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O Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores (EPARAA) é um diploma legal de natureza para-constitucional que enquadra o regime de autonomia constitucional dos Açores, definindo as competências próprias da administração regional autónoma e a estrutura e funcionamento dos órgãos de governo próprio. O EPARAA é na sua essência uma Constituição Regional dando corpo ao regime autonómico fixado na Constituição da República Portuguesa (CRP) para o arquipélago dos Açores. A Região Autónoma da Madeira goza de estatuto similar.
A CRP prevê no seu artigo 161.º como competência política e legislativa da Assembleia da República a aprovação dos estatutos político-administrativos das regiões autónomas. Os estatutos têm a forma de Lei, neles se definindo, nos termos da CRP, questões essenciais para o regime autonómico como a estrutura dos órgãos de poder próprio, as matérias de interesse específico e o património e poder tributário.
Reconhecendo o carácter para-constitucional dos estatutos das Regiões Autónomas, o artigo 226.º da CRP fixa um processo especial de aprovação daqueles diplomas, reservando o direito de iniciativa às Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas. Assim, os projectos de estatutos político-administrativos são elaborados pelas Assembleias Legislativas e enviados para discussão e aprovação à Assembleia da República; se a Assembleia da República rejeitar o projecto ou lhe introduzir alterações, remete-o à respectiva Assembleia Legislativa para apreciação e emissão de parecer; elaborado o parecer, a Assembleia da República procede à discussão e deliberação final. Igual regime se aplica às alterações dos estatutos.
O EPARAA actual foi aprovado pela Lei n.º 39/80, de 5 de Agosto,[1] e alterado pela Lei n.º 9/87, de 26 de Março,[2] pela Lei n.º 61/98, de 27 de Agosto,[3] e pela Lei n.º 2/2009, de 12 de Janeiro.[4] Na sua versão actual (terceira revisão) o EPARAA, para além de um preâmbulo, tem 141 artigos, repartidos por 8 títulos:
O artigo mais importante, porque definidor dos poderes de autogoverno açoriano é o artigo 8.º, o qual define como matérias de interesse específico, nas quais a legislação açoriana quando exista prevalece, as seguintes:
(a) Valorização dos recursos humanos e qualidade de vida;
(b) Património e criação cultural;
(c) Defesa do ambiente e equilíbrio ecológico;
(d) Protecção da natureza e dos recursos naturais, bem como da sanidade pública, animal e vegetal;
(e) Desenvolvimento agrícola e piscícola;
(f) Recursos hídricos, minerais e termais e energia de produção local;
(g) Utilização de solos, habitação, urbanismo e ordenamento do território;
(h) Vias de circulação, trânsito e transportes terrestres;
(i) Infra-estruturas e transportes marítimos e aéreos entre as ilhas;
(j) Desenvolvimento comercial e industrial;
(l) Turismo, folclore e artesanato;
(m) Desporto;
(n) Organização da administração regional e dos serviços nela inseridos;
(o) Política demográfica, de emigração e estatuto dos residentes;
(p) Tutela sobre as autarquias locais e sua demarcação territorial;
(q) Orientação, direcção, coordenação e fiscalização dos serviços e institutos públicos e das empresas nacionalizadas ou públicas que exerçam a sua actividade exclusiva ou predominantemente na Região, e noutros casos em que o interesse regional o justifique;
(r) Regime jurídico e exploração da terra, incluindo arrendamento rural;
(s) Orla marítima;
(t) Saúde e segurança social;
(u) Trabalho, emprego e formação profissional;
(v) Educação pré-escolar, educação escolar e educação extra-escolar;
(x) Espectáculos e divertimentos públicos;
(z) Expropriação, por utilidade pública, de bens situados na Região, bem como requisição civil;
(aa) Obras públicas e equipamento social;
(bb) Comunicação social;
(cc) Investimento directo estrangeiro e transferência de tecnologia;
(dd) Adaptação do sistema fiscal à realidade económica regional;
(ee) Concessão de benefícios fiscais;
(ff) Manutenção da ordem pública;
(gg) Estatística regional;
(hh) Outras matérias que respeitem exclusivamente à Região ou que nela assumam particular configuração. O parlamento regional pode ainda transpor directivas da União Europeia para o direito regional e apresentar propostas de Lei.
O actual EPARAA é, apesar de alterações de algum vulto introduzidas em 1987 e 1998, o primeiro estatuto definitivo aprovado na vigência da Constituição de 1976. A sua aprovação, aparentemente consensual entre os maiores partidos portugueses, acabou por desembocar na famigerada guerra das bandeiras que se traduziu num conjunto de graves incidentes protocolares entre os órgão regionais e nacionais e num generalizado mal-estar, apenas ultrapassado pelo decorrer do tempo e pela consolidação do regime autonómico. Ainda assim, mantém-se a inconstitucionalidade da matéria referente ao voto dos açorianos residentes no exterior. O actual EPARAA substituiu o Estatuto Provisório da Região Autónoma dos Açores, aprovado em pleno período revolucionário pós-25 de Abril pelo Decreto-Lei n.º 318-B/76, de 30 de Abril, e posteriormente alterado pelo Decreto-Lei n.º 427-D/76, de 1 de Junho, diplomas, que na prática fizeram a transição para a actual autonomia democrática. A criação do conceito de Região (que depois evoluiu para Região Autónoma), em substituição dos três distritos autónomos anteriores (Ponta Delgada, Angra do Heroísmo e Horta) fez-se na esteira da Comissão de Planeamento Regional (criada pelo Decreto-Lei n.º 48905, de 11 de Março de 1969). Utilizando esse conceito embrionário de “região” única, pelo Decreto-Lei n.º 458-B/75, de 22 de Agosto, foi criada a Junta Administrativa e de Desenvolvimento Regional (a Junta Regional), diploma que foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 100/76, de 3 de Fevereiro. Através daquela rápida transição, fruto da Revolução de Abril, o EPARAA actual é herdeiro directo do Estatuto dos Distritos Autónomos das Ilhas Adjacentes, o qual tem a sua génese na autonomia administrativa contida no Decreto de 2 de Março de 1895, diploma promulgado por impulso do açoriano Ernesto Rodolfo Hintze Ribeiro então Presidente do Conselho de Ministros.
Sem levar em conta o período dos donatários e dos Capitães-Generais, em que a autonomia das populações se exercia num âmbito radicalmente diferente, os Açores gozam já 110 anos de autonomia, embora por vezes bem mitigada e durante muito tempo não abrangendo o ex-distrito da Horta (ilhas de Faial, Pico, Flores e Corvo). Essa autonomia assentou nos seguintes diplomas estruturantes:
Em resultado da Lei Constitucional n.º 1/2004, de 24 de Julho, que consolidou e alargou substancialmente a capacidade legislativa do parlamento açoriano, foi concluído o processo de revisão do EPARAA, o qual consolidou o aprofundamento da autonomia política e legislativa, ficando aberto o caminho para a criação de direito regional (i.e. legislação açoriana especificamente concebida para a realidade insular) em praticamente todas as áreas que não correspondem ao núcleo das competências reservadas dos órgãos de soberania, podendo mesmo neste, mediante autorização legislativa a conceder pela Assembleia da República, ser produzido direito próprio. A livre administração dos Açores pelos açorianos, o moto dos autonomistas do século XIX, parece finalmente aproximar-se da realidade política açoriana.
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