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Esterilização compulsória ou esterilização forçada refere-se à esterilização cirúrgica sem consentimento prévio do paciente.
Na primeira metade do século XX muitos programas desse tipo foram instituídos em vários países do mundo, usualmente como parte de programas eugénicos,[1] cuja intenção era de prevenir a reprodução de pessoas portadoras de características genéticas indesejadas. Logo a prática foi aplicada a doentes e deficientes mentais. A ideia de que pacientes mentais eram desprovidos de razão e, portanto, não tinham direito a opinar sobre sua vida e tratamento legitimou vários abusos.[2]
Mais recentemente, o ex-presidente do Peru, Alberto Fujimori, foi acusado de promover a esterilização forçada de homens e mulheres, notadamente indígenas e pobres, durante o seu governo. Em julho de 2002, o Ministério da Saúde peruano tornou público um relatório, segundo o qual, entre 1990 e 2000, 331 600 mulheres foram esterilizadas, enquanto 25 590 homens haviam sido submetidos a uma vasectomia. "Essas pessoas foram envolvidas”, destaca o relatório, "seja por meio de pressões, de chantagem ou de ameaças, seja por meio da oferta de alimentos, sem que fossem devidamente informadas, o que as impediu de tomarem uma decisão com real conhecimento de causa."[3][4]
Nos Estados Unidos, um programa de planejamento familiar, patrocinado pelo Estado, resultou na esterilização forçada de 3,4 mil mulheres indígenas, somente nos anos 1970.[5] "Muita gente associa a palavra 'eugenia' aos nazistas e ao Holocausto. Mas isso está errado. Na verdade, Hitler aprendeu com o que os EUA haviam feito", afirmou Daniel Kevles, historiador da ciência da Universidade de Yale.[6]
No caso das pessoas com deficiência, e apesar de não existirem dados estatísticos, indicam os activistas, associações e organizações que trabalham na área das pessoas com deficiência que estas práticas são sofridas sobretudo por mulheres.[7][8]
A prática de esterilização compulsória em pessoas com deficiência viola a Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência, ratificada por Portugal em 2009 e a Convenção de Istambul, ratificada por Portugal pelo Decreto do Presidente da República n.º 13/2013, de 21 de Janeiro, e com entrada em vigor a 1 de agosto de 2014.[9][10][11] Contudo, dentre os 27 países da União Europeia, em 2023, apenas nove ilegalizaram esta prática e três, dos 27 países, ainda autorizam a esterilização de menores com deficiência, sendo Portugal (juntamente com a República Checa e a Hungria) um deles.[7][12]
A nível legislativo, a Lei 3/84 que regulava a esterilização voluntária em indivíduos maiores de 25 anos nada mencionava sobre a prática a adoptar no caso da pessoa com deficiência mental, contrariamente ao que já acontecia noutros países europeus. Por sua vez, em 2008, havia sido publicado um artigo médico sobre a prática da esterilização em adolescentes com patologia neurológica, num hospital materno-infantil entre 1998 e 2007 e identificou-se a existência desta prática nas pacientes, mas não se refere se existiu ou não autorização judicial, conforme definia a lei portuguesa.[10]
Em 2016, este tema é abordado em Portugal, na sequência da divulgação de um relatório das Nações Unidas que pretendia avaliar os direitos fundamentais das pessoas com deficiência neste país e que teve por base um conjunto de informações prestadas, em 2012, pelo Governo português e mais tarde completado com informações do Observatório da Deficiência e Direitos Humanos e de organizações da sociedade civil. Nesse relatório referia-se que as pessoas com deficiência continuavam a ser alvo desta prática por parte, por exemplo, de algumas instituições, e era aplicada sobretudo nas pessoas com deficiência declaradas como legalmente incapacitadas. Era referido a inexistência de uma lei específica que enquadrasse a esterilização de pessoas com deficiência, tendo sido sugerido ao Estado português a adopção de medidas que permitissem à pessoa com deficiência exercer o direito ao consentimento livre, prévio e informado de tratamentos médicos. À data, a Ordem dos Médicos portuguesa, indicava que não tinha conhecimento de quaisquer situações de esterilização forçada e que se existissem seriam pouco frequentes. A Associação Portuguesa de Bioética tinha a mesma opinião e considerava as afirmações presentes no relatório exageradas, indicando que o Programa Nacional de Saúde Reprodutiva já previa outras práticas alternativas, como a contracepção hormonal injectável ou implante.[11][10][12]
Face à inexistência de dados estatísticos por parte das autoridades portuguesas, apesar de Portugal ser o primeiro país da União Europeia a iniciar, em 2023, uma recolha de dados sobre esterilizações forçadas, no âmbito de um estudo sobre a violência contra pessoas com deficiência, estas práticas são sobretudo conhecidas e relatadas por ativistas, como sejam Mayne Benedetto, Rita Serra e Sara Rocha, ou por organizações de pessoas com deficiência.[7][12] Assim, as práticas que são reportadas referem-se sobretudo a inexistência de consentimento por parte da pessoa com deficiência. A lei portuguesa define a obrigatoriedade do consentimento, sendo este um processo que tem diferentes fases e devia ser especifíco para as diversas deficiências.[10][12] O consentimento tem como premissa a informação (consentimento informado) pelo que paciente devia ser conhecedor de forma clara e inequívoca do procedimento que vai ser executado e das suas consequências. Contudo, há relatos que indicam que o mesmo aconteceu no âmbito de outras operações cirúrgicas ou cujos relatórios médicos indicam que a operação foi ao apêndice, por exemplo, e não uma esterilização. No caso da pessoa com deficiência muitas vezes é o cuidador, quer de menores ou de adultos com deficiência, que pressionam a esterilização, ou que tomam a decisão pela pessoa com deficiência. Contudo, e de acordo com o Código Deontológico da Ordem dos Médicos, a Entidade Reguladora da Saúde em Portugal e um parecer do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, há a necessidade de existir o prévio consentimento judicial. Todavia, este consentimento judicial muitas vezes não é aplicado, porque os cuidadores são os tutores legais da pessoa com deficiência no caso de ter existido interdição judicial, apesar de, na opinião de alguns juristas, face à matéria em causa, os tutores não poderem tomar esta decisão sozinhos.[10][12][13]
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