A bioeletricidade, o biomagnetismo, ou de forma geral o bioeletromagnetismo são hoje nomenclaturas utilizadas para referir-se aos fenômenos elétricos, magnéticos ou eletromagnéticos quando ocorrem no âmbito dos organismos vivos. Frente ao conhecimento moderno, "bioeletromagnetismo" em nada acrescenta conceitualmente ao eletromagnetismo estudado primariamente em Física, a não ser o fato de que enfoca-se a manifestação de tais fenômenos em sistemas biológicos. O bioeletromagnetismo rege-se por tal exatamente pelas mesmas regras do eletromagnetismo.

O termo bioeletricidade atrela-se usualmente aos potenciais eléctricos e correntes eléctricas que são produzidos ou que ocorrem em organismos vivos. Os potenciais são gerados por uma diversidade de processos biológicos.[1]

A existência de diferença de potencial elétrico através das membranas de todas as células do corpo é verificada cientificamente, e algumas células como as do sistema nervoso (neurais) se especializaram de forma a constituírem sistemas cuja função central é a de disparar, propagar e processar impulsos elétricos. Os sistemas nervosos dos animais, estruturados principalmenente por neurônios, constituem per facto intrincados circuitos elétricos.

Nos mecanismos fisico-químicos que levam às diferenças de potencial elétrico através das membrana os íons mais importantes e quase sempre envolvidos são: Na+, K+ e Cl-; e entre os processos indispensáveis ao metabolismo celular podem-se destacar a bomba de sódio potássio; que regula a concentração intracelular dos correlatos íons; e o potencial de ação, responsável por disparar o mecanismo de propagação de impulsos elétricos no interior das células (com destaque para as nervosas).

Contexto histórico

No século XVIII, o médico e físico italiano Luigi Galvani registrou o fenômeno no qual as pernas de uma contraíam-se quando solicitadas por fontes de eletricidade estática. Galvani não reconheceu a identidade entre a eletricidade estática e o que à época denominou "eletricidade animal" como causa para o fenômeno, pois per facto a definição atual de eletricidade estática não era à época estabelecida, sendo tal identidade apenas posteriormente identificada.[2]

Luigi e muitos de seus contemporâneos consideravam que a ativação dos músculo da rã - e dos demais seres vivos - era resultando de uma substância fluída que percorria os nervos, a "eletricidade animal"; hipótese que pode-se em princípio entender como uma literal definição de "bioeletricidade". Não tardou para que a "eletricidade animal", para Galvani produzida pela própria musculatura da rã mesmo depois de morta,[2] fosse proposta como o fluido vital responsável por animar a matéria bruta (vitalismo).

Para o físico também italiano Alessandro Volta, contemporâneo a Galvani, a eletricidade que fazia a perna da rã mover-se era contudo "metálica", uma espécie de "eletricidade química" de origem externa ao tecido biológico, hipótese que veio a se confirmar mais tarde com o advento da pilha elétrica.[2]

O advento da pilha elétrica, impulsionado pela acalorada contenda entre Volta e Galvani acerca da natureza da "bioeletricidade",[2] representa um marco na história do eletromagnetismo frequentemente celebrado mesmo hoje em dia: pela primeira vez dispunha-se de uma fonte constante de eletricidade capaz de permitir o seu estudo detalhado.

É na época que desenrola-se a contenda entre Volta e Galvani que escreve-se a clássica obra de Mary Shelley, "Frankenstein".

No paradigma científico atual, o conceito de bioeletricidade confunde-se com exatidão ao conceito de eletricidade descrito em qualquer livro de física; expressando em acréscimo, quando muito, apenas o fato de os fenômenos elétricos em consideração darem-se atrelados à processos que se classificam como biológicos. As ideias de uma "eletricidade animal" distinta e de um "fluido vital" vão-se há tempos na história da ciência.[2]

Bioeletricidade

A eletricidade é um processo natural inerente a todo e qualquer sistema material, sendo a interação elétrica a interação central para se estabelecer a estrutura da matéria conforme hoje concebida. Todas as reações químicas, incluso as bioquímicas, são explicadas mediante a interação eletrônica dos átomos, moléculas ou íons.

