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A Companhia Brasileira de Material Ferroviário (COBRASMA)[2] (B3: CBMA3, CBMA4) foi uma empresa privada (Grupo Vidigal) responsável pela fabricação de parte do material ferroviário brasileiro. No seu auge, chegou a possuir quase 6900 funcionários e faturar anualmente mais de 200 milhões de dólares. Após uma grave crise, encerrou suas atividades fabris em maio de 1998 com uma dívida de aproximadamente 600 milhões de reais.[3][4]
Cobrasma S/A | |
---|---|
Visita do governador Natel à sede da Cobrasma (1971). Arquivo Público do Estado de São Paulo | |
Razão social | Companhia Brasileira de Material Ferroviário S/A |
Sociedade anônima | |
Gênero | metalúrgico/siderúrgico |
Fundação | 1 de setembro de 1944 |
Fundador(es) | Gastão Vidigal |
Encerramento | maio de 1998 |
Sede | Osasco |
Locais | Hortolândia e Sumaré (filiais) |
Proprietário(s) | Família Vidigal |
Presidente | Luís Eulálio de Bueno Vidigal Filho |
Empregados | c.52 (1998) |
Produtos | Autopeças, Equipamentos e peças para as indústrias ferroviária, nuclear, petroquímica, siderúrgica e veículos rodoviários |
Subsidiárias |
|
Receita | R$ 19.313.000,00 (1997) [1] |
Lucro | - R$ 156.258.000,00 (1997)[1] |
LAJIR | - R$ 143.156.000,00 (1997)[1] |
Website oficial | http://cobrasma.com.br/ |
Com a Segunda Guerra Mundial as ferrovias brasileiras sofreram com a falta de peças e insumos para a sua manutenção, que eram importadas dos países envolvidos no conflito e que agora voltavam suas indústrias para o esforço de guerra. Em 1941 o estado de São Paulo possuía uma malha ferroviária de 7388 quilômetros de extensão, 2162 locomotivas, 33934 vagões de carga e 2319 carros de passageiros.[5]
A cada ano de guerra, o risco de colapso dessa malha ferroviária por falta de peças crescia. Em 1942 o governo dos Estados Unidos enviou ao Brasil uma missão técnica chefiada por Morris Llewellyn Cooke (1872-1960), com objetivos de estudar e incentivar a indústria brasileira a produzir o que o país habitualmente importava. Isso seria realizado através de projetos e serviços prestados por empresas estadunidenses para ampliar as bases locais para o esforço de guerra.[6]
Com o incentivo da Missão Cooke, um grupo de industriais liderado por Gastão Vidigal se reuniu em 1943 e se associou para constituir a Companhia Brasileira de Material Ferroviário (Cobrasma) em 1 de setembro de 1944.[2] Por conta de sua constituição acionária, a nova empresa acabou absorvendo terrenos e instalações da Companhia Paulista de Material Ferroviário (Comaf) existente no então bairro de Osasco, que havia falido havia muitos anos.[3]
Acionista[2] | Porcentagem |
---|---|
Companhia Paulista de Estradas de Ferro | 25% |
Companhia Mogiana de Estradas de Ferro | 25% |
Companhia Siderúrgica Belgo-Mineira | 12,5% |
Grupo Monteiro Aranha | 7,5% |
Hime Comércio e Indústria S.A. | 3,25% |
Klabin Irmãos e Cia. | 2,75% |
Companhia Central De Administração e Participações | 2,5% |
Construtora de Imóveis S/A-Casa Bancária | 2,25% |
Votorantim S.A. | 1,37% |
Siderúrgica Barra Mansa | 1,37% |
Indústrias Reunidas Fábricas Matarazzo | 1,37% |
Companhia Itaquerê, Industrial, Agrícola e Imobiliária | 1,37% |
Companhia Mecânica e Importadora de São Paulo | 0,75% |
Companhia Siderúrgica Nacional | 0,62% |
Estrada de Ferro Sorocabana | 0,5% |
Companhia Estrada de Ferro do Dourado | 0,5% |
General Electric | 0,5% |
Demais acionistas | 10,9% |
Total | 100% |
Em 1987, causou fortes prejuízos a investidores ao colocar no mercado ações no valor de 108,1 milhões de reais, estimulada por projeções irreais de lucro levando a perdas os três bancos coordenadores (Bradesco, Crefisul e Banco de Crédito Nacional, 124 instituições financeiras e milhares de pequenos e médios investidores.[7] O processo depois causou polêmica ao ser arquivado pelo juiz João Carlos da Rocha Mattos em 1999.[7]
Em 1998, depois de vários pedidos de concordata, encerrou suas atividades.[8]
A Cobrasma iniciou sua produção em junho de 1946, montando vagões de carga construídos nos Estados Unidos pela empresa Pressed Steel Car Company para a Estrada de Ferro Noroeste do Brasil. Seus primeiros vagões foram fabricados em 1948. Até 1992, quando encerrou sua produção de vagões de carga de diversos tipos, a Cobrasma fabricou 14879 vagões em suas fábricas em Osasco e em Sumaré/Hortolândia (à partir de 1979) [9]:
Ano | Quantidade | Ano | Quantidade | Ano | Quantidade |
---|---|---|---|---|---|
1948 | 27 | 1963 | 375 | 1978 | 1252 |
1949 | 0 | 1964 | 134 | 1979 | 125 |
1950 | 144 | 1965 | 160 | 1980 | 346 |
1951 | 291 | 1966 | 150 | 1981 | 212 |
1952 | 268 | 1967 | 179 | 1982 | 318 |
1953 | 234 | 1968 | 60 | 1983 | 450 |
1954 | 363 | 1969 | 465 | 1984 | 196 |
1955 | 573 | 1970 | 147 | 1985 | 406 |
