novo para a presença de uma grande biodiversidade. A opinião científica geral está dividida entre estas duas hipóteses.[99]
A assembleia Ediacara deve o seu nome às colinas de Ediacara (Austrália), e consiste em fósseis preservados nos fácies de fozes de rios (feixes prodeltaicos). Costumam encontrar-se em solo gipsífero e no paleossolo formados em depósitos de loess e inundações num árido e fresco paleoclima temperado.[104] A maioria dos fósseis estão preservados como pegadas imprimidas em camadas microbianas,[105] mas alguns estão preservados "dentro de" camadas de grãos de areia.[99][100]
A assembleia de Nama é melhor representada na jazida paleontológica de Nama, na Namíbia. O tipo de fósseis mais comum consiste numa conservação tridimensional, com organismos preservados em leitos arenosos com camadas interiores. Dima Grazhdankin acredita que estas formas representam organismos escavadores,[43] enquanto que Guy Narbonne sustenta a possibilidade de que viviam na superfície.[106] Estas camadas encontram-se no meio de unidades que compreendem arenitos, limolitos e xistos, além de capas microbianas que, quando presentes, costumam conter fósseis. O ambiente é interpretado como bancos de areia formados na boca dos defluentes de um delta fluvial.[99]
Na região do mar Branco, na Rússia, foram encontrados os três tipos de assembleias em lugares muito próximos. Este facto, somado ao considerável solapamento no tempo dos organismos, faz com que seja improvável que representem estádios evolutivos ou comunidades distintas no tempo. Dado que se encontram por todo o mundo — em todos os continentes excepto na Antártida — os limites geográficos não parecem ter influência;[107] encontram-se os mesmos fósseis a todas as paleolatitudes (a latitude em que se formou o fóssil, tendo em conta a deriva continental) e em diferentes bacias sedimentares.[99]
O mais provável é que as três assembleias representem organismos adaptados para sobreviver em ambientes diferentes, e que qualquer padrão aparente em diversidade ou em idade não seja mais que uma impressão causada pelos poucos exemplares descobertos, pois as assembleias fossilíferas ediacaranas são muito escassas. Como os organismos ediacaranos representam um estádio primitivo na história da vida pluricelular, não é de admirar que não estejam representados todos os diferentes modos de vida.[99] Calculou-se que, dos noventa e dois modos de vida potencialmente possíveis (combinações do modo de alimentação, posição na cadeia trófica, mobilidade...), apenas uma dúzia estavam preenchidos em finais do ediacarano. Na assembleia de Avalon só se encontram quatro.[108] A falta de predadores a grande escala e a escavação vertical são provavelmente os factores mais importantes que limitavam a diversidade ecológica; o aparecimento destas durante o período cambriano inferior permitiu que o número de modos de vida preenchidos aumentara para trinta.[109]
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