Nos organismos vivos todas as células operam sob tal princípio; contudo células especiais no cérebro e em todo o corpo são melhor compreendidas apenas mediante explicitação direta de seu comportamento elétrico. As percepções de estímulos ambientais ligam-se diretamente a mecanismos biológicos de conversão de sinais estimulantes em impulsos elétricos reconhecíveis pelos sistemas do organismo. Cada padrão da luz, som, calor, dor, cada contração muscular dos dedos, cada pensamento, traduz-se em uma seqüência de pulsos elétricos codificado, armazenado e interpretado no sistema nervoso central dos organismo superiores.

Os processos elétricos que promovem esta comunicação entre as células ocorrem em uma solução, com as substâncias e elementos necessários dissolvidos na água. Quando uma substância como o sal (NaCl) se dissolve em água, ela deixa de existir como uma entidade neutra e se dissocia em íons (no caso do sal, ele se dissocia no cátion sódio, Na+, e no ânion cloreto, Cl-). Os átomos ou mesmo moléculas podem igualmente perder ou ganhar elétrons, tornando-se também íons .

Os íons possuem cargas elétricas positivas e negativas, e o movimento destes íons carregados dentro e fora da célula viva implicam movimento de cargas elétricas. Focando-se no neurônio mas podendo-se igualmente estender o raciocínio às demais células corporais, as organelas de uma célula neuronal encontram-se imersas no citoplasma, fluido aquoso encerrado pela membrana plasmática, no qual diluem-se várias substâncias, com destaque para moléculas protéicas e os íons de sais inorgânicos. Externamente, a célula é banhada também pelas substâncias diversas, entre elas as que alimentam a célula, criando condições para que essa possa realizar e manter seu metabolismo.

A habilidade das células nervosas em processar a informação elétrica depende das propriedades especiais da membrana celular, que controla o fluxo de substâncias entre o interior e o exterior da célula. Canais sobre a membrana permitem que certas substâncias e íons passem do meio interno para o meio externo da célula e vice-versa; alguns espontaneamente, outros sob imposição do mecanismo bioquímico atrelado ao canal. Os movimentos iônicos através dos canais são também influenciados pelo processo de osmose, promovendo a difusão das susbstâncias no meio aquoso. A membrana mostra-se assim, de forma ativa ou passiva, ou permeável, ou semipermeável ou impermeável a cada uma das substâncias em consideração.

O estudo destes mecanismos bioelétricos define a eletrofisiologia.

Impulso nervoso

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O cloreto de potássio adequadamente diluído, quando injetado no sistema sanguíneo, afeta diretamente as concentrações de íons tanto externa quanto internamente às células. O resultado é uma diminuição substancial do limiar de excitação necessário para se disparar um impulso nervoso (potencial de ação). Qualquer ruído elétrico externo torna-se capaz de dispará-lo, e o sistema nervoso afetado colapsa dada a sua hipersensibilidade.

Em um estado não excitado o neurônio (e demais células) mantém a concentração de íons sódio em seu interior mais baixa do que a concentração no meio externo, e a concentração de íons potássio interna maior do que a concentração em seu exterior; de tal forma que, quando não excitado, há uma diferença de potencial elétrico entre o interior e o exterior do neurônio, sendo o interior negativo em relação ao exterior em cerca de 70 milivolts. Ao receber um estímulo através de um neurotransmissor adequado nas regiões sinápticas, canais específicos na membrana neuronal subitamente se abrem; íons sódio adentram rapidamente a célula na região em questão e íons sódio a abandonam. As variações de concentração dos íons leva à uma inversão de polaridade entre o meio externo e a região interna nas proximidades do estímulo em valor que usualmente supera os +30 milivolts. Essa diferença de tensão mais alta do que 30mV - o potencial de ação - induz canais próprios subjacentes a também se abrirem, o que leva a uma onda de inversão de polaridade ao longo de toda a membrana celular (ao longo do axônio no caso do neurônio). O restabelecimento também rápido do potencial de repouso via mecanismo ativo da membrana (bomba de sódio potássio) faz com que, no global, um pulso elétrico de cerca de 30mV seja visto se propagando ao longo da extensão da membrana (e do axônio no caso do neurônio) em meio a regiões posterior e anterior caracterizadas por uma diferença de potencial de -70mv.[3]

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