1956 | 452 | 1971 | 258 | 1986 | 435 |
1957 | 324 | 1972 | 451 | 1987 | 36 |
1958 | 433 | 1973 | 1043 | 1988 | 349 |
1959 | 25 | 1974 | 933 | 1989 | 0 |
1960 | 80 | 1975 | 1472 | 1990 | 50 |
1961 | 66 | 1976 | 1038 | 1991 | 0 |
1962 | 50 | 1977 | 360 | 1992 | 314 |
Total | 14879 |
Diferentemente dos vagões de carga (fabricados desde o início de suas operações), os primeiros carros de passageiros foram construídos pela Cobrasma apenas em 1957 ao se associar com a FNV e a Santa Matilde para fabricar os carros reboque de aço carbono da Série 200 da EFCB. Para tentar manter a produção ativa por mais tempo, a Cobrasma tentou concorrer ao fornecimento de 90 carros para a Estrada de Ferro Santos – Jundiaí. A proposta nem chegou a ser apresentada por conta da Rede Ferroviária Federal (controladora da Santos Jundiaí) exigir a fabricação dos carros em aço inoxidável. Naquela época apenas a Mafersa dominava o processo, tornado-a única qualificada para a concorrência. Posteriormente a Cobrasma, FNV e Santa Matilde denunciaram o direcionamento da concorrência para a Mafersa por parte do presidente da RFFSA (que era ao mesmo tempo acionista e diretor da Mafersa), gerando o caso Mafersa (que terminou inconclusivo).[10]
A Cobrasma só voltou a fabricar carros de passageiros apenas em 1965, quando se associou novamente com a FNV e Santa Matilde para fabricarem 300 carros da Série 400 da EFCB.[11] Somente em 1975, quando se associou ao grupo francês Francorail e adquirindo deste uma licença de fabricação de carros em aço inoxidável que a Cobrasma passou a fabricar carros de passageiros com maior regularidade até 1987, quando o último carro em aço inoxidável foi entregue para o metrô de Belo Horizonte.[12]
A fabricação de carros foi encerrada em 1991, quando os últimos 6 carros (de VLT) foram concluídos. Apesar de ter fabricados carros para trens-unidade, a Cobrasma nunca fabricou carros de passageiros para trens de longo percurso (cujo mercado era dominado pela Mafersa, FNV e Santa Matilde).
Ano | Quantidade | Ano | Quantidade |
---|---|---|---|
1957 | 6 | 1982 | 88 |
1959 | 30 | 1983 | 78 |
1965 | 9 | 1984 | 38 |
1966 | 39 | 1985 | 60 |
1967 | 51 | 1986 | 48 |
1979 | 144 | 1987 | 12 |
1980 | 104 | 1990 | 2 |
1981 | 106 | 1991 | 6 |
Total | 821 |
Durante a década de 1980 ocorreram crises econômicas, culminando na Década perdida, derrubando as encomendas de equipamentos ferroviários. Assim, numa tentativa de diversificar sua produção, a Cobrasma passou a construir ônibus e trólebus de aço inoxidável.[13]
Entre 1983 e 1986 a empresa contratou o escritório de design Grupo Associado de Pesquisa e Planejamento Ltda (GAPP). A equipe do GAPP, integrada pelo designer João Gomes Filho, desenvolveu o modelo rodoviário Trinox. Apesar de o projeto ter sido bem sucedido, a fabricação sofreu com a falta de expertise da Cobrasma na construção de veículos rodoviários (gerando defeitos de fabricação e falta de confiabilidade), a queda nas vendas de ônibus e o alto custo do Trinox por empregar aço inoxidável em sua estrutura. Posteriormente a empresa lançou outros produtos como os CX-201, 202, 301 e 302. Entre 1987 e 1989 foram fabricados 428 ônibus rodoviários pela Cobrasma (a maior parte do modelo CX-201).[14][13]
A produção de trólebus foi incipiente, registrando 46 veículos vendidos para a Companhia do Metropolitano de São Paulo e 2 para a Companhia Trólebus Araraquara, fabricados entre 1987 e 1989. Em 1986 a prefeitura de São Paulo, por meio da CMTC, anunciou um projeto de aquisição de trólebus articulados. A Cobrasma se associou com a Mafersa mas o projeto acabou cancelado.[15][13]
Em 1990 a fabricação de ônibus pela empresa foi encerrada por falta de viabilidade econômica, com 476 veículos construídos. No auge de sua produção, alcançou apenas 5% do mercado de fabricação de ônibus. O investimento no mercado de ônibus agravou a situação financeira da empresa.[16][13]
Ano | Rodoviário | Trólebus |
---|---|---|
1987 | 101 | N/D |
1988 | 159 | 13 |
1989 | 168 | 8 |
1990 | N/D | 27 |
Total | 428 | 48 |
Diferente de outras empresas do mercado, que compravam peças das fundições existentes, a Cobrasma foi projetada para contar com uma fundição desde o início. Projetada pela American Steel Foundries, a fundição de aço e ferro da Cobrasma era a maior da América Latina naquele momento. Iniciou suas atividades em 1948 e produziu peças para o mercado nacional e exportação de forma contínua até outubro de 1994, quando encerrou suas atividades. Sua produção se intensificou à partir da década de 1950 quando o governo federal incentivou a implantação da indústria automobilística no país, sofreu uma queda em 1968 durante a grande greve da empresa e atingiu seu auge no rescaldo do Milagre Econômico.
Ano | Quantidade | Ano | Quantidade | Ano | Quantidade |
---|---|---|---|---|---|
1948 | 1385 | 1963 | 12290 | 1978 | 20669 |
1949 | 5411 | 1964 | 11440 | 1979 | 23114 |
1950 | 5845 | 1965 | 11343 | 1980 | 27407 |
1951 | 5819 | 1966 | 11917 | 1981 | 18082 |
1952 | 7649 | 1967 | 10189 | 1982 | 12935 |
1953 | 5749 | 1968 | 9217 | 1983 | 8461 |
1954 | 9827 | 1969 | 11971 | 1984 | 14972 |
1955 | 8873 | 1970 | 14016 | 1985 | 21556 |
1956 | 10479 | 1971 | 13811 | 1986 | 25176 |
1957 | 11194 | 1972 | 13434 | 1987 | 16114 |
1958 | 9894 | 1973 | 23080 | 1988 | 14123 |
1959 | 8802 | 1974 | 27687 | 1989 | 15153 |
1960 | 11263 | 1975 | 26948 | 1990 | 13639 |
1961 | 11243 | 1976 | 29068 | 1991 | 10504 |
1962 | 11684 | 1977 | 22058 | 1992 | 10818 |
1993 | 10387 | ||||
1994 | 7400 | ||||
Total | 644096 |
Em 1962 os operários fundaram a Comissão de Fábrica da Cobrasma, atuando como representante dos mais de 2500 operários da empresa. Apesar disso, a comissão não foi oficialmente reconhecida pela família Vidigal, controladora da fábrica.[17]Até então representados pelo Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, os operários da Cobrasma e das demais empresas da região resolvem se organizar e em 1963 lançam o Sindicato dos Metalúrgicos de Osasco e região. Em novembro daquele ano ocorre a primeira grande greve na Cobrasma, buscando melhores salários e condições de trabalho.[18]
Com o golpe de estado de 1964, o regime militar destituiu e prendeu as lideranças sindicais de Osasco. Ao mesmo tempo, os militares tentaram colocar no comando do sindicato lideranças inofensivas e ou colaboradoras do regime. Em 1967 os trabalhadores votaram maciçamente na chapa de oposição, comandada pelo jovem operário da Cobrasma José Ibrahim, que foi eleito presidente do sindicato. Ibrahim era a liderança do movimento de esquerda sindical radical, o que colocou o sindicato e a Cobrasma na mira dos órgãos de repressão.[19]
Em 16 de julho de 1968 um jovem operário da Cobrasma morreu queimado após um acidente de trabalho na forjaria da empresa. Causado por más condições de trabalho, o acidente parou a fábrica e se tornou o estopim para a Greve. Ibrahim liderou uma paralisação reivindicando[19]:
A resposta dos proprietários da Cobrasma foi acionar as autoridades para reprimir a greve e prender suas lideranças. Empregando o foquismo, Ibrahim e seus colegas espalharam a greve para outras empresas de Osasco, ampliando o tamanho do movimento e dificultando as ações do regime. Como medida extrema, foram mobilizados soldados da guarnição de Quitaúna para repelir a greve nas empresas. Cerca de cem operários da Cobrasma se entrincheiraram dentro da fábrica, desafiando os soldados. Ao tentar ingressar na fábrica na madrugada de 17 de julho, a cavalaria sofreu várias baixas. Os operários espalharam cavacos de aço no pátio que feriram as patas dos cavalos, que caíam e derrubavam suas montarias. Dentro da fábrica, os operários destruíram o sistema de iluminação, fazendo com que os soldados tropeçassem em máquinas, peças e produtos químicos e caíssem, ferindo-se. Ainda assim, na manhã do dia 17, a fábrica havia sido retomada e a maioria dos operários presa. Entre os presos encontrava-se o próprio Ibrahim e o padre francês Pierre Wauthier. Apesar disso, o movimento grevista continuou por mais uma semana. [19][20][21]